Geral | 08/08/2013 06h03min
Esperado há seis anos, o julgamento do acidente do voo 3054 da TAM começou ontem, com os depoimentos de duas testemunhas de acusação, em São Paulo.
O mais ruidoso deles foi o de uma desembargadora que acusou diretores da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) de induzi-la a erro no processo que liberou operações em Congonhas.
Realizado na 8ª Vara Criminal Federal, o julgamento das responsabilidades sobre o desastre tem três réus, acusados do crime de atentado contra a segurança de transporte aéreo: Marco Aurélio dos Santos de Miranda e Castro, então diretor de Segurança de Voo da TAM, Alberto Fajerman, na época vice-presidente de Operações da empresa, e Denise Maria Ayres Abreu, então diretora da Anac.
No depoimento, a desembargadora Cecília Marcondes, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, contou que, meses antes da tragédia, ao analisar um recurso à ação que limitava os pousos e as decolagens de algumas aeronaves no aeroporto de Congonhas, liberou as operações ao receber garantia da Anac de que a pista era segura. Depois do acidente, disse sentir-se ludibriada ao ouvir da ex-diretora da agência que o documento era apenas um estudo, insuficiente para atestar a segurança.
Outra testemunha ouvida foi o piloto da TAM José Eduardo Brosco, que havia pousado um avião no dia anterior ao acidente e relatado em documento que a pista estava escorregadia.
– Com o que a desembargadora disse ficou nítido e claro que o avião não deveria ter descido ali – afirmou o presidente da Associação de Familiares e Amigos das Vítimas do Voo TAM JJ 3054 (Afavitam), Dario Scott.
Com cartazes e fotos, cerca de 20 parentes das vítimas fizeram vigília em frente ao Fórum. O procurador da República Rodrigo de Grandis disse ter convicção de que as provas levantadas pelo Ministério Público serão suficientes para condenar os três réus. A expectativa das famílias é a mesma.
A CRONOLOGIA DO DESASTRE
Ocorrido em julho de 2007, acidente em São Paulo matou 199 pessoas
2007
Às 18h54min de 17 de julho, o Airbus da TAM que levava 187 passageiros e tripulantes – incluindo 93 gaúchos – de Porto Alegre a São Paulo, atravessou a pista do Aeroporto de Congonhas, arrebentou um muro, atravessou por sobre uma avenida e explodiu contra um prédio da TAM Express, o setor de cargas da companhia.
2008
O delegado Antônio Barbosa, da Polícia Civil paulista, indiciou 11 pessoas como responsáveis pelo acidente, incluindo dirigentes da Anac, da Infraero e da TAM. O caso chegou ao então promotor Mário Luiz Sarrubo, que concordou com o delegado, mas, entendendo se tratar de crime de competência federal, repassou o inquérito ao Ministério Público Federal (MPF).
2009
Em setembro, a Polícia Federal (PF) remeteu seu inquérito ao MPF, mas sem indiciamentos, avaliando que os pilotos seriam os culpados pela tragédia. O Setor Técnico-Científico (Setec) da PF apontou como fator determinante para o acidente a “operação incorreta dos manetes de aceleração e freio”. Mais tarde, o Cenipa elaborou um relatório de 122 páginas, levantando passo a passo uma série de problemas que culminaram com o acidente, e, por fim, redigiu 83 recomendações para melhoria do sistema. Entretanto, não apontou culpados, sob o argumento de atuar em caráter preventivo e não punitivo.
2012
De posse dos três documentos, o procurador da República Rodrigo De Grandis analisou tudo e tirou suas próprias conclusões. Apesar do laudo do Setec pesando contra os pilotos, ele entendeu que os então diretores da TAM foram negligentes, e a ex-diretora da Anac, imprudente. Assim, em julho de 2012, os três viraram réus, com a denúncia aceita pelo juiz Márcio Assad Guardia, substituto da 8ª Vara Criminal Federal de São Paulo.
O PROCESSO
• O caso incluiu investigações da Polícia Civil de São Paulo, da Polícia Federal e do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa).
• Distintos em prazos e de mecanismos de apuração, os três trabalhos também divergiram em suas conclusões.
• O processo, baseado na investigação da Polícia Federal, soma 17 mil páginas em 70 volumes.
• Os réus poderão receber penas entre um ano e quatro meses até 12 anos.
OS RÉUS
Três pessoas são acusadas do crime de atentado contra a segurança do transporte aéreo
• Alberto Fajerman (ex-vice-presidente de Operações da TAM)
• Marco Aurélio dos Santos de Miranda e Castro (ex-diretor de Segurança de voo da companhia)
Segundo o Ministério Público Federal, os dois não observaram o manual de segurança de operações e não direcionaram as aeronaves a outro aeroporto, apesar de avisos de que a pista de Congonhas era escorregadia em dias de chuva. Os dois teriam deixado de divulgar aos pilotos a mudança de procedimentos em casos de reversor desativado – condição em que voava o Airbus.
O que diz a defesa
O advogado Mariz de Oliveira acredita que os clientes serão absolvidos porque a denúncia carece de fundamentos. O fato de o MPF ter ficado um ano e meio com o inquérito demonstraria a fragilidade dos indícios elencados.
• Denise Ayres Abreu (ex-diretora da Anac)
Contra Denise pesa o fato de, após uma reforma na pista de Congonhas, ela ter liberado pousos e decolagens sem o grooving (ranhuras na pista que aumentam o atrito dos pneus com o solo) e sem inspeção formal das obras realizadas. Ela teria garantido à Justiça que a pista estava em conformidade com padrões de segurança – por causa disso, responde a outro processo por falsificação de documento e uso de documento falso (suspenso pelo STF em 2012).
O que diz a defesa
A ré alega inocência e nega que tenha apresentado documento falso à Justiça. A advogada, que vive no Rio, disse se sentir “profundamente injustiçada”. “Não tenho nenhum milésimo de participação nessa história. Estou tranquila em relação a qualquer processo porque tenho absoluta certeza de que não há, direta nem indiretamente, qualquer tipo de responsabilidade minha neste acidente”, afirmou, em julho de 2012 a ZH.
Familiares de vítimas do acidente da TAM fizeram vigília em frente ao Fórum Ministro Jarbas Nobre, no bairro Bela Vista, em São Paulo
Foto:
NELSON ANTOINE
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FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO
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