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 | 28/06/2011 06h54min

Gilberto Silva: "iluminado por Deus" no meio-campo do Grêmio

Em entrevista ao Diário Gaúcho, o novo camisa 3 gremista se diz confiante e tranquilo para encarar o Brasileirão

Mariana Mondini  |  mariana.mondini@diariogauho.com.br

De estofador de sofás a pentacampeão mundial pela Seleção Brasileira. Gilberto Silva, 34 anos, é, definitivamente, "um iluminado por Deus", como é definido por seu primeiro treinador, o locutor de rádio Waldir Pinto Ribeiro, 51 anos, de Lagoa da Prata (MG). O volante é um exemplo de perseverança e dedicação. Nem o cavaquinho escapa dele!

>>> Cidadão do mundo: os passos de Gilberto Silva até a chegada ao Grêmio

Marido de Janaína, 36 anos, pai de Isabella, oito, e de Giovanna, quatro, e dono de quatro cachorros, Gilberto chegou ao Grêmio, após quase uma década na Europa (onde jogou na Inglaterra e na Grécia), como o grande reforço "cascudo" deste ano e com a missão de fazer o clube voltar a conquistar títulos.

Tarefa difícil? Pode ser, mas não para alguém que, aos 19 anos, ainda nem era atleta profissional e, três anos depois, no Oriente, levantava simplesmente a taça de campeão do mundo. Com a fala mansa, as feições tranquilas e os gestos contidos, Gilberto revela que nem os percalços da vida o impediram de alcançar seu grande sonho.

Diário Gaúcho - Quando começaste a trabalhar?
Gilberto Silva - Aos 12 anos. Queria ser independente do meu pai. Somos quatro irmãos. São três mulheres, e sou o mais velho. Consegui emprego em uma estofaria. Ganhava pouco, mas estava feliz, conseguia comprar coisas para mim e não estava na rua fazendo nada errado, além de aprender algo útil.

Diário - E o futebol?
Gilberto - Jogo desde que me entendo por gente. Jogava na rua, na escola, com meus primos. Até os 12 anos, morei em Usina Luciânia, vila de trabalhadores da usina de cana de açúcar, a 6km de Lagoa da Prata (MG). Meu pai trabalhava lá. Fui para a escolinha La Pratinha, em Lagoa da Prata. Pedalava 6km até lá.

Diário - Sempre jogaste no meio-campo?
Gilberto - Meu pai, Nízio, jogava na várzea, de zagueiro, e falava: "Tem de jogar no ataque". Cheguei a tentar, mas parei no meio (risos).
Diário - Como começou a carreira?
Gilberto - Até 16 anos, continuei no amador. Fiz meu primeiro teste no Atlético-MG e fui reprovado. Era a primeira vez que participava. No Interior, são poucas chances, é como se fosse outro país (risos).

Diário - Como encaraste a reprovação?
Gilberto - Era um peneirão, treinei de segunda a sexta, até a última fase. Só foram aprovados nascidos em 1977, e sou de 1976. No América-MG, passei. Fiquei por cinco meses, no juvenil. Aí, minha mãe, Isabel, adoeceu, e me vi obrigado a voltar para casa.

Diário - Qual foi o problema de sua mãe?
Gilberto - Foi nos rins, começou a fazer hemodiálise (processo em que o sangue é limpo de substâncias nocivas). O técnico Edson Gaúcho tentou de tudo para eu ficar, mas não dava. Passei dois anos e meio trabalhando numa fábrica de balas. Jogava no time de lá e cumpria as obrigações do trabalho. Virava noites...

Diário - E quando decidiste voltar ao futebol?
Gilberto - As coisas foram amenizando. Decidi retornar, aos 19 anos. Sabia que era minha última oportunidade. Larguei o emprego. Fiquei um mês em Lagoa, treinando sozinho. Tinha noção do que enfrentaria, e precisava estar em boas condições físicas.

Diário - Como foi o retorno?
Gilberto - Fui aceito de volta no América, já tinham minha documentação. Fui reintegrado aos juniores. Em quatro meses, já treinava com o profissional. Fiquei de 1996 até o fim de 1999. Fui para o Atlético-MG, uma vitrina maior. Enfrentei um período difícil lá, com duas lesões. No primeiro ano, fratura por estresse na tíbia direita. Voltei a treinar e tive o mesmo problema.

Diário - E a Seleção?
Gilberto - Em 2001, veio a primeira convocação, contra a Venezuela. O Felipão fazia vários amistosos com quem jogava no Brasil, e eu estava no grupo.

Diário - Como é ser o mineiro que mais vestiu a canarinho em jogos oficiais?
Gilberto - É motivo de orgulho. Minha infância e adolescência foram de luta. Crescer no futebol já seria fantástico. Esse reconhecimento todo, então, foi presente de Deus. Minha base não foi completa, interrompi por uma causa justa. Jamais me perdoaria se não tomasse essa decisão. Priorizei a família. Acredito na lei do retorno. Se fiz coisas boas, coisas boas acontecem para mim, também.

