Os fatos: enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometia benefícios econômicos ao Paraguai, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, adiantou-se e, já no último sábado, os deu, na forma de petróleo. O novo presidente do Paraguai, Fernando Lugo, no mesmo sábado, entrou para a rede continental de TV Telesur, capitaneada pela Venezuela. Também ficou definido que a primeira viagem internacional de Lugo será ao Brasil, para visitar Lula e oficializar seus pleitos. A interpretação: Lugo chegará a Brasília respaldado por Chávez e já integrando o grupo político dos chamados nacionalistas extremados, integrado por Venezuela, Bolívia e Equador. O tema será, obrigatoriamente, Itaipu.

As negociações entre brasileiros e paraguaios para definir a data da primeira viagem de Lugo depois da posse foram confirmadas ontem a Zero Hora pelo assessor da presidência paraguaia, Miguel Rojas. O tema da visita será Itaipu. Apesar de não constar nos planos paraguaios para os primeiros cem dias de governo, um rendimento maior oriundo de Itaipu é o meio de alcançá-los.

Na posse de Lugo, sexta-feira, Lula abriu a fila de cumprimentos e foi o presidente que por mais tempo conversou com o novo presidente. No final, deu-lhe um longo abraço. Fez questão, porém, de ficar apenas 24 horas em Assunção. O objetivo: ouvir pouco e falar menos ainda. Ficou tudo para Brasília.

Temas não faltam para o encontro: além de Itaipu, a questão dos brasiguaios (brasileiros, em sua maioria gaúchos, radicados no Paraguai e temerosos de perder suas terras para sem-terra paraguaios que ameaçam invadi-las) e a fronteira porosa — a Tríplice Fronteira —, por onde é investigado o trânsito de armas e drogas, como possível forma de financiar o extremismo islâmico.

Para o Paraguai, porém, o que interessa é Itaipu. Na usina bilateral, cujo contrato foi assinado em 1973 com validade até 2023, está a esperança do novo governo para ter recursos capazes de alimentar programas sociais internos. Memorando de seis pontos ao qual ZH teve acesso oficializa esse pleitos.

Para compensar a pretensão paraguaia de aumentar os valores que o Brasil paga pela energia excedente de Itaipu e abrir o comércio a outros mercados, o Brasil acena com uma série de financiamentos. Contemplam uma linha de transmissão entre Itaipu e Assunção, uma nova ponte sobre o Rio Paraná e a participação paraguaia no acordo automotivo existente entre Brasil e Argentina. A idéia é que, industrializando-se, o Paraguai pode consumir a própria energia que não usa atualmente e vende exclusivamente ao Brasil.

Assim como tem feito com a Argentina (já comprou mais de US$ 8 bilhões em bônus para dar liquidez ao país de Cristina Kirchner) e a Bolívia (que já enfrentou o Brasil recentemente em razão de pleitos ligados à energia), Chávez usa o petróleo para fazer de Lugo um aliado. É uma forma de reforçar sua liderança continental em detrimento do Brasil. Também é uma maneira de facilitar sua entrada no Mercosul — depende da aprovação dos Congressos brasileiro e paraguaio.

Pelo acordo de 12 pontos assinado no último sábado — primeiro dia depois da posse de Lugo —, o Paraguai receberá da PDVSA (a Petrobras venezuelana) 23,5 mil barris diários de petróleo, o que transformará o país vizinho, segundo Chávez, em "um pólo de desenvolvimento". Texto da PDVSA diz que é uma forma de "garantir reservas estratégicas de combustível".

— O Paraguai terá até a última gota de petróleo de que necessite neste século para o desenvolvimento do seu povo, da indústria e da agricultura — discursou Chávez.

De quebra, Lugo selou sua aproximação de Chávez com a assinatura do protocolo que prevê a participação paraguaia na Telesur, emissora de alcance continental que tem como signatários, também, Argentina, Bolívia, Cuba e Equador.