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A bióloga e pesquisadora da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul (FZB) Luiza Chomenko e o engenheiro agrônomo, Ph.D. em genética e professor da UFRGS Luiz Carlos Federizzi participaram na manhã desta terça-feira, dia 28, de um debate online no clicRBS. Os convidados responderam a perguntas de jornalistas da redação do clicRBS e de internautas. Confira abaixo a íntegra da conversa.
Pergunta: Quais as vantagens e desvantagens de se plantar sementes transgênicas?
Luiza Chomenko: No momento, por se tratar de uma nova ferramenta, ainda não se pode dizer quais serão as vantagens a médio prazo; a curto prazo, por estarem sendo discutidos apenas aspectos de Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) de primeira geração, as "teóricas" vantagens são questionáveis , pois estão abordando informações apenas parciais.
Luiz C. Federizzi: Primeiro é importante destacar que os transgênicos não são utilizados somente na agricultura, mas em varias áreas do conhecimento humano como na medicina e indústria. As vantagens dependem de cada caso e de cada tipo de transgênico. No caso específico da soja transgênica os agricultores fizeram uma rápida adoção porque a tecnologia é mais simples de realizar no campo, é bem mais barato e também diminui o impacto ambiental. Tal fato se deve pela diminuição dos produtos químicos aplicados na cultura da soja.
Pergunta: A produtividade dos transgênicos é diferente das variedades convencionais?
Luiza Chomenko: Mais uma vez cabe salientar que se falam em vantagens de curto prazo, sem qualquer avaliação de cunho ambiental, no ambiente brasileiro e muito menos no Rio Grande do Sul; quando, por exemplo, se fala da biodiversidade de nossa nação? Posso também questionar a alegada redução do uso de agrotóxicos, abordando vários aspectos, mas falo disto depois.
Luiz C. Federizzi: Não. A produtividade potencial é mais ou menos a mesma. A diferença está na redução dos danos causados pelos inços (plantas indesejadas) que, no caso das transgênicas, são melhor controlados. Como conseqüência a soja produzida tem menos impurezas e umidade.
Pergunta: Os transgênicos precisam de menor quantidade de agroquímicos? A utilização de apenas um tipo de substância, como no caso da soja RR, que só precisa de um agrotóxico específico, não pode gerar plantas resistentes, a exemplo do que acontece com os antibióticos?
Luiza Chomenko: Sim, e dados recentes inclusive publicados na ZH mostram que o Rio Grande do Sul tem uma das menores produtividades do Brasil; deve-se salientar que o Brasil - via Embrapa - desenvolveu cultivares das mais produtivas do mundo e que não são geneticamente modificadas.
Luiz C. Federizzi: Claro que o uso de um único produto pode gerar plantas resistentes aos herbicidas. Já existem plantas resistentes aos outros herbicidas utilizados em soja. Existe tecnologia para evitar que as plantas resistentes prevaleçam no campo. Portanto é recomendado há muito tempo que não se utilize somente um principio ativo, antes mesmo da presença de transgênicos.
Pergunta: Federizzi, a tecnologia é mais simples de realizar no campo. E a saúde humana? Por que vocês não se preocupam com isso? Outra coisa é que nos Estados Unidos, onde se planta há mais tempo, a produtividade não é tão alta como se dizia. Não estamos condenando o país a uma tecnologia que não se tem segurança?
Luiza Chomenko: A resposta para esta pergunta nos reporta diretamente à utilização do princípio da precaução, e daí nem só de soja se fala; poderíamos começar a discutir questões de outros OGMs que estão entrando no país sem o mínimo cuidado (teremos mais uma vez fato consumado), e daí com situações muito mais graves, pois se pensarmos no algodão (por acaso da mesma empresa da soja), e o Brasil sendo centro de origem...isto pode ser uma catástrofe em termos de humanidade; e sobre milho? Quem vai comprar nossos produtos se tivermos cada vez mais uso de OGMs e... com restrições cada vez maiores no mercado internacional? A gente nem está cumprindo as regras de rotulagem!
Luiz C. Federizzi: Boa pergunta. Em termos de saúde humana existe um grande número de trabalhos mostrando que não existem diferenças no consumo de soja normal ou transgênica. A questão dos rendimentos do Estados Unidos é porque lá o ambiente é diferente, o tipo de solo, a quantidade de luz e água disponível não é a mesma do Brasil. Veja o caso do milho, que é melhor adequado às condições americanas, quais são os rendimentos em relação aos obtidos no Brasil. Todos os pesquisadores são preocupados com a saúde humana e os dados de pesquisa até agora realizados mostram que não existem diferenças.