Diário - Depois de tantos títulos, o que ainda te motiva?
Gilberto - Enquanto tiver condições, quero conquistar mais. Meu pensamento é correr por títulos. Não dá para se acomodar, achar que é suficiente.

Diário - O que te atraiu no Grêmio?
Gilberto - Na última temporada na Grécia, eu e minha família pensávamos em voltar ao Brasil. O Grêmio ligou, tudo correu rápido e tranquilamente. Houve empatia.

Diário - Achas que será difícil a readaptação ao futebol brasileiro?
Gilberto - Sei que é diferente. Fiquei nove anos fora. Cultura, jogos, treinos, tudo muda, mas estou confiante, tranquilo. Quando só depende de mim, não tenho medo. Minha experiência de vida conta muito.


Gilberto Silva: tranquilidade para se readaptar ao futebol brasileiro


Diário - Quem é a pessoa mais importante na tua carreira?

Gilberto -  Meu pai foi meu grande professor, jogamos juntos no Lagoa Futebol Clube e no Arce. De forma sábia, me ensinou a jogar de um jeito simples. É mais difícil jogar simples.

Diário - O que estás achando de Porto Alegre?
Gilberto - Sinto-me à vontade. Não deu para conhecer muito, ainda. Está bem corrido. Como não estou jogando, posso procurar moradia. Já olhei um bocado (risos)! Preciso ter paciência.

Diário - O que gostas de fazer quando não estás de chuteiras?
Gilberto - Gosto de tocar e curtir minha família. Ainda estou brigando com os instrumentos, uma luta boa (risos)! Toco cavaquinho e estou batalhando o violão. Ouço um pouco de tudo: MPB, samba, sertanejo. Tenho ouvido exigente!

Diário - Como tua experiência de vida contribuiu para seres quem és hoje?
Gilberto - Procuro sempre enxergar o lado positivo. Há coisas complicadas, que podem irritar, mas para mim são mínimas. Até as críticas na Seleção. Doeram bastante, mas sabia que minha resposta seria no campo. Procurei trabalhar em silêncio. Tenho certeza de que as pessoas que me criticaram me ajudaram a crescer. A experiência fora do futebol foi importante para ter noção do outro lado da vida, ver que as coisas são difíceis e que a maioria das pessoas tem poucas oportunidades. Faz a gente valorizar o que conquista.

Saiba mais
Clubes

1996 a 2000: América-MG
2000 a 2002: Atlético-MG
2002 a 2008: Arsenal/Ing
2008 a 2011: Panathinaikos/Gre

Títulos
Brasileirão Série B: América-MG
Campeonato Mineiro: Atlético-MG
Campeonato Grego
Copa da Grécia Panathinaikos
Copa da Inglaterra
Community Shield
Campeonato Inglês
Copa da Inglaterra Arsenal
Copa do Mundo
Copa das Confederações
Copa América
Seleção Brasileira

– Nasceu em Lagoa da Prata, interior de Minas Gerais, em 7 de outubro de 1976.

– O volante mede 1,84m e pesa 74kg.

– É o mineiro que mais vezes vestiu a camisa da Seleção em jogos oficiais, superando até Pelé, de Três Corações.

–Com 17 gols, o volante é o segundo maior artilheiro entre os brasileiros que já marcaram pela Premier League (denominação do Campeonato Inglês de 1992 em diante).

–Gilberto já foi convocado  115 vezes pela Seleção (98 jogos,  69 vitórias, 20 empates, nove derrotas e três gols).

Fala aí, professor!
O Diário Gaúcho conversou com quem colocou o craque no caminho da bola. Waldir Pinto Ribeiro, 51 anos, foi o primeiro treinador de Gilberto Silva. Hoje, trabalha como locutor na Rádio Tropical, em Lagoa da Prata:

– Fui o primeiro técnico do Gilberto, na escola La Pratinha, entre 1989 e 1990. Fazia um trabalho voluntário num areião aqui em Lagoa da Prata (MG) com 300 alunos. Todo mundo chamava ele de Beto. Ele sempre foi assim, sossegado. Até demais! Chegava calado, era determinado, obediente. Além de grande jogador, é humilde, simples, com o coração do tamanho do mundo.

Waldir também já planeja ver seu ilustre pupilo em ação pelo Grêmio:

– À época, ele era camisa 10. Depois foi para a posição dele.

Gilberto é um vencedor, saiu de uma cidadezinha e conquistou o mundo. Vamos tentar montar uma caravana para vê-lo estrear pelo Grêmio em Sete Lagoas (Cruzeiro e Grêmio enfrentam-se na Arena do Jacaré, em 6 de julho, às 19h30min).

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