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 | 16/08/2006 09h07min

Paixão colorada sem distância

Vale tudo para estar ao lado do time do coração nesta quarta

Vale tudo para estar ao lado do Inter hoje à noite. Veja o caso de Marcos Maldini, por exemplo. Convenceu quatro colegas de trabalho a assumir seus horários para poder dar um pulinho no Beira-Rio. Não seria nada demais se não morasse nos Estados Unidos, onde trabalha como crupiê em um luxuoso cassino no estado de Connecticut. Viajou cerca de 8,2 mil quilômetros em mais de 24 horas até Porto Alegre. Maldini é um exemplo de que não há distância que afaste o torcedor de sua paixão.

Claro, eles não conseguem acompanhar todos os jogos de perto, mas hoje é diferente. O Inter está diante de um dia especial. Talvez, o mais importante de sua história. Por isso, vale o esforço para empurrar a equipe para o título inédito da Copa Libertadores. 

– Recebi ligações até de um torcedor que vem da Espanha – comemora o gerente do departamento consular do Inter, Adão Célio Pereira.

Para quem se acostumou a acompanhar o time pela Internet, o jogo de hoje tem tudo para ser inesquecível.

Fanáticos via Internet

A tecnologia é a principal aliada dos torcedores que estão longe e não conseguiram dar um jeitinho de ir a Porto Alegre para participar da grande final.

Na última quarta-feira, a estudante Kelly Dorneles Stefenon, de 21 anos, apelou para a Internet. Em Londres desde o início do ano, a colorada contou com a ajuda dos pais, em Bento Gonçalves, na serra gaúcha, para não perder a primeira partida da decisão, realizada no Morumbi. 

– Ouvimos o jogo pela rádio, na Internet, e minha mãe deu uma ajudinha para a galera se sentir mais em casa. Ela colocou a webcam em frente à TV para também assistirmos ao jogo – contou a jovem, que tem entre os colegas de apartamento, um amigo são-paulino.

Hoje, a dupla vai se reunir novamente para repetir o ritual. Se o Inter conquistar o inédito título, Kelly não poderá fazer festa na rua, "como faria no Rio Grande do Sul", devido ao fuso horário. Na Inglaterra, a partida deve começar por volta das 2h da madrugada.

Invasão curitibana

É tradicional a vinda de torcedores do oeste paranaense a jogos importantes em Porto Alegre. Mas, dessa vez, quem promete invadir o Beira-Rio são os colorados de Curitiba. A capital do Paraná conta hoje com cerca de 150 sócios em dia. A distância impede que eles assistam a todos os jogos, mas é a forma mais segura de garantir um lugar nas decisões. Mais de 70 já estão com passagens compradas para Porto Alegre. Os primeiros chegaram ontem à noite. Outros virão durante o dia. O último vôo sai às 17h de hoje. 

– Não tinha mais passagem para Porto Alegre. Todos os vôos estavam lotados – diz o contador Kurt Winter, 64 anos, diretor regional do Inter.

Winter desembarcou em Porto Alegre ontem à noite. Sua idéia é tentar ajudar os colorados que moram no Paraná. Afinal, ainda há gente sem ingresso.

Os torcedores que moram no Paraná estão entre os mais organizados e atuantes. Eles formaram a Associação Saci Colorado. Reúnem-se em jantares e eventos para ajudar o clube, especialmente as categorias de base. Além disso, contribuem para a construção do CTG do clube.

– Acho que temos, ao menos, um pedacinho deste título – suspira Winter.

Façam suas apostas

As chances de o Inter sair campeão hoje à noite são bem maiores do que enriquecer jogando pôquer ou roleta. Foi essa comparação que levou o crupiê Marcos Maldini, 25 anos, a "fugir" do trabalho por uns dias e vir a Porto Alegre para assistir à final. O torcedor do Inter chegou ontem à Capital. Foram mais de 24 horas de viagem para cruzar 8,2 mil quilômetros. Saiu da cidade de Norwich, onde mora, no estado de Connecticut, e foi de carro a Nova York. De lá, viajou a São Paulo e, depois, a Porto Alegre.

A decisão de antecipar férias do Mohegan Sun, um dos maiores cassinos do planeta – palco de shows do porte de Aerosmith e Bon Jovi, por exemplo –, foi tomada após o primero jogo da decisão. Estava no trabalho e era avisado pelo celular da movimentação do placar por uma colega. Só que, enquanto distribuía cartas, não podia atender o telefone. Apenas no seu intervalo soube da vitória. Desta vez, para não passar a mesma angústia, arrumou as malas e veio. Uma prima se encarregou de garantir o seu ingresso.

–  As pessoas lá não entenderam direito. Não é apenas um jogo de futebol, é a final da Libertadores! – diz o crupiê.

