| 05/10/2005 13h55min
O secretário de Justiça e Segurança, José Otávio Germano, já pediu desculpas pelas atitudes violentas de seus soldados no último domingo, no Beira-Rio. Também prometeu que isso não irá se repetir. No entanto, segundo o ouvidor da Secretaria, Jaime Eduardo Machado, isso não é o suficiente.
– A relação entre os cidadão e o serviço público de segurança deve ser uma relação de confiança que deve ter um equilíbrio, que foi quebrado. Cabe à Brigada Militar assumir uma postura não apenas de desculpa, mas também de responsabilidade. A Constituição Federal estabelece a responsabilidade civil do Estado por quaisquer danos causados por seus agentes aos cidadãos. É o caso. Essas pessoas, caso comprovem uma relação de causalidade entre os danos sofridos sejam eles físicos, materiais ou morais, e a ação dos agentes, podem se o quiserem recorrer ao Judiciário – declarou o ouvidor em entrevista online concedida a clicRBS nesta quarta.
Um dos maiores críticos da postura da Brigada no caso, Jaime Eduardo – que cresceu indo a estádios de futebol – condenou o uso de bombas de gás lacrimogênio e balas de borracha para reprimir os torcedores, afirmando que isso demonstrou a falta de preparo daquele grupo e uma orientação errada do comando.
A respeito das identificações e punições dos agentes, Jaime Eduardo afirmou que a Ouvidoria pode, apenas, acompanhar as investigações e solicitar providências, já que as penas serão aplicadas pelos órgãos de correição internos da corporação policial. Segundo ele, este trabalho poderia ser facilitado se os soldados portassem o nome no uniforme, já que muitos vêm descolando sua identificação.
Jaime criticou ainda os procedimentos de segurança adotados em um jogo de futebol. Segundo o ouvidor, os soldados não devem portar bombas de gás lacrimogênio, a fiscalização deve atingir a todos os torcedores que irão entrar no estádio, mesmo os policiais, e os clubes deveriam reavaliar as concessões às torcidas organizadas, que seguidamente tem sido foco de desordem e práticas ilícitas. Integrantes da torcida organizada do Inter Camisa 12, inclusive, são apontados como pivôs da confusão no último domingo.
O ouvidor, no entanto, afirmou que este triste episódio e suas repercussões serviram para alertar as autoridades para que haja um redirecionamento da orientação policial quanto ao trabalho nos estádios. Além disso, a discussão sobre a carga excessiva e as condições de trabalho dos brigadianos também pode entrar na pauta de discussões.
Confira a íntegra da entrevista online:
Pergunta: Após a análise inicial das imagens, o que a SJS já constatou sobre o tumulto no Beira-Rio?
Jaime Machado: Já se encaminharam a Secretaria várias pessoas que foram agredidas e que solicitam orientação de como proceder. Com relação à ação da Brigada, verificou-se um excesso por parte dos agentes da brigada dos meios de repressão ao tumulto e que demandam sindicâncias internas da corregedoria da
Brigada Militar.
Pergunta: Como
proceder com relação a um possível ressarcimento?
Jaime Machado: A Constituição Federal estabelece a responsabilidade civil do estado por quaisquer danos causados por seus agentes aos cidadãos. É o caso. Essas pessoas, caso comprovem uma relação de causalidade entre os danos sofridos sejam eles físicos, materiais ou morais, e a ação dos agentes, podem se o quiserem recorrer ao Judiciário.
Pergunta Internauta: Qual a sua opinião sobres os fatos?
Jaime Machado: Os fatos em si foram indicadores de que aquele grupo não estava adequadamente orientado para reprimir a ação daquela torcida organizada. A utilização de bombas de efeito moral e o uso de balas de borracha a meu juízo são inadequados em ambientes em que as pessoas estejam confinadas, ou seja, sem possibilidade de se afastarem como em uma via pública, por exemplo. A única forma de pessoas atingidas fugirem foi a própria arquibancada, onde havia terceiros que não tinham
envolvimento com o conflito e que acabaram
atingidos.
Pergunta: E por que a BM portava bombas de efeito moral e armas com bala de pressão dentro de um estádio?
Jaime Machado: Isso é uma orientação inadequada do Comando que deve ser reformulada pela cúpula da Segurança.
Pergunta Internauta: Penso que a Brigada deveria ficar do lado de fora dos estádios, e dentro os clubes contratarem seguranças como é na Europa.
Jaime Machado: Este sistema já foi utilizado pelo grêmio na administração do presidente José Alberto Guerreiro. Esta é uma idéia interessante, porque os seguranças internos teriam mais condições de garantir a ordem sem extremos.
Pergunta: E estes soldados já foram identificados? E quais as punições que deverão sofrer?
Jaime Machado: A identificação dos soldados é um trabalho que a Ouvidoria pode no máximo acompanhar e solicitar providências. Os inquéritos serão
conduzidos pelos órgãos de correição internos da corporação policial. Todos indistintamente, desde
a mídia até as ONGs devem juntamente com a Ouvidoria e o Ministério Público acompanhar e pedir providências para a punição dos responsáveis.
