Nora Barnacle, que já foi tida como uma camareira iletrada, foi menosprezada por muito tempo como influência formadora na vida na vida de Joyce. Costumava dizer "para que eu vou ler literatura se casei com o maior escritor de todos os tempos?". Hoje se sabe que, tanto em Ulisses quanto em Finnegans Wake, Joyce se apropria da linguagem de sua família.

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Em Finnegans ele explora a maneira com que sua filha, que era esquizofrênica, se comunicava. Em Ulisses ele incorporou a maneira como Nora escrevia, o que é possível observar através das cartas que ela enviou a ele e que pela primeira vez fazem parte da edição em português do livro.

A esposa foi tão fundamental para Joyce que Ulisses se passa em 16 de junho de 1904, dia do primeiro encontro do casal. A obra é composta por 18 capítulos, cada um com características diferentes e que simbolizam cada um uma hora do dia. E a cada hora do dia Joyce mudava a maneira de narrar e estabelecia uma associação com uma cor, órgão do corpo ou ciência. Ao mesmo tempo ele se referia a um episódio específico da Odisseia, de Homero. A mistura do coloquial com referências eruditas é uma das marcas do livro.

Fascinação e ciúme

O livro registra também o quanto Joyce era fascinado por Nora e vivia em busca de presentes para ela.

- Joyce vivia bajulando Nora dia e noite. Ele a chamava de rainha. O escritor tinha uma relação difícil com seu país, se sentia rejeitado por ele, mas chamava Nora de "minha pequena Irlanda". Ela era a ilha para ele, a Irlanda que não o traiu e estava sempre do lado dele. Isso é interessante porque ele era muito ciumento, e ele a traiu, mas pelo que sabemos ela nunca o traiu. Nas cartas que ela escreveu ela não usava vírgula, nada, é o que a Molly faz no final de Ulisses - afirma Sérgio.

O dia 16 de junho é comemorado em todo o mundo e no Brasil pelos fãs do livro e de Joyce como Bloomsday, uma referência ao nome do personagem Leopold Bloom, protagonista de Ulisses.

Trechos de cartas de Joyce:

"Minha querida fiel boa Norinha não me escreva de novo duvidando de mim. Você é o meu único amor. Você me domina completamente. Eu sei e sinto que se eu vier a escrever algo de belo e nobre será somente escutando as portas do teu coração."

"Como eu gostaria de te surpreender dormindo agora! Tem um lugar em você que eu gostaria de beijar agora, um lugar estranho, Nora. Não nos lábios, Nora. Você sabe onde?"

"Esta noite a velha febre de amor voltou a arder em mim. Sou uma casca de homem: minha alma está em Trieste. Só você me conhece e me ama."

"Me pergunto se não estou um pouco louco. Ou o amor é loucura? Em certos momentos te vejo como uma virgem ou madona, em outros te vejo desavergonhada, insolente, seminua e obscena!"

Carta de Nora:

"Parece que eu estou sempre na tua companhia sob todas as variedades de circunstâncias possíveis falando contingo caminhando contigo te encontrando de repente em diferentes lugares até que eu me pergunto se o meu espírito não deixou meu corpo no sono e saiu te buscando"

A onda sensual na literatura

Depois do pudico da trilogia Crepúsculo e do fantástico de Harry Potter e Senhor dos Aneis, o novo fenômeno de vendas da literatura é o erótico. A literatura erótica foi o grande destaque do ano na Feira de Frankfurt, na Alemanha, a maior do mundo, com mais de 7500 exibidores de cerca de 110 países diferentes e o gênero corresponde a 25% das vendas do mercado americano de ficção adulta atualmente.

Segundo a editora, Intrínseca, que publicou Cinquenta Tons de Cinza no Brasil, o livro vendeu mais de 10 milhões de cópias em seis semanas, o que faz da série um dos maiores best-sellers de todos os tempos. Já foram vendidas mais de 40 milhões de cópias em dezenas de países. De acordo com a Associação Brasileira das Empresas do Mercado Erótico e Sensual (Abeme), as vendas de produtos ligados a sadomasoquismo, foco do livro, aumentaram 20% depois depois do lançamento no Brasil. Reforçando seu prestígio, E. L. James, autora da série, foi eleita recentemente pela revista Time uma das 100 pessoas mais influentes do mundo.

Livro Cartas a Nora
Autor James Joyce
Tradução de Sérgio Medeiros e Dirce Waltrick do Amarante
152 páginas
R$ 38