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 | 11/02/2005 15h15min

Engenheiro alerta para problemas na gestão das águas

Associação ambiental diz que perdas da seca poderiam ser minimizadas

As conseqüências de uma das mais severas estiagens das duas últimas décadas no Rio Grande do Sul – como o racionamento de água na Região Metropolitana e as perdas na agricultura – poderiam ser minimizadas com uma melhor gestão dos recursos hídricos. A opinão é do engenheiro Luiz Antônio Grassi, coordenador da Câmara Técnica de Recursos Hídricos da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes), que participou de entrevista online nesta sexta-feira, dia 11, no clicRBS.

O representante da Abes afirma que é preciso fortalecer os Comitês de Bacia estabelecidos na Lei Estadual das Águas e alerta:

– Já há problemas endêmicos com escassez de água no país.

A entrevista online com o engenheiro Luiz Antônio Grassi foi realizada pela jornalista Gisele Neuls e monitorada por Ana Maria Acker. Internautas ecaminharam perguntas que foram avaliadas pelo clicRBS. As mais relevantes foram encaminhadas ao convidado e publicadas. Veja abaixo a íntegra da entrevista.

clicRBS: O Estado sofre mais com falta de água ou má gestão dos recursos hídricos?

Luiz Grassi: A falta de uma gestão mais competente dos recursos hídricos faz com que a estiagem que se repete seja mais sentida em seus efeitos

clicRBS: É possível diagnosticar onde estão os problemas de gestão?

Grassi: Creio que Estado e sociedade ainda não se deram conta da prioridade que deveria ter a gestão das águas através do Sistema Estadual de Recursos Hídricos, que foi criado pela Lei Estadual das Águas em 1994. Ainda não foram criadas as instituições de apoio técnico aos Comitês de Bacias hidrográficas que possibilitarão a elaboração dos planos de bacias com a conseqüente prevenção dos efeitos mais negativos da falta ou do excesso das águas na natureza.

Internauta: Por que o poder público está destruindo barragens feitas por arrozeiros no Rio Gravataí?

Grassi: tanto a Lei Federal das Águas quanto a Constituição do Rio Grande do Sul e a Lei Estadual determinam que o abastecimento humano tem prioridade sobre qualquer um dos outros, portanto qualquer obra, especialmente as irregulares (que não tem outorga do Estado), não podem continuar prejudicando o abastecimento público.

clicRBS: Que medidas práticas são possíveis para contornar estiagens como as dos dois últimos verões?

Grassi: Uma vez instalado o evento (estiagem) só podem ser tomadas medidas imediatistas e paliativas. Para prevenir futuras ocorrências é preciso que o governo, juntamente com a sociedade, agilize o planejamento dos recursos hídricos em seus usos e na sua proteção. É o que tem feito outros países com bons resultados. Não se consegue controlar a Natureza, mas é possível prever e diagnosticar os usos, as disponibilidades e estimar a freqüência e a intensidade das estiagens, assim como das enchentes.

Internauta: De alguma forma os efeitos da estiagem podem afetar os preços ao consumidor?

Grassi: Esta pergunta deve ser feita aos órgãos que prestam serviços de abastecimento (Companhia Riograndense de Saneamento, etc.). Entretanto, o custo de algumas medidas remediadoras de efeito mais imediato pode ter reflexos sobre os custos operacionais dos sistemas. Seria bem mais recomendável gastar com a gestão (planejamento, prevenção) do que esperar os danos.

Internauta: Nos últimos tempos temos ouvido falar em escassez de água potável no futuro, em problemas sérios de abastecimento nas grandes cidades em prazos relativamente curtos - 10, 20 anos... esse risco existe?

Grassi: Não só existe como está ocorrendo, embora de forma temporária, entre nós. Outras regiões ou cidades (São Paulo, por exemplo) já apresentam situações de escassez endêmica. creio que não devemos esperar que isso ocorra entre nós. Temos um sistema público de gestão dos usos e da proteção das águas, onde os comitês de bacias desempenham um papel importante, sistema que precisa urgentemente ser fortalecido e completado.

clicRBS: Você pode citar experiências positivas de gestão praticadas em outros países?

Grassi: A França, a Espanha (que é um país árido) e outros países europeus têm enfrentado com sucesso comprovado, não só os problemas de escassez provocados pela estiagem, mas também a chamada escassez pela qualidade (falta de água por causa da poluição).

clicRBS: Por que os agricultores fazem barragens irregulares, como as encontradas em Gravataí? Existe desconhecimento da legislação?

Grassi: Suponho que a primeira motivação seja o desespero pela possível perda de suas culturas. Infelizmente, antes dos usuários - seja da agricultura, seja da indústria ou de qualquer outro uso - utilizarem as águas de uma bacia hidrográfica como a do Gravataí, não levam em conta a disponibilidade que a natureza oferece. No caso do Gravataí, sabe-se que há dados suficientes no Departamento de Recursos Hídricos (DRH) da Secretaria Estadual do Meio Ambiente para definir as outorgas possíveis. Isto tem que ser respeitado.

clicRBS: O que pode ser feito para evitar que a água em Porto Alegre fique com gosto e cheiro forte em épocas de estiagem? O investimento é muito grande?

Grassi: A solução também é planejamento e prevenção. Medidas de proteção dos mananciais, como a redução dos nutrientes tanto de origem agrícola quanto humano, reflorestamento e proteção de regiões de recarga, como os banhados, etc.

clicRBS: Como o você avalia a política de recursos hídricos do Estado?

Grassi: Temos uma boa lei, aliás pioneira no Brasil; temos a maioria dos Comitês funcionando com grande esforço, temos o DRH e a Fundação Estadual de Proteção Ambiental atuando, embora com muitas deficiências materiais, mas não temos as agências de região hidrográfica, que são fundamentais para a implantação dos planos de bacias e dos instrumentos de gestão. É urgente que o governo, a sociedade e a mídia priorizem a gestão das águas e não se ocupem do assunto apenas durante as crises.

clicRBS: O investimento em barragens como reservas de água pode ser uma solução para nosso Estado?

Grassi: Sim, desde que dentro de um planejamento de cada bacia hidrográfica e dos recursos hídricos do Estado como um todo.

Internauta: Barragens é o que a classe produtora rural quer discutir. O problema é a legislação ambiental sobre áreas de proteção permanente...

Grassi: Tens toda a razão. 2004 foi considerado o Ano Estadual das Águas. No manifesto que mais de cem entidades lançaram no Palácio Piratini eram feitas estas mesmas recomendações e estes mesmos alertas. Será que todo o esforço do Ano Estadual das Águas não foi suficiente para sensibilizar o governo, a sociedade e a mídia?

clicRBS: Muitos agricultores, especialmente os pequenos, têm passado por dificuldades financeiras em função da falta de chuva no Rio Grande do Sul. Seria possível planejar o plantio de forma a reduzir as perdas com a estiagem? Como isso poderia ser feito?

Grassi: Há diversas formas de minimizar os efeitos de uma estiagem. Por um lado, aumentando a oferta sazonal com o aumento do armazenamento (sempre dentro de um planejamento por bacia hidrográfica). Por outro lado, com a racionalização da demanda. Já tem havido diversos estudos e debates entre irrigantes, com a intermediação de comitês de bacia, visando estabelecer quantidades mais racionalizadas de uso da água nas lavouras.

 
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