Pergunta Internauta: Queremos cadeia para aqueles que causaram lesão corporal, abuso e intimidação. Afastamento não é suficiente, queremos uma punição na Justiça comum.
Jaime Machado: Acredito que esta idéia esta rigorosamente dentro das previsões legais. Os casos serão acompanhados pelo Ministério Público que requisitará, conforme o caso, inquérito policial para a punição criminal dos responsáveis, independentemente das medidas administrativas internas que o comando da brigada venha a tomar.
Pergunta Internauta: Sou de Santa Maria e fui ao Beira-Rio de excursão. No meu grupo havia um policial civil que, por pertencer a corporação, pôde entrar com uma arma no estádio. Como isso é possível?
Jaime Machado: Guilherme, isso é uma falha grave da
fiscalização.
Pergunta Internauta: Na entrada do estádio, ele simplesmente apresentou a carteira de policial civil ao brigadiano que fazia a revista e não precisou ser fiscalizado.
Pergunta Internauta: E nomes, podem ser anunciados os nomes destes policiais, pois até o momento não houve identificação de nenhum?
Jaime Machado: A divulgação dos nomes cabe exclusivamente ao comando da Brigada Militar.
Pergunta Internauta: Por que muitos dos policiais que estavam no Beira-Rio não tinham identificação no uniforme?
Jaime Machado: A identificação nos uniformes é um problema que tem sido enfrentado pelo próprio comando da Brigada porque nesses casos, longe dos superiores, os agentes ocultam suas identificações, devendo ser encontrada uma solução para essa ocorrência. Uma idéia é de que a identificação não seja afixada, mas bordada no próprio fardamento.
Pergunta Internauta: Ai está senhor Jaime... Agentes ocultam suas identificações, isso é um absurdo!!! Tudo bem sabermos que o que ocorreu domingo não irá se repetir, estou sempre lá e vou hoje outra vez. Mas agora, confiar na Brigada Militar, é complicado depois do que passei no domingo, desde a entrada no estádio com maus tratos e uma saída caótica. É difícil!
Pergunta: Qual a sua posição sobre as torcidas organizadas? Elas são consideradas fator de disseminação de violência nos estádios?
Jaime Machado: Gostaria de chamar a atenção para os clubes reavaliem a concessão de subsídios as torcidas organizadas, que tem sido um foco permanente de desordem e práticas ilícitas nos estádios e nos deslocamentos de ônibus para os locais onde se realizam jogos.
Pergunta Internauta: Que medidas práticas foram tomadas para que não se repitam episódios de domingo? No jogo de hoje, por exemplo?
Jaime Machado: Pela manifestação e pelas providências tomadas a partir do próprio Governo do Estado eu não tenho dúvidas de
que as lamentáveis ocorrências serviram para redirecionar a
orientação policial quanto ao trabalho nos estádios. Penso que todos devem ter confiança porque episódios como este não se repetirão.
Pergunta Internauta: A punição acho que não será grave 'pois estamos no Brasil', mas espero que alguma atitude seja tomada com justiça.Vale lembrar que os maus tratos não foram somente na hora da confusão, já na entrada eles tiraram das crianças bandeirinhas que o clube distribuiu para o espetáculo.
Pergunta: O excesso de trabalho dos brigadianos pode servir como justificativa para a ação de domingo no Beira-Rio?
Jaime Machado: O comando da Brigada já se manifestou sobre o regime do horário de trabalho e concessão de folgas aos agentes policiais.
Pergunta: O comando afirma que as folgas estão dentro do que exige a Constituição, mas o presidente da Associação de Cabos e Soldados apresentou a carga horária excessiva como grande
responsável pelos excessos, afirmando, inclusive, que os mesmos policiais que
fizeram o policiamento no jogo do Inter haviam trabalhado no sábado, no jogo do Grêmio.
Jaime Machado: Este é um problema que só pode ser resolvido no plano das relações de trabalho entre empregado e empregador mediante negociação, como a lei prevê.
Pergunta: Qual o prejuízo que essas ações da Brigada Militar podem trazer para a imagem da corporação no resto do país, pois as imagens correram o Brasil no domingo?
Jaime Machado: Acho que o prejuízo já está causado, porque a relação entre os cidadão e o serviço público de segurança deve ser uma relação de confiança que deve ter um equilíbrio que foi quebrado. Cabe à Brigada Militar assumir uma postura não apenas de desculpa, mas também de responsabilidade, que a tradição dessa corporação, através de seus atuais comandantes, saberá assumir.
Pergunta Internauta: O senhor falou em providência para evitar novos episódios semelhantes aos do último
domingo. Quais seriam elas especificamente?
Jaime
Machado: Uma delas seria repensar a utilidade das torcidas organizadas e a outra fazer com que o armamento levado pelos policiais não seja utilizado de modo a causar riscos a terceiros.
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