| 15/09/2003 19h35min
Agentes do Estado, entre eles policiais, investigadores e carcereiros, são os principais envolvidos – seja por ação ou omissão – nos casos de execução sumária no Brasil, denunciou o Centro de Justiça Global e o Núcleo de Estudos Negros (NEN) em um relatório divulgado nesta segunda, dia 15.
Em levantamento inédito das execuções sumárias ocorridas entre 1997 e 2003, uma equipe de 18 pesquisadores percorreu 24 Estados do país durante 10 meses e concluiu que a impunidade daqueles que "cometem esses crimes é um fator fundamental para a continuidade das violações de direitos humanos no Brasil".
– Episódios internacionalmente conhecidos como Eldorado dos Carajás, Candelária, Carandiru, Corumbiara e Favela Naval são expressões máximas de uma sistemática de extermínio e opressão perpetrada diariamente, direta ou indiretamente, por agentes do Estado em praticamente todo o território nacional – diz o relatório.
O documento foi feito em preparação à visita da relatora da Organização das Nações Unidas (ONU) para execuções sumárias, Asma Jehangir, que permanecerá de 16 de setembro a 8 de outubro no país a fim de acompanhar de perto os desdobramentos do número crescente de denúncias sobre esse tipo de caso no Brasil.
A divulgação do relatório bastante duro coincide com as investigações de uma chacina que resultou na morte de oito pessoas na última sexta, dia 12, em São Félix do Xingu, interior do Pará, no que parece ser uma disputa fundiária. A polícia suspeita que o crime tenha sido cometido por capangas de uma fazenda da região.
Usando cifras oficiais, o relatório documenta 349 casos emblemáticos de execuções entre 1997 e agosto de 2003. Em 202 casos, as autoridades não chegaram a punir os autores dos crimes, segundo o texto.
As polícias de Rio, São Paulo, Espírito Santo, Distrito Federal e Bahia aparecem no relatório como especialmente violentas. Em uma análise do número de pessoas mortas por policiais militares em serviço durante o ano 2000, São Paulo aparece em primeiro lugar, com 524 óbitos, seguido pelo Rio (com 248) e Bahia (com 88).
Analisados em proporção com o tamanho da população, o Distrito Federal aparece na frente, com uma taxa de 2,38 pessoas mortas por PM em serviço para cada 100 mil habitantes, seguido pelo Rio de Janeiro (taxa de 1,78) e por São Paulo (1,44).
Quando se compara o número de pessoas mortas por PMs pela quantidade de policiais, o Rio de Janeiro sai na frente (taxa de 7,45 para cada mil policiais), seguido por São Paulo (6,36) e Espírito Santo (4,33).
Segundo o relatório, a análise das necropsias dos cadáveres indica a intenção de "eliminar os suspeitos" dos policiais. O texto diz, por exemplo, que 61% dos mortos pela polícia receberam ao menos um disparo na cabeça e 46% dos cadáveres apresentaram quatro ou mais impactos de bala, "sendo que via de regra um ou dois disparos bastam para imobilizar uma pessoa".
– Nunca se privilegiou uma política de segurança pública – disse o ex-ouvidor da polícia de São Paulo, Fermino Fecchio, que agora é assessor da Secretaria de Segurança Pública do governo federal.
– Se isso não mudar, a polícia não vai mudar.
Na semana passada, porém, o governo do Rio reconheceu publicamente a existência de tortura em delegacias e presídios do Estado. A admissão foi feita depois da morte do chinês Chan Kim Chang, que havia sido detido no aeroporto do Galeão quando tentava embarcar para os Estados Unidos levando consigo US$ 30 mil não-declarados.
Em um recente relatório, a Anistia Internacional disse que a polícia carioca havia matado 621 pessoas nas favelas da cidade no primeiro semestre, um número recorde. Assim como fez a Justiça Global, a Anistia caracterizou o comportamento da polícia nas favelas cariocas como violento, repressivo e frequentemente corrupto. As informações são da agência Reuters.
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