| 04/04/2005 07h10min
Às vésperas de embarcar para Roma para participar do conclave que elegerá o próximo papa, o arcebispo de São Paulo, dom Cláudio Hummes, silenciou. A justificativa oficial é uma afonia, mas como favorito à sucessão de João Paulo II no trono do Vaticano, o cardeal gaúcho de 70 anos sabe que falar demais é um pecado punível com o desprezo dos colegas na secreta eleição papal.
Enquanto o religioso convalescia em sua residência na capital paulista, à espera da definição do dia em que viajará para a Itália, a imprensa mundial colocava seu nome no topo da lista de possíveis sucessores de Karol Wojtyla no trono de Pedro. Na casa de apostas irlandesa Paddy Power, uma das principais da Europa, o gaúcho ocupava a quinta colocação ontem à tarde, atrás de um cardeal italiano, um nigeriano, um hondurenho e um alemão.
Apesar de ser escolhido pelo voto, a tradição mostra que o novo papa não deve sob hipótese alguma ter feito campanha eleitoral antes de entrar na Capela Sistina. Um dos ditados mais lembrados pelos prelados que concorrem ao cargo máximo da Igreja Católica diz que quem entra papa no conclave, sai cardeal.
Como os demais favoritos, dom Cláudio nega ser candidato. No máximo, diz que a América Latina terá força no conclave, mas deixou claro em declarações recentes que o responsável pela escolha do novo pontífice é o Espírito Santo. Nisso, outro cardeal gaúcho, dom Aloísio Lorscheider, concorda. Por já ter feito 80 anos, ele não poderá participar do próximo conclave. Mas como testemunha dos últimos dois, ocorridos em 1978, garante que os cardeais manifestam no voto um desejo divino. Ao contrário de dom Cláudio, porém, diz que os latino-americanos não terão chance na futura eleição:
– O próximo papa será italiano. Se por acaso não for italiano, será europeu. Pode escrever – afirma dom Aloísio.
A questão geográfica também divide os especialistas em Vaticano. Por outro lado, eles são unânimes em relegar a importância divina da reunião, para destacar uma disputada corrida papal que, como em todas as eleições, é repleta de pactos, alianças e conchavos que inevitavelmente virão à tona depois do conclave.
Um dos vaticanistas mais reconhecidos do mundo, o jornalista John Allen Jr. aposta que os católicos se surpreenderão com o próximo papa. Conhecedor do perfil de cada um dos 117 candidatos, ele também aponta dom Cláudio como um dos grandes favoritos.
– Da mesma maneira que João Paulo II ajudou a derrubar a barreira entre o Leste e o Oeste, o próximo papa deverá unir os hemisférios Norte e Sul –afirmou Allen em seu livro Conclave, para justificar o palpite na escolha de um pontífice de um país em desenvolvimento.
De acordo com ele, dom Cláudio lidera o maior dos quatro grupos em que se divide o Colégio Cardinalício. Allen o chama de Grupo da Justiça Social, cujas principais preocupações são a globalização, a desigualdade econômica, as relações raciais e a Aids. Os outros grupos são a Patrulha da Fronteira (preocupada com a identidade do cristianismo), o Partido da Reforma (progressistas, adeptos das mudanças de rumo definidas mas não cumpridas no Concílio Vaticano II, na década de 60) e os Integralistas (conservadores extremos, membros de seitas como a Opus Dei).
O teólogo Leonardo Boff também acha que a América Latina tem chances, mas não acredita na candidatura de dom Cláudio. Segundo ele, os cardeais escolherão um papa com experiência pastoral, coisa que nenhum dos quatro cardeais brasileiros têm.
Acertar um prognóstico, porém, é coisa rara até para o mais profundo conhecedor do Vaticano. As especulações costumam começar antes mesmo da morte do pontífice, mas uma das poucas semelhanças entre os últimos quatro papas foi a exclamação em uníssono do povo ao serem apresentados da janela da Basílica de São Pedro:
– Quem?
MARCELO FLEURY - Zero HoraGrupo RBS Dúvidas Frequentes | Fale Conosco | Anuncie | Trabalhe no Grupo RBS - © 2008 clicRBS.com.br Todos os direitos reservados.