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 | 24/08/2008 05h09min

Vinho Gaúcho: queda de vendas resulta na maior sobra de estoque da história

Thiago Copetti  |  thiago.copetti@zerohora.com.br

Com ameça de sobra de cem milhões de litros de vinho nos tanques no final do ano o maior excesso de produção da história as vinícolas precisam de uma estratégia potente para reformar a adega.

Desde 2007, o governo ajuda subsidiando a venda de estoques excedentes e intensificou o apoio neste ano. A atividade tem pelo menos cinco caminhos para criar musculatura com esforços próprios e não virar vinagre. Há exemplos dentro e fora do segmento que apontam opções de saída para a crise.

São estratégias de negócio como a já adotada pelos fabricantes nacionais de espumantes, pelos novos exportadores de vinhos finos e até mesmo aplicadas por um segmento exótico para a atividade: da indústria nacional de cosméticos.

Os motivos de tanta sobra nos estoques em 2008 estão dentro e fora do país. O inimigo externo encontra corpo nos produtos importados. Com o câmbio favorável à importação, as indústrias amargam perdas. A cada 10 garrafas de vinho entornadas pelos brasileiros, atualmente menos de duas são produzidas dentro do país.

Dos concorrentes nacionais, principalmente da Região Sudeste, produtores gaúchos reclamam que vem uma inundação de coquetéis e falsas sangrias, que parecem vinho, mas não são. O que é engarrafado, diz Cristiane Passarin, presidente do Sindicato das Indústrias do Vinho do Estado (Sindivinho), é álcool, corante e aromatizante.

– Na maioria dos casos, não há uma gota (de vinho). Eles usam corante bordeaux para imitar a cor do vinho, e aromatizantes para dar sabor. Chegam ao mercado por R$ 1,60 a garrafa – critica a presidente do Sindivinho.

Engarrafar como vinho o que não é vinho, lamenta Cristiane, era uma prática apenas de empresas de fora do Estado. Não é mais:

– Infelizmente, por necessidade, já há pequenas empresas aqui da serra gaúcha fazendo o mesmo.

Com cenário turvo, os estoques acumulam 430 milhões de litros à espera de engarrafamento. Mesmo com as vendas até o final do ano, devem sobrar cerca de 300 milhões de litros, calcula Carlos Paviani, presidente do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin).

– Normalmente, deveríamos chegar ao final do ano com 200 milhões de litros, no máximo. Esse excedente de 100 milhões de litros de vinho é o maior volume da história – assegura Paviani.

Em 2009, se não tiverem onde armazenar o produto, as empresas não poderão receber boa parte da uva que será colhida na serra gaúcha. O problema tem mobilizado o segmento em torno uma causa comum: conseguir ajuda do governo para sair da crise.

– O setor, em geral, é frágil, feito de pequenas empresas. Não é uma grande companhia de cerveja ou multinacional de uísque. Há muita vinícola feita por pequenas famílias. Precisamos de proteção, ou muitas empresas deixarão de existir, como já fecharam as portas todas as pequenas cervejarias. No vinho, porém, isso vai ocorrer em uma proporção muito maior – compara o presidente do Ibravin.



PARA ABRIR MAIS GARRAFAS

1 - ESTRATÉGIA BORBULHANTE

O trabalho feito na popularização do espumante no país pode servir como modelo para ampliar o consumo do vinho. Em 2002, quando essa idéia começou a tomar forma, a venda era irrisória. Primeiro foi necessário atuar na qualidade e na quantidade da produção. Os preços caíram, e o produto melhorou. Hoje é possível encontrar um bom produto por R$ 20. Na seqüência, a bebida foi tema de campanhas na mídia, degustações no comércio e no varejo, e se intensificaram as parcerias. As borbulhas ganharam presença nos cardápios de bares e restaurantes e champanharias foram abertas. Resultado: as vendas saltaram de 4 milhões de litros, em 2007, para 8,5 milhões de litros nos primeiros seis meses de 2008.

2 - MAIS E MELHORES EMBARQUES

Tradicionalmente, no que se refere a vinhos, o Brasil exportava pouco e mal. Em 2003, com o programa Wines from Brasil, em conjunto com a Apex, foram feitos mais esforços para colocar vinhos finos brasileiros em taças estrangeiras. Neste ano, as indústrias já mandaram para fora do país – incluindo destinos nobres como Suíça, Holanda e Alemanha – 2,5 milhões de litros. É o dobro do total enviado em todo o ano passado e 150% mais do que em 2006, na metade do tempo. As exportações brasileiras de vinho quintuplicaram nos últimos cinco anos. Foram US$ 4 milhões em 2007. Como são apenas cerca de 20 países compradores, as vinícolas ainda têm muitos idiomas e paladares estrangeiros para conquistar. Como só cerca de 2% de todo produto nacional é embarcado para fora, ainda há muita taça para encher no Exterior.

3 - INFLAR O CONSUMO INTERNO

O consumo de vinho no Brasil ainda é pequeno: 1,9 litro per capita. Nos vizinhos latino-americanos, como Argentina, Uruguai e Chile, varia entre 20 e 30 litros. Na França, pode chegar a 50 litros. Na média, os brasileiros consomem pouco vinho, e os jovens, menos ainda. Não é fácil competir com bebidas mais baratas, como a cerveja, ou embaladas por grandes e sofisticadas campanhas – como as promovidas por multinacionais de uísque – mas entrar na briga é fundamental. O trabalho precisaria se intensificar logo: mudar hábitos e costumes pode levar uma geração inteira. Ou mais.

4 - O EXEMPLO DOS COSMÉTICOS

No fechado mercado brasileiro dos anos 90, o vinho importado era um produto caro e sofisticado. O mesmo ocorria com o setor de cosméticos e produtos de beleza. Para quebrar barreiras, a indústria da estética deu uma virada na qualidade do produto nacional, criou uma identidade brasileira e valorizada – como o trabalho feito pelas marcas Natura e Boticário – e também investiu em pontos-de-venda próprios, na distribuição e logística e em franquias.

5 - IDENTIDADE E MARCA FORTES

Uma identidade e uma marca forte para o vinho brasileiro e para o gaúcho, assim como campanhas que valorizem a bebida, são apontadas como carências por especialistas. Exemplos de sucesso em marketing vinícola estão centrados em algumas poucas indústrias da Serra, que transformaram seus nomes em referência de qualidade. Mas capacidade para vender e divulgar um grande número de empresas já se pode dizer que tem, e de sobra. Em seis anos, entre 1995 e 2000, foram acumuladas 95 medalhas de ouro em concursos internacionais. Nos últimos seis anos, passam de 300. Essas medalhas foram obtidas graças a investimentos em tecnologia de produção, na valorização de determinados tipos de uva e de outros avanços obtidos na qualidade da bebida.

Fontes: Flávio Martins (coordenador do curso de pós-graduação em marketing do vinho), Carlos Paviani (diretor-presidente do Ibravin) e Cristiane Passarin (Sindivinho)

 
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