| 05/03/2007 07h20min
O braço esquerdo está machucado, mas não é resultado do embate que trava atualmente com o deputado federal Michel Temer (SP) pela presidência do PMDB. A ferida é uma queimadura provocada pela água quente do chimarrão. Nelson Jobim não dispensa o hábito gaúcho.
Foi com uma cuia na mão que recebeu a Agência RBS, na manhã de sábado, no seu escritório de advocacia no Lago Sul, região nobre de Brasília. A sala reúne móveis antigos, computadores de última geração e fotos, muitas fotos de sua passagem pelos três poderes da República. É ali que Jobim planeja o último roteiro de campanha antes da convenção, no próximo domingo. E revela em detalhes o processo que o levou a querer ser presidente do maior partido do país, depois de, junto com o ministro Tarso Genro (Relações Institucionais), ajudar a construir os pilares do governo de coalizão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De memória, cita diálogos travados com Temer, hoje seu adversário, por ocasião do anúncio de sua candidatura, logo depois da vitória de Lula.
– Sou candidato à presidência do partido - disse Jobim.
– Vamos acertar para que sua candidatura nasça de dentro do partido, como candidatura única. Não pode ser contra mim. Antes, eu preciso encontrar uma saída – teria rebatido Temer.
Ambos teriam ficado de acertar os detalhes em fevereiro. Ao retornar de viagem, porém, Jobim foi surpreendido com a decisão de Temer. O gaúcho não guarda mágoa pelo recuo do adversário, mas está disposto a ir até o fim na empreitada. O único risco, diz, é o de ser derrotado.
Pergunta – Quando o senhor deixou o Supremo Tribunal Federal, disse que só queria advogar. O que o fez mudar de idéia?
Nelson Jobim – Queria advogar e voltar a minha atividade política. Não queria participar de ministério ou ser candidato a alguma coisa. Lá atrás, em outubro, o governador do Paraná, Roberto Requião, falou na minha eventual candidatura à presidência do PMDB, o que me interessou. Penso que o partido está enraizado nos diretórios estaduais, mas não tem nenhuma presença nacional. Embora seja uma grande força política regional, na verdade, o PMDB não é nada nacionalmente.
Pergunta – E o que falta para o PMDB ter um projeto nacional?
Jobim – Um projeto de inserção do partido nas questões nacionais. Se você perguntar qual é a posição do PMDB sobre reforma tributária, sistema financeiro nacional, autonomia do Banco Central, questão ambiental e reforma política, não tem absolutamente nada. O partido não tem posição sobre assunto nenhum. Isso leva os deputados a ter de produzir as próprias posições.
Pergunta – Mas o que diferencia o senhor do seu adversário, Michel Temer, atual presidente do PMDB?
Jobim – Exatamente isso. Michel é presidente da legenda há seis anos, e o partido não tem nenhuma discussão sobre nenhum tema. Quero abrir discussão para formular um projeto que vai dar unidade ao tripé projeto-unidade-2010. Ou seja: ter candidato à Presidência em 2010 não significa já escolher nomes. Li a entrevista que Temer deu a Zero Hora (publicada na edição de sábado) já dizendo que eu sou virtual candidato. Isso não tem sentido.
Pergunta – Mas é possível ter candidato em 2010?
Jobim – Evidentemente. Mas é preciso seguir um cronograma. Até abril de 2008, se pode fazer uma grande discussão nacional do partido. Em 2008, teríamos as eleições municipais e ajustaríamos as propostas para ter um projeto em 2010.
Pergunta – O senhor não acha que é praticamente nula a chance de o PMDB sair unido desse processo eleitoral interno?
Jobim – Unidade não se produz por relações pessoais. A inexistência de um projeto leva ao clientelismo. Veja a discussão de hoje sobre cargos para o PMDB. Dentro de uma coalizão, é evidente que o partido tem de ter participação efetiva, mas para executar o projeto do partido junto com a coalizão, não para o personagem fazer proselitismo.
Pergunta – Essa crítica que o senhor tem feito ao clientelismo do PMDB não dificulta sua eleição?
Jobim – Você não entendeu. Cargos existirão. Mas não se pode estabelecer a distribuição de cargos por relações pessoais ou por vantagens.
Pergunta – Qual será o tamanho do PMDB dentro do governo?
Jobim – Não sei. Isso vamos discutir depois da eleição.
Pergunta – Três, quatro ou cinco ministérios?
Jobim – Poderá ser, mas quem tem de discutir isso é o presidente do partido. E no momento é Michel, que está fazendo isso, no meu ponto de vista, de forma divisória, dividindo cargos entre o Senado e Câmara. Mas e a necessidade de se discutir o problema fiscal dos Estados? Em que momento se discutiu isso, no sentido de tomar uma bandeira para seus governadores? Cada governador sai atrás de uma solução. Lembro do ex-governador Germano Rigotto tentando resolver os problemas do Rio Grande do Sul sem nenhum respaldo partidário.
