| 24/10/2005 17h30min
Eldorado era uma pacata cidade do Interior de Mato Grosso do Sul. Até 12 dias atrás, a população de 11 mil habitantes estava acostumada com a tranqüilidade do lugar, conhecido como a terra da melancia. Hoje, as carroças, as bicicletas e os carros antigos comuns nas ruas do município localizado a 45 quilômetros da fronteira com o Paraguai se misturam a viaturas policiais e de unidades de defesa sanitária.
A praça principal onde está instalada a igreja matriz, antes local para o jogo de carta dos mais velhos, agora é palco de discussão sobre a transformação da cidade por causa do surgimento do foco de aftosa.
– Nunca vi nada igual – reage Floriano de Souza Brasil, motorista há 25 anos na cidade.
Ali se corta cabelo na barbearia por apenas R$ 3, e os jovens aproveitam a noite só até as 23h, em barzinhos, mas o clima é outro desde do dia 10. Depois da aftosa, a cidade a cerca de 450 quilômetros de Campo Grande mais parece uma praça de guerra no combate a doença. Oficiais com armas pesadas acompanham a fiscalização na fronteira com o Paraguai. Barreiras impedem o livre acesso às inúmeras fazendas da região. Técnicos da Agência Estadual de Vigilância Sanitária Animal e Vegetal (Iagro) pulverizam de rodas de veículos a cascos de cavalo. Donos das estâncias com animais contaminados pelo vírus agora são quase prisioneiros em suas propriedades. As visitas são restritas. Somente parentes de primeiro grau podem entrar. Se quiserem sair, a ordem é passar longe das demais fazendas, para evitar a disseminação da doença.
A cidade de apenas duas emissoras de rádio atrai a atenção da imprensa brasileira e estrangeira. Hotéis estão lotados. Faltam quartos para acomodar tanta gente de fora.
A proibição de venda de carne e leite produzidos na cidade e em municípios vizinhos - Japorã, Mundo Novo, Guatemi e Itaquiraí - levou três frigoríficos a dar férias coletivas. São 2,3 mil pessoas sob a incerteza do desemprego. Da renda da pecuária de corte e de leite provém 65% da economia de Eldorado. E o comércio local começa a sentir os efeitos da descoberta da aftosa.
– Estamos vivendo um caos. Não sabemos o que fazer – diz a prefeita Mara Elisa Caseiro.
Produtores de leite são obrigados a desperdiçar milhares de litros de leite por dia. Em apenas um assentamento da região, 11 mil litros são jogados fora por dia.
– Me sinto um ladrão. Para chegar com o leite da fazenda até a minha casa sou obrigado a fugir da fiscalização pulando o muro do vizinho – afirma João Pedro Scott, ao relatar a frustração de não poder levar a produção própria à família.
A partir de agora, a cidade que se orgulhava por ter o título de terra da melancia lamenta ter ficado conhecida pela aftosa.
DANIELA FOGAÇA/ELDORADO/ENVIADA ESPECIALGrupo RBS Dúvidas Frequentes | Fale Conosco | Anuncie | Trabalhe no Grupo RBS - © 2009 clicRBS.com.br Todos os direitos reservados.