| 19/11/2008 05h04min
No centro da violência entre as facções da Geral do Grêmio está a questão financeira. Como o clube subvenciona parte dos custos dos ônibus e fornece ingressos – depois revendidos pelos líderes da torcida –, o lucro resultante desse comércio virou disputa de poder.
De acordo com o ex-diretor financeiro do Grêmio, Airton Ruschel, a presença da torcida adversária nos estádios brasileiros se dá mediante permuta entre os clubes. Exemplo hipotético: se o Grêmio concede mil lugares ao Flamengo no Olímpico, terá os mesmos mil no Maracanã. E de graça, para o clube distribuir como julgar conveniente. No caso do Grêmio, uma parte dos ingressos vai para os consulados do Interior, que repassam listas com os interessados em comprá-los. Outro naco fica para os gremistas residentes na própria cidade do jogo. E um pedaço vai para a Geral. Também de graça.
– Agora, se um líder da Geral vender estes ingressos, bom, aí não temos como virar porteiro de ônibus. Nos jogos em São Paulo, por
exemplo, eram dois
ônibus e cerca de 50 ingressos, no máximo. Nunca foi algo substancial. Não tem nada desses números astronômicos de mil ingressos que ouvi por aí – explica Ruschel.
Com as ocorrências policiais nas excursões da torcida para outros Estados e países, o ex-diretor foi designado pelo presidente Paulo Odone para monitorar a relação com as organizadas.
Mas o problema das revendas de ingressos é incontrolável, reconhece Ruschel: o lucro pela venda de 50 ingressos já é suficiente para produzir desavenças e disputa de poder. A R$ 40 (preço de uma cadeira lateral), já é possível arrecadar R$ 2 mil por jogo. Duas partidas fora do Olímpico, dariam R$ 4 mil por mês. Mas os preços podem ser bem maiores, aumentando a margem de lucro. E o tamanho do motivo da briga.
– Pode parecer pouco dinheiro para nós, mas para as pessoas envolvidas nisso é um valor astronômico, eu reconheço – diz Ruschel.
A torcida Geral lucraria cerca de R$ 70 mil por mês.
Ganha dinheiro com excursões e vendas de
ingressos e de produtos da própria torcida. Com cerca de 6 mil pessoas, a maioria sócios do Grêmio, ocupando o espaço da goleira do lado da Avenida Cascatinha, a Geral não cobra mensalidade. Mas conta com apoio do clube: tem sala no Olímpico e nada paga por isso. Em viagens, festas ou no próprio Olímpico, é comum a torcida vender produtos como canecos, mantas, gorros e adesivos.
Odone: “Põe a PM2 e prende os caras”
O presidente Paulo Odone admite que não há como ter 100% de controle sobre a Geral do Grêmio. Mais: pede à Brigada Militar (BM) que infiltre agentes da PM2, o serviço de inteligência da corporação, para expurgar os responsáveis pelos tiros contra a cabeça de Lucas Pereira Balardin, 19 anos, e o abdômen de Marçal Soares do Santos, 30.
O presidente admitiu que a Geral tem uma sala no Olímpico, onde guarda faixas e bandeiras. A BM tem acesso facilitado para fiscalizá-la. De acordo com Odone, os clubes não têm
estrutura e aparato técnico para agir contra os
delinqüentes:
– Eles se subdividem, se recompõem, é difícil. O Mendes (coronel Paulo Roberto Mendes, comandante geral da BM) compra parada com o MST e não pode comprar também com esses loucos? Põe a PM2 e prende estes caras.
Mendes: “Tem que ter mão forte dos clubes”
O comandante-geral da Brigada Militar, Paulo Roberto Mendes, prometeu ordenar “aperto forte” ao Comando do Policiamento da Capital para investigar a onda de violência gerada pelo racha na Geral do Grêmio.
Mendes admitiu, inclusive, aceitar a sugestão do presidente Paulo Odone e infiltrar agentes do serviço de inteligência da coorporação em meio à torcida para desbaratar os seus laços criminosos. Mas, ao mesmo tempo, aproveitou para sugerir uma ação punitiva de mesma intensidade por parte dos clubes.
– Se é preciso mão forte da Brigada Militar, vale o mesmo para os clubes, que têm todos eles (os integrantes das
torcidas organizadas) cadastrados e identificados. Se estes criminosos forem
expulsos do convívio dos estádios, futuras ações serão inibidas. É preciso uma esforço de todos, e não de uma entidade apenas – disse Mendes.
Para entender o racha da Geral
> Descontentes com os rumos da Geral, cerca de 300 torcedores deixaram a torcida. Segundo eles, a torcida era mais para a organizada do que para o clube
> O suposto pagamento de salário para seis dos líderes da Geral (que devem dedicar-se 24 horas aos interesses da torcida) também desgostou torcedores
> Os dissidentes mudaram-se para o lado oposto ao da Geral no Olímpico (foram para o portão 18), juntando-se aos integrantes da Máfia Tricolor – uma das tantas torcidas organizadas do Grêmio que minguou devido ao surgimento da Geral
> Ameaçados, muitos dissidentes retornaram à Geral. Quem permaneceu no que foi chamado de Geral Independente, passou a sofrer ameaças dos
antigos aliados
> O racha da Geral atingiu o ápice na eleição presidencial
do Grêmio. A Geral apoiou Paulo Odone e seu candidato, Antônio Vicente Martins. Os dissidentes votaram em Duda Kroeff (que acabou eleito)
> Após a derrota da eleição, as ameaças contra dissidentes aumentaram. Alguns torcedores chegaram a procurar a Polícia, mas não houve queixa-crime porque a ameaça era generalizada, não específica
> Durante o jogo contra o Coritiba, no domingo, o pessoal da Máfia exibiu a bandeira com o rosto do ex-craque Everaldo, o que teria desgostado membros da facção Geral Ataque Surpresa (GAS)
> Após o jogo de domingo, houve briga entre integrantes da Geral. Envolveram-se também integrantes da Torcida Jovem, da Máfia Tricolor e até mesmo de torcedores de uma organizada do Coritiba
> Nas imediações do Estádio Olímpico, um homem sacou um revólver e atirou para cima. Outro tomou-lhe a arma e atirou na cabeça de Lucas Balardin, 19 anos, e no abdômen de Marçal Santos, 30, ambos dissidentes
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