| 08/12/2008 06h20min
A bordo de um orçamento trilionário, Paulo Bernardo, ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, enfrenta o desafio de cortar quase R$ 9 bilhões do plano para 2009 que já está no Congresso. Sem papas na língua, critica exageros no superávit – que classifica de pornográfico – e até ameaça o sistema financeiro com “joelhaços”. Com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, forma a trinca que negociou no Congresso as medidas de combate à crise. Deputado eleito pelo Paraná, circula com desenvoltura entre aliados e oposição. Para controlar o estresse, modera no cafezinho – não mais de quatro xícaras por dia. Mas descontrai mesmo com futebol – é torcedor do Palmeiras, do Atlético Paranaense e do Londrina:
– O Londrina é um time fora de série. Não está em série nenhuma!
Veja os principais trechos da entrevista concedida na sala de reuniões do ministério:
Agência RBS – O presidente Lula pediu ao Ministério do Trabalho e à equipe econômica medidas para manutenção do emprego em 2009. O que pode ser feito?
Paulo Bernardo – Estamos bem porque o Brasil, neste ano, já teve mais de dois milhões de empregos gerados com carteira assinada. Como há uma previsão de menos atividade econômica, menos crescimento, provavelmente a geração de emprego vai cair bastante em 2009.
Agência RBS – O que é bastante?
Paulo Bernardo – Se gerarmos 1,5 milhão de empregos será um número expressivo, mas quase 700 mil a menos do que esse ano, uma queda brusca. Precisamos de mecanismos que possam ajudar a manter a produção. A reforma tributária, que não foi votada, reduz a contribuição patronal de 20% para 14% e tira mais 2,5% do salário educação do salário, o que significa reduzir 8,5% de impostos dos salários. É lógico que vai estimular emprego, facilitar a formalização e ajudar a criar mais emprego. Então precisamos aprovar a reforma. Ajuda muito na questão do emprego.
Agência RBS – E há um plano B? Aplicar recursos, assegurar mais capital de giro?
Paulo Bernardo – Isso nós vamos fazer. O BNDES este ano vai fechar em R$ 90 bilhões efetivamente desembolsados. E para o ano que vem tem demanda para mais de R$ 100 bilhões. Estamos trabalhando para garantir recursos a todas essas operações, ou seja, completar o que falta. A Caixa Econômica Federal está fechando este ano com financiamentos imobiliários da ordem de R$ 22,1 milhões. Não vamos mexer nas taxas e queremos manter a oferta para quem quiser comprar casa própria. Capital de giro para o setor exportador, fomento para as empresas que querem investir, tudo isso está planejado. Queremos manter todo apoio à iniciativa privada para que a produção não desacelere tanto.
Agência RBS – O senhor já disse que o Brasil não tem sistema bancário que merece. Como fazer chegar os recursos liberados pelas medida de crédito?
Paulo Bernardo – Nosso sistema financeiro é sólido. O que eu disse é que, ao menor sinal de crise, saiu todo mundo correndo. É uma atitude ruim, porque o banco tem de ver o setor produtivo como parceiro, não pode só emprestar dinheiro quando o sujeito não precisa. Eu tenho dinheiro aplicado e fica o gerente ligando para ver se eu não quero financiar alguma coisa. Quando eu tenho dificuldade ele some. Estamos dialogando, mas talvez precise dar uns joelhaços para o pessoal entender qual é a missão de cada um.
Agência RBS – Que joelhaços seriam esses?
Paulo Bernardo – Temos de criar condições para que funcione normalmente. Se não, talvez aplicar medidas restritivas. O governo tem de exercer também atividade regulatória. As cooperativas de crédito têm crescido muito, temos de prestigiá-las. Os bancos públicos não vão dar conta de tudo.
Agência RBS – O governo aposta em crescimento de 4% em 2009, mas muita gente considera otimismo demais. Em que índice o senhor confia?
Paulo Bernardo – A gente devia prever 3,5%. O ministro Guido Mantega nos convenceu de que devíamos trabalhar com 4%. Mas se cruzarmos os braços e ficarmos observando, não vai dar nem 3%.
Agência RBS – Como manter investimentos do PAC, na educação e ajuda às empresas ?
Paulo Bernardo – Vamos continuar com uma política fiscal responsável. Em 12 meses, estamos com superávit primário de 4,6%, para a meta de 3,8% este ano. O resultado de janeiro a setembro é pornográfico: 5,6%. Não vamos diminuir a meta para 2009. Mas podemos ter um resultado cravado. Isso significa irresponsabilidade? Não. Onde houver condição de economizar, vamos cortar. Mas onde precisar, vamos aplicar, como no fomento às empresas.
Agência RBS – O que é um superávit pornográfico?
Paulo Bernardo – Talvez seja uma expressão inadequada, mas é um resultado muito alto, muito acima do que prevíamos. Temos contas mais altas em dezembro, porque já pagamos metade do 13º para aposentados e servidores, mas estamos bem acima da meta.
Agência RBS – O que o leva a crer em corte de juro em 2009?
Paulo Bernardo – No mundo inteiro, as taxas estão caindo. Mas até o começo de outubro, estivemos em situação diferente, e o Banco Central trabalhava para conter a inflação. A situação mudou. Temos de cuidar da atividade econômica. Essa demanda que ainda está aquecida por conta do emprego tende a diminuir no começo do ano. Provavelmente vamos ter menos pressão inflacionária, abrindo espaço para o BC fazer a política monetária ajudar a economia.
Agência RBS – O pior já passou ou haverá impacto em 2009?
Paulo Bernardo – Teremos um primeiro semestre ruim, comparado com o deste ano. Por outro lado, a crise começa a ser solucionada. Provavelmente no segundo semestre de 2009 teremos já um cenário de saída da crise. O Brasil vai se beneficiar disso também.
Agência RBS – Esse cenário compromete a sucessão do presidente Lula para 2010?
Paulo Bernardo – A popularidade está associada aos bons resultados. Se houver um quadro econômico ruim em 2010, tende a corroer a popularidade. Não vai ter esse problema. Vamos sair de 2009 já com um cenário de superação.
Bancos têm de ver setor produtivo como parceiro, adverte Paulo Bernardo
Foto:
Fabio Rodrigues Pozzebom, Agência Brasil
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