Luiza Chomenko: Professor, pode por favor reportar onde e em que condições cientificadas de experimentação (incluindo-se dados reais e eticamente confrontados), foram feitos estes estudos? Até agora o que se tem publicado sempre vem informando que faltam estudos, etc.
Luiz C. Federizzi: Respondendo à Luiza, existe um grande número de trabalhos publicados inclusive testando o que acontece com a ingestão em seres humanos por mais de duas semanas publicados na Revista Cientifica Nature Biotechnology que faz uma pequena revisão dos trabalhos realizados até então. Existem muitos outros que o tempo não permite relatar, mas este artigo vale a pena.
Luiza Chomenko: Grata, professor; o interessante é que estes dados sejam tão pouco divulgados se são tão corretos e bons.
Pergunta: A polêmica em torno dos transgênicos cresceu recentemente. Há quanto tempo são realizadas pesquisas com organismos geneticamente modificados e há quanto tempo eles estão disponíveis para consumo no mercado mundial e brasileiro?
Luiz C. Federizzi: Os primeiros organismos transgênicos começaram a ser realizados em 1984, quando a insulina humana transgênica foi colocada no mercado. A polêmica com os transgênicos é só na agricultura, não é engraçado? No Brasil nós trouxemos vacinas transgênicas de Cuba, produzimos com tecnologia nacional hormônio de crescimento humano e insulina. No mercado mundial a soja já esta à venda desde 1996, sendo que mais de 6 milhões de agricultores no mundo produzem.
Luiza Chomenko: A polêmica cresceu porque existe no Brasil um descumprimento às leis vigentes e no mundo começam cada vez mais a surgir questionamentos; a própria polêmica pela falta de dados (ou se existem, não há publicação) contribui para isto. É fundamental que se tenha claro que existem tipos de OGMs (1ª , 2ª e 3ª geração), com usos e funções distintas e há leis no país... que não são levadas em conta . É importante que estas situações estejam claras para todos participantes deste grupo (e da população em geral|).
Luiz C. Federizzi: Porque os agricultores brasileiros não seguiram a lei? Acho que seria importante responder esta pergunta. Porque os pesquisadores brasileiros tiveram dificuldades inclusive de realizar as pesquisas, porque alguns pesquisadores foram ameaçados e laboratórios foram queimados? E o que está acontecendo no mundo com quem está pesquisado? Há uma visão distorcida de que só as multinacionais pesquisam transgênicos, mas e o caso de Cuba e China, onde a pesquisa é estatal?
Luiza Chomenko: Há poucos dias saíram matérias sobre dados excelentes de pesquisas no Brasil; o problema é que é por vezes cômodo fazer-se de conta que não se faz por culpa de órgãos de Meio Ambiente, etc... mas ao mesmo tempo se incrementando descumprimentos legais. Quanto à pesquisa da China, eu participei de AP inclusive do Senado com missão na China, e as condições são muito distintas daqui (e... se cumpre a lei).
Luiz C. Federizzi: Na China se cumpre a lei porque a lei é passível, o que não é o caso brasileiro. Recomendo ver artigo na Revista Nature e Science do presidente da Academia de Ciências da China.
Pergunta: Quando poderemos contar com OGMs de segunda e terceira geração? E qual a diferença destes para agora?
Luiza Chomenko: Explicando: 1ª geração - resistentes a agrotóxicos (exemplo soja RR), ou sendo os próprios (milho Bt, etc..); 2ª geração - melhoramento de condições (ex: resistentes a frio, temperatura); 3ª geração - incorporarão medicamentos (ex: arroz "dourado").
Pergunta: O controle sobre uma insulina fabricada em laboratório e vendida apenas a diabéticos em tubos hermeticamente fechados é diferente do de uma lavoura que pode polinizar a do vizinho. Não são riscos diferentes?
Luiza Chomenko: Claro que as condições são distintas; a pergunta é ótima; também é previsto em lei que distintos casos tem formas distintas de avaliação juntos aos vários órgãos competentes (Meio Ambiente, Agricultura, Saúde , CTNBio); só para esclarecer ainda, a Dra. Fátima Oliveira (site na internet disponível), diz que a insulina tão "vendida" como um exemplo ótimo (é bom, não resta duvidas), não é tão inofensiva assim, e inclusive os problemas decorrentes de seu uso são muito maiores do que com insulina convencional. Portanto... todo cuidado com o uso desta ferramenta é fundamental.