Pergunta – O presidente Lula, ao demonstrar uma preferência pela sua candidatura, não demonstra que uma vitória do senhor possa atrelar o partido ao governo?
Jobim – Não me atrelo a ninguém. O fato de ter preferência é uma questão de reservas. O presidente não nenhuma reserva comigo. Agora, ele poderá ter problemas com Michel Temer, que ontem estava no palanque da oposição, com um discurso duro.
Pergunta – A preferência de Lula pela sua candidatura ajuda ou atrapalha?
Jobim – Tem de perguntar isso para o eleitor.
Pergunta – E o que o senhor está sentindo?
Jobim – Acho que está ajudando. Grande parte do partido tem grande vinculação a Lula. Aqueles que adotaram a candidatura de Geraldo Alckmin foram derrotados.
Pergunta – Há informações de que o Planalto já trabalha com sua derrota e que talvez deflagre a reforma ministerial antes da convenção. Se isso ocorrer, atrapalha sua eleição? O senhor tem votos para ganhar?
Jobim – Vamos discutir isso no próximo domingo. Se perguntar ao grupo que me apóia, eles trabalham com um valor X. Se perguntar ao de Michel é um percentual Y. Somados, sempre serão superiores a 100%. Não trabalho com especulação.
Pergunta – O senhor tem informações que o Planalto já jogou a toalha?
Jobim – Não ouvi nada. É a primeira vez.
Pergunta – O senhor tem conversado com o presidente Lula diariamente?
Jobim – Não. Eu me reuni com ele na sexta-feira da semana passada. Foram conversas gerais, não em relação à campanha.
Pergunta – Esse projeto nacional que o senhor vislumbra para o PMDB está mais parecido com as idéias do PT ou do governo do PSDB do qual o senhor participou?
Jobim – Nenhuma das duas. O PSDB tem suas propostas, que estão mais à direita hoje, mais ligadas ao setor financeiro. Esqueçamos PT, PSDB e PFL. O PMDB tem de ter seu próprio nicho para não sermos mais caudatários de ninguém nos processos eleitorais futuros.
Pergunta – Quem são os grandes nomes do PMDB que defendem sua candidatura?
Jobim – Jarbas Vasconcelos, Pedro Simon, cinco governadores (Luiz Henrique, de Santa Catarina, Roberto Requião, do Paraná, Sérgio Cabral, do Rio, Eduardo Braga, do Amazonas, e Marcelo Miranda, de Tocantins).
Pergunta – Porque o senhor não citou os senadores José Sarney e Renan Calheiros?
Jobim – José Sarney, Renan Calheiros...
Pergunta – Foi proposital deixá-los no fim da lista?
Jobim – Quer inverter a lista? Não tem problema nenhum (demonstrando irritação). Estou demonstrando que essa afirmação de que a minha candidatura é do Senado é falsa. É da tentativa de polarização Senado-Câmara. Isso não é fórmula de conduzir o discurso partidário. Se for verdadeira essa fórmula, seria Michel o candidato da Câmara? Seria a desunião total do partido. Não pertenço a grupo nenhum.
Pergunta – Essa candidatura à presidência do partido é um ensaio para voltar a disputar cargos eletivos?
Jobim – Não tenho desejo nenhum.
Pergunta – O senhor foi deputado constituinte, ministro da Justiça, presidente do Supremo Tribunal Federal. Qual é o sentido de a esta altura da vida disputar a presidência de uma legenda tão dividida?
Jobim – Para implantar a união do partido. Toda essa biografia a que você se referiu devo à eleição de 1986. Se consegui tudo isso, foi por causa do PMDB e, fundamentalmente, de dois personagens: Pedro Simon e Ulysses Guimarães. Estou retomando uma espécie de volta para que possa ajudar o PMDB a mudar essa perspectiva de isolacionismo, de uma confederação de partidos regionais.
Pergunta – Seus adversários têm dito que Jobim quando chega ao céu, esquece dos humanos. Essa imagem que tentam passar do senhor prejudica?
Jobim – Essa é uma posição cretina. Sabe qual é a diferença? Não tenho esperteza. Se querem ouvir de mim alguma coisa, digo aquilo que penso. A regra hoje é a da esperteza, do sujeito que quer enganar o outro, e isso tem de desaparecer do partido. Temos de ter transparência.
Pergunta – Há alguma possibilidade de consenso até a convenção?
Jobim – Se Michel quiser retirar a candidatura...
Pergunta – E o contrário?
Jobim – Não faço acordo nesse sentido. E por uma razão simples. Michel propôs um acordo para eu ficar de secretário-geral durante um ano. Só que há uma cronologia para ser cumprida. E este ano é preciso pensar em um projeto para o PMDB. E não há como fazer isso, porque não é do perfil do Michel.
Pergunta – Para encerrar, o ex-governador Germano Rigotto perdeu uma disputa interna por conta de um complicado cálculo. O senhor não tem medo de ser enganado pela matemática do seu partido?
Jobim – Não. (Risos) Essa matéria eu conheço. Sou pós-graduado em matemática e lógica.
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