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Itapema FM  | 07/08/2012 20h10min

As mulheres de Jorge Amado

Na sexta-feira será celebrado o centenário de nascimento do escritor baiano, que imortalizou em sua obra tipos femininos como Gabriela, Dona Flor e Tieta

Completa-se na sexta-feira o centenário de nascimento de um dos mais celebrados autores brasileiros. Jorge Amado, que morreu em 2001, legou à literatura nacional algumas das mais admiradas personagens femininas. São quatro as grandes musas do escritor baiano — Gabriela, Dona Flor, Tereza Batista e Tieta marcaram a segunda e mais popular fase de sua produção.

A trama envolvendo a mais provocante delas ganha atualmente sua segunda adaptação para a televisão, na faixa das onze da Globo.  O remake Gabriela, com texto de Walcyr Carrasco, traz Juliana Paes emprestando seus contornos à lasciva morena eternizada na atuação de Sonia Braga, quando o texto de Jorge Amado foi levado à TV por Walter Avancini, em 1975. Junto da personagem-título, as protagonistas de Dona Flor e Seus Dois Maridos, Tereza Batista Cansada de Guerra e Tieta do Agreste surgem a partir de meados da década de 1950, quando o baiano se distancia do conteúdo político e dos ideais revolucionários comunistas e se dedica à composição de tipos populares marcantes.

— Sua obra passa a ter uma dimensão humorística. Predomina uma visão irreverente e anárquica segundo a qual só os personagens populares estão livres do conjunto moral hipócrita da classe média e da burguesia — avalia Sergius Gonzaga, secretário de Cultura de Porto Alegre, professor de Literatura Brasileira da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e conhecedor da obra de Jorge Amado. — Essas quatro mulheres ou são libertárias, ou, caso de Dona Flor, vão fazer essa passagem, uma ruptura com a moralidade tradicional. Não à toa, duas delas são prostitutas.

Em textos repletos de referências à cultura afrobrasileira e ao candomblé, o autor dá voz a negros, pobres, mulheres e excluídos.

— Ele conta a história dos marginalizados e os transforma em heróis. As mulheres amadianas, principalmente as negras, são independentes na relação com o próprio corpo. Os homens não mandam nelas. Elas decidem com quem vão dormir, o que contraria a concepção judaico-cristã da mulher ao bel prazer do homem — destaca Gildeci Leite, professor de Literatura na Universidade do Estado da Bahia (Uneb) e especialista na obra do autor que prevê para 2014 o lançamento de seu Dicionário Cultural Amadiano.

Conheça as musas de Jorge Amado:

GABRIELA
Do livro Gabriela, Cravo e Canela (1958)

Sensualíssima, expulsa do sertão nordestino pela seca, a retirante Gabriela, exalando cravo e canela, chega a Ilhéus nos anos 1920 e começa a trabalhar como cozinheira no bar de Nacib, o Vesúvio. Prendada, Gabriela ganha o patrão com o tempero de seus vatapás e acarajés e também pelo aroma do seu espírito livre, meio bicho, meio mulher, tão diferente das senhoras da sociedade local. Apaixonados, eles logo se casam, mas Gabriela não se adapta aos limites de um relacionamento formal.

" (...) Dormida numa cadeira, os cabelos longos espalhados nos ombros. Depois de lavados e penteados tinham-se transformados em cabeleira solta, negra, encaracolada. Vestia trapos, mas limpos, certamente os da trouxa. Um rasgão na saia mostrava um pedaço de coxa cor de canela, os seios subiam e desciam levemente ao ritmo do sono, o rosto sorridente.”

DONA FLOR
Do livro Dona Flor e Seus Dois Maridos (1966)
Florípedes Paiva compensa em um casamento o que falta no outro — desfruta da paixão e do erotismo vividos ao lado do boêmio Vadinho e da calmaria e da segurança trazidas pela relação com o farmacêutico Teodoro. Após a morte do primeiro, Dona Flor se casa com o segundo.

"Pequena e rechonchuda, de uma gordura sem banhas, a cor bronzeada de cabo-verde, os lisos cabelos tão negros a ponto de parecerem azulados, olhos de requebro e os lábios grossos um tanto abertos sobre os dentes alvos. Apetitosa, como costumava classificá-la o próprio Vadinho em seus dias de ternura, raros talvez
porém inesquecíveis.”

TEREZA BATISTA
Do livro Tereza Batista Cansada de Guerra (1972)

Órfã e vendida por um parente a um fazendeiro, Tereza Batista, aos 13 anos, é estuprada e mantida cativa. As provações enfrentadas tão precocemente ajudarão a moldar sua personalidade de mulher valente e decidida – e que detestava ver homem batendo em mulher. Uma das mais famosas heroínas de Jorge Amado, ela acaba por assassinar seu algoz e, mais adiante, apaixonar-se.

"Difícil para Tereza foi aprender a chorar, pois nasceu para rir e alegre viver. Não quiseram deixar mas ela teimou, teimosa que nem um jegue essa tal Tereza Batista. Mal comparado, seu moço, pois de jegue não tinha nada afora teimosia; nem mulher macho, nem Paraíba, nem boca suja – ai, boca mais limpa e perfumosa! –, nem jararaca, nem desordeira, nem puxa-briga; se alguém assim lhe informou, ou quis lhe enganar ou não conheceu Tereza Batista. Tirana só em tratos de amor; como já disse e reafirmo, nasceu para amar e no amor era estrita. Por que então a chamaram de Tereza boa de briga? Pois, meu compadre exatamente por ser boa de briga, igual a ela não houve em valentia e altivez, nem coração tão de mel. Tinha aversão a badernas, nunca promoveu arruaças mas, decerto pelo sucedido em menina, não tolerava ver homem bater em mulher.”

TIETA
Do livro Tieta do Agreste (1977)

Fogosa e namoradeira, Tieta é expulsa de casa e da cidade quando sua irmã revela ao pai o que ela apronta na rua. A protagonista retorna a Santana do Agreste 25 anos depois, em condições bem diferentes: rica e influente na política, traz junto o progresso para o lugarejo no interior da Bahia. A família acredita que sua vida mudou graças ao casamento com um industrial de posses, mas com o tempo a verdade aparece – Tieta se reergueu graças ao trabalho como prostituta e cafetina em São Paulo.

"O homem a derruba sobre as folhas dos coqueiros, suspende-lhe a saia, arranca-lhe a calçola, trapo sujo. De joelhos sobre ela, enterra o chapéu na areia para que não voe e se perca, abre a braguilha. A menina o deixa fazer e quer que ele o faça."

ZERO HORA
Reprodução / Reprodução

Sonia Braga como "Gabriela" na primeira versão da novela, de 1975
Foto:  Reprodução  /  Reprodução


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