Agenda apertada

Há 20 anos nos Estados Unidos, o empresário Mario Mesquita, 42 anos, antecipou sua visita anual aos parentes no Rio Grande do Sul. Acostumado a passar o Natal com a família, em Três Cachoeiras, chegaria no início da madrugada de hoje por um motivo mais do que especial: a final da Libertadores. Difícil vai ser conciliar todos os compromissos.

– É a primeira vez que ele faz isso. Mas sair de lá para ver jogo do Gauchão não dá – diz Adroaldo, irmão de Mario.

Lá, no caso, é Boca Ratón, na Flórida, onde mora Mario. A cidade fica ao norte de Miami, a mais conhecida da região. Depois de viajar um dia inteiro, Mario estava disposto até a recorrer a cambistas para garantir um ingresso. Afinal, não faria sentido sair dos Estados Unidos e ver pela TV o jogo mais importante da história do Inter.

Mario pensava em aproveitar os dias perto da família e estender o passeio até o fim de semana. Só conseguiu passagem para sexta-feira, bem cedo. Hoje, a decisão é prioridade. Amanhã, ele vai a Três Cachoeiras, ao lado de Torres, visitar a mãe e volta no mesmo dia.

Uma maratona e tanto. Mas que ficará muito mais amena com o título inédito de campeão da América.

Nem a namorada escapou

Armando Galvão, 42 anos, lembra do primeiro título nacional do Inter, conquistado em 1975. Também guarda na memória a conquista da Copa do Brasil, em 1992, bem como os "Gre-Nais do 5 a 2 e do 3 a 1" . Está tão acostumado a acompanhar o time do coração que não teve dúvidas em largar tudo na Bahia, onde mora há 12 anos, e se mandar à capital gaúcha. A profissão – ele é médico intensivista – exigiu um pouco mais de esforço, desta vez: Galvão teve de convencer os colegas a trocarem os horários de plantões.

– Ainda faltava o plantão no hospital em que minha namorada trabalha. Não tive dúvidas. Deixei a Andréia no meu lugar – explicou o colorado de Caxias do Sul.

Galvão saiu de Salvador na noite de segunda-feira, às 23h30min. Fez escala em São Paulo, de madrugada, e aterrissou em Porto Alegre por volta das 6h de ontem. No mesmo vôo, viajou o advogado Luciano Pontes, natural de Rio Grande. Antes da viagem, o torcedor ainda levou oito camisas para receber bênção na Igreja do Senhor do Bom Fim. Mesmo assim, não conseguiu convencer os amigos de que o santo está do lado dos gaúchos. 

– Tu tá louco?! O Vitória e o Bahia estão na terceira divisão! Não me aparece com estas camisas no Beira-Rio – ordenou um dos colegas.

Ontem à tarde, Pontes contabilizava 36 horas sem dormir. E promete que só irá descansar no sábado, dia de seu retorno ao litoral baiano. Quando chegar, ainda terá de resolver problemas de trabalho: para poder viajar, o advogado de 32 anos adiou quatro audiências de instrução no Tribunal de Justiça da Bahia. Não se arrepende.

– A OAB pode até cassar minha carteira, mas pelo Inter vale tudo né?!

Abrindo Mão do Dia dos Pais

A pequena Laura, de apenas 10 meses de idade, passou o Dia dos Pais acompanhada somente da mãe. É que o pai, o gaúcho Pepino, 34 anos (ele não gosta de revelar o nome), deixou a capital de Alagoas ainda no sábado para poder saborear com gosto a semana colorada em Porto Alegre. 

–  Abri mão do primeiro Dia dos Pais da minha vida para levar a faixa de campeão para ela – argumenta o torcedor.

Instalado na casa de um amigo gremista, o empresário, natural de Cruz Alta e há cerca de nove anos radicado em Maceió, acredita que o título virá somente nos pênaltis. Os amigos Fernando Mella, 40, Flávio Garcia, 33, e o cunhado Rafael Botti, 19 (segundo, terceiro e quarto, da E para D, respectivamente), são mais otimistas: arriscam o placar de 3 a 1 para os gaúchos.

Foram nove horas de viagem até chegar ao Estado. "Quase nada" para quem está prestes a conquistar a América pela primeira vez. Pepino estava tão eufórico no avião que chegou a ser repreendido pelo comandante por não desligar o aparelho celular durante o vôo. Com exceção dele, o grupo está hospedado na residência de um colorado, a cerca de 100m do Beira-Rio. Mella, que nasceu em Nova Bréscia, ainda assistiu ao primeiro jogo em São Paulo, na quarta-feira passada, antes de seguir para o Sul. 

– O que são R$ 100 para quem já gastou mais R$ 1,5 mil na viagem? – conta, feliz da vida.

A turma, que costumar ver os jogos do Inter em um bar de Maceió, pretende festejar a vitória na Avenida Goethe. Só voltarão para casa no próximo sábado.

GABRIEL CAMARGO E TAMARA HAUCK/ ZERO HORA
 

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