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 | 13/09/2008 03h27min

Brasileiros respiram medo na Bolívia

200 pessoas procuraram a representação diplomática brasileira nesta sexta-feira

Humberto trezzi  |  humberto.trezzi@zerohora.com.br

Em menos de dois minutos — entre as 10h50min e as 10h52min de ontem —, a estudante de Medicina Eliana Marques, brasileira que reside na cidade boliviana de Santa Cruz de La Sierra, recebeu seis mensagens no celular. Eram o pai, as irmãs e o ex-marido, todos residentes em Pernambuco, todos insistindo para que ela pegue o primeiro vôo de volta ao Brasil.

— Meu pai fala até em fretar um avião, se for necessário — relatou ela, entre temerosa e emocionada pela preocupação dos parentes.

Eliana estava na ante-sala do consulado brasileiro em Santa Cruz de La Sierra, maior centro de revoltas populares contra o governo do boliviano Evo Morales. A estudante de 30 anos, que vive com três filhas na Bolívia, é uma entre 200 pessoas que procuraram ontem a representação diplomática brasileira naquela cidade. Em dias normais, menos de 20 pessoas buscam auxílio.

Os 12 funcionários do consulado estão quase loucos, pois também têm de atender a mais de 200 telefonemas por dia. A dúvida dos brasileiros é sempre a mesma: se há risco de permanecer na Bolívia. O vice-cônsul Cláudio Bezerra, um paraibano recém-chegado a Santa Cruz de La Sierra, garante a todos que a convulsão social que sacode aquele país não tem como alvo os brasileiros.

Apesar da garantia, pelo menos três brasileiros ficaram feridos — dois homens e uma criança — no departamento de Pando, norte do país, onde ontem foi decretado Estado de sítio. Conforme o jornalista Alexandre Lima, do site O Alto Acre, os três foram baleados por desconhecidos quando se dirigiam para a cidade de Cobija, de caminhão. Hospitalizados, eles não correm risco de vida.

Na tarde de ontem, a fronteira com o Brasil foi fechada por manifestantes nas localidades de Puerto Quijarro e Puerto Concepción, situadas junto ao Rio Paraguai e à cidade sul-mato-grossense de Corumbá.

Comitês cívicos que reivindicam a autonomia do departamento de Santa Cruz em relação ao governo boliviano bloquearam a aduana e montaram barricadas na estrada, impedindo o tráfego de veículos sobre as pontes entre os dois países. Pretendem permanecer assim até terça-feira, pelo menos.

É uma maneira de impedir a circulação de mercadorias, a arrecadação de impostos e de tentar asfixiar o governo Morales em La Paz, muito dependente de recursos das províncias fronteiriças.

Só em Santa Cruz de La Sierra, vivem ao menos 12 mil brasileiros

Em meio a tudo isso, 450 mil brasileiros vivem uma tremenda incerteza. Parte deles — muitos gaúchos — cria gado e planta soja na faixa de fronteira. Grupos que apóiam Morales pressionam para que a reforma agrária atinja as terras desses estrangeiros — alguns até já foram expulsos.

Outros estão impedidos de ir e vir, como é o caso da fronteira com Mato Grosso do Sul, a não ser por via aérea. E nem isso está garantido. A companhia brasileira Gol suspendeu os vôos para Santa Cruz de La Sierra na quinta-feira, face à confusão reinante no aeroporto daquela cidade, o Viro-Viro. Retomou ontem.

A empresa americana American Airlines também suspendeu os vôos para a cidade, sem prazo para retomar o serviço. É que linhas telefônicas, celulares e internet não funcionam ali, desde que oposicionistas sabotaram instalações de telecomunicações próximas. Passageiros são forçados a caminhar, se quiserem pegar táxi.

Veículos particulares são bloqueados em uma barreira montada por militantes oposicionistas a 3 quilômetros do aeroporto. A saída é deixar o carro e ir a pé até a proximidade dos aviões.

Tudo isso fez a pernambucana Eliana Marques e seus amigos Emanuel Rua e Vanessa Barros Pessoa, todos estudantes de Medicina, pensarem seriamente em abandonar a cidade. Deixando para trás até o aluguel do apartamento que partilham.

Os três colocaram nomes, endereços e números de telefone em uma lista que o consulado elabora, para garantir segurança, caso brasileiros sejam atacados na Bolívia. O vice-cônsul diz que o Itamaraty tem planos para evacuação de compatriotas, caso seja necessário.

Só em Santa Cruz de La Sierra são pelo menos 12 mil brasileiros residentes, fora ilegais. A maioria cursa uma das várias universidades da cidade de 1,5 milhão de habitantes.

A explicação não poderia ser mais simples: a mensalidade das faculdades de ciências médicas é de US$ 110 (R$ 200), enquanto uma similar, no Brasil, custa quase 20 vezes mais — e é possível fugir do vestibular

EFE  / 

Número de vítimas nos confrontos teria subido de oito para 14 no departamento boliviano de Pando
Foto:  EFE


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