Luiz C. Federizzi: Os riscos são diferentes, mas a tecnologia é a mesma. Este é o ponto chave. Não é a tecnologia que é ruim ou má , mas sim seu uso. Voltando à questão no caso da soja: pelo tipo de flor e reprodução que possui, a possibilidade de contaminação via pólen é extremamente baixa. Por outro lado, a insulina é utilizada diretamente no ser humano, que é um ser promíscuo e que se movimenta muito. Não teria ele o perigo de contaminar os demais?
Pergunta: Como saber se a médio e longo prazo os transgênicos não farão mal para os humanos? E nos campos da economia, política, meio ambiente, quais são as implicações do uso de transgênicos?
Luiz C. Federizzi: Quanto aos aspectos econômicos, a resposta de 6 milhões de agricultores do mundo usando a tecnologia, dispensa qualquer comentário. Quanto à saúde, a longo prazo, porque mudaria depois de três, quatro ou 20 anos? Se conhece o DNA introduzido e também qual a proteína resultante, portanto são conhecidos os resultados. Quanto à questão ambiental, somente em um ano o uso de milho com resistência a insetos e algodão reduziram a aplicação de 530 caminhões de 40 toneladas de produtos químicos. Também existem trabalhos em lavouras grandes, médias e pequenas realizadas no Reino Unido por quatro anos comparando transgênicos e não transgênicos e medindo tudo o que é possível no solo e no ambiente, sem diferenças.
Luiza Chomenko: A gente nem precisa ir muito longe para identificar já alguns problemas, inclusive de ordem econômica; basta ver incremento de custos de insumos, royalties (que sempre se diz que no Brasil nunca seriam cobrados dos agricultores etc). E a venda casada "agrotóxico + OGM", hein? E a falta de rotulagem? E nossos direitos de cidadão? E a busca de mercados? Só a propósito a Argentina está sendo cobrada pela empresa detentora da tecnologia pelos royalties. E daí ... isto é ou não dano? Este já é visível. Com certeza deverão ter centenas de outros que ainda nem se falam.
Luiz C. Federizzi: A lei brasileira diz que somente royalties devem ser cobrados sobre o uso de sementes. Agora, a lei não proíbe que os agricultores façam um acordo com quem eles quiserem.
Luiza Chomenko: Muito complicado comparar dados ambientais em outros países, ainda mais na Europa, que praticamente nem tem mais biodiversidade nativa. Só vou dar um pequeno dado: o Rio Grande do Sul tem centenas de espécies vegetais em extinção, e tem animais em listas oficiais de importância global, com cerca de 50 espécies (falo apenas de fauna macroscópica de alguns grupos!), e as causas principais são devido ao uso de agricultura e degradação de habitats.
Pergunta: Quais os fatores ideais de segurança a serem identificados em pesquisas antes de liberar cultivos de OGM para fins comerciais?
Luiz C. Federizzi: Existe todo um protocolo a ser seguido. Primeiro tem que estar descrito a origem do DNA que esta sendo transferido, sua seqüência completa e o tipo de proteína resultante. Esta proteína é comparada com um banco de proteínas que causam alergias, para ver se elas têm configurações similares. Após são realizados testes "in vitro" com os ácidos do estômago, quanto mais tempo a proteína demora a ser degrada mais ela pode causar alergia. Muitos transgênicos pararam aqui porque poderiam causar alergias. Seguindo são realizados testes com ratos, depois com frangos, animais maiores etc. Isto no laboratório, no campo são realizados testes em diferentes ambientes de cultivo, pelo menos por três anos, e, dependendo da espécie, são necessários outros testes.
Luiza Chomenko: Só pra complementar a resposta do Prof. Federizzi, sobre testes, protocolos etc, há legislação que define este parâmetros, condições etc. E cada caso é um caso.
Pergunta: Dr. Federizzi, se um agricultor reproduzir suas próprias sementes a partir de uma lavoura transgênica plantada com sementes contrabandeadas da Argentina, como será feita a cobrança de royalties? Não haverá cobrança? Qual a origem das sementes transgênicas que os agricultores estão plantando nesta safra?
Luiza Chomenko: Por não serem adequadamente informados, os usuários de OGMs de todo mundo acabam "entrando" no uso desta tecnologia e depois são cobrados; por que não são esclarecidos antes? Ou alguém já esqueceu da polêmica que houve (e há), quando a empresa detentora desta tecnologia e semente (outras virão) , passou a cobrar o que lhe é devido?
Luiz C. Federizzi: A maior biodiversidade de cultivos está aqui no Sul da América do Sul. Podem ser plantadas mais de 50 espécies por ano. Aqui o agricultor pratica a biodiversidade. Portanto, o agricultor por causa do plantio de duas culturas por ano, e devido à rotação de culturas pratica a biodiversidade na pratica. Prezada Luiza, se estivéssemos falando de transgênicos de espécies da Amazônia seria outra coisa, não?
Luiza Chomenko: Acho que o professor não entendeu! Eu não estou falando de agrobiodiversidade; falo de biodiversidade natural ... existente no RS , no Brasil, e no mundo!! Falo daquela que é a nossa maior riqueza e que o mundo inteiro busca coletar (às vezes até piratear), inclusive sendo de interesse das mesmas empresas que produzem os agrotóxicos e OGMs; é bem diferente de falar de biodiversidade de uso agrícola modificada no correr dos séculos pela humanidade e pela natureza.
Luiz C. Federizzi: Cara Luiza, a Biodiversidade do Rio Grande do Sul não foi afetada pelos transgênicos, já se cultivava 3,5 milhões de hectares no Rio Grande do Sul, um milhão de milho e um milhão de arroz só no verão.
Luiza Chomenko: Professor, acho que teremos de pedir para a RBS fazer mais chats desses para a gente discutir estes temas que o senhor referiu ... Pois acho que estamos falando de Estados distintos.
Pergunta: Além da soja RR, que outros alimentos geneticamente modificados já sendo desenvolvidos e comercializados no Brasil e no mundo?
Luiz C. Federizzi: No Brasil não estão sendo comercializados outros produtos da área alimentar. No mundo, dependendo de cada país. Na China há 12 espécies de plantas sendo cultivadas comercialmente, existe ainda no mundo coalho de queijo, papaya transgênico produzido no Havaí, na Europa tem milho e canola transgênica, o mesmo no Canadá. Vi estudos recentes do uso de videira transgênica resistente a vírus que estão sendo testados no campo na França. Vacinas comestíveis sendo desenvolvidas no mundo inteiro, na indústria há a utilização de bactérias para o tingimento de tecidos etc.
Luiza Chomenko: Alimentos que tenham em sua composição OGMs são muitos. O problema é que nós não sabemos, pois a legislação que (regula) a rotulagem no Brasil não é cumprida. Este é um aspecto a mais que sempre enfatizo em todos os locais aonde vou. O acesso à informação é fundamental e direito de todos cidadãos e obrigação de todos. Mas quem sabe isto?
Pergunta: Existe alguma perspectiva para realização de Estudo de Impacto Ambiental para os transgênicos? A falta de estudo de impacto ambiental não contraria a nossa Constituição Federal, que estabelece o princípio da precaução?
Luiz C. Federizzi: Claro que é importante que se façam os estudos de impacto ambiental, só que infelizmente no Brasil não dava para fazer, porque os entraves burocráticos não permitiam, parece que agora vai ser possível.
Luiza Chomenko: A pergunta procede: a lei existe... Não foi revogada, só que ninguém faz estudos. Aliás, a própria empresa detentora da soja RR fez esses estudos, mas, curiosamente, não os entrega no órgão competente (Ibama). Então se pergunta: por que será?
Pergunta: Estimular culturas extensivas de soja e outros produtos não é prejudicial ao meio ambiente? No caso do Centro-Oeste, divisor de águas do país, não existe risco de alterações ambientais pela devastação do Cerrado? As tecnologias transgênicas não estimulam mais ainda o plantio em larga escala?
Luiz C. Federizzi: A tecnologia transgênica nem está sendo utilizada em grande escala no meio-oeste brasileiro, portanto, não pode ser a culpada da devastação do Cerrado. Evidentemente, qualquer expansão em área para a agricultura ou para o surgimento de novas cidades precisa se dar com cuidado.
Luiza Chomenko: Eu estava esperando por esta pergunta. Quem está/onde avaliando o impactos da FALTA de água (no nosso planalto nunca se plantava com culturas irrigadas, mas agora, sempre). E... a água vem de onde? Criaram-se novas fontes? Não! Então... aguardemos, pois o pior ainda não começou, ou alguém tem duvidas que a água será o grande fator de problemas mundiais (Já é!)?
Luiz C. Federizzi: Uma última questão é que o Brasil tem gente tem tecnologia para fazer os transgênicos que são importantes para toda nossa sociedade. Lembre-se de que a transgenia é uma técnica que deve ser estudada e realizada pelos pesquisadores brasileiros e não é exclusividade das empresas multinacionais. Se nós não fizermos vamos comprar.
Luiza Chomenko: De minha parte eu agradeço pela oportunidade, saúdo a todos os participantes e continuo dizendo: o mais importante é o acesso ético e correto à informação; a escolha de usos posteriores é opção de cada um (desde que saiba todas interfaces existentes).
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