| 18/12/2010 19h30min
Pato Abbondanzieri ajeita as meias e as luvas antes de se postar na meta. Debaixo do travessão, ele estende os braços para cima e empreende pulos curtos. Observa, à sua frente, Pirlo prestes a correr para a bola. Quando o meia desfere um chute forte, no canto esquerdo, o arqueiro salta para o lado e bloqueia a passagem da primeira das cobranças de pênalti da decisão. Depois de observar Seedorf mandando uma bomba por cima da goleira e defender o chute de Costacurta, o argentino garante o título mundial de 2003 para o Boca Juniors, contra o Milan de Cafu e Dida.
A garra apresentada em campo, a precisão com que voava em busca dos arremates e a perícia na repressão dos pênatis consagraram Pato Abbondanzieri como um ícone no time argentino. O arqueiro defendeu a equipe por 11 anos, entre 1996 e 2006 e 2009 e 2010. Na primeira passagem, o goleiro faturou os títulos de dois Mundiais de Clubes, três Libertadores, duas Sul-Americanas, uma Recopa e seis campeonatos nacionais.
Foto: Jefferson Botega.
Foi o ídolo dessa década de vitórias que o Inter decidiu contratar no início deste ano. Mas, por recomendação do uruguaio Jorge Fossati, a direção colorada buscou, no país vizinho, um arqueiro reserva e contestado por uma torcida que o havia incensado aos píncaros da glória esportiva três anos antes.
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O anúncio do reforço
Antes da contratação de Abbondanzieri, Fossati analisou as atuações do arqueiro.
— Observei-o, e está em seu nível de sempre. Ainda tem idade para jogar em alto nível por muitos anos — previu o uruguaio.
Após a confirmação, Fernando Carvalho exaltou as qualidades do reforço:
— É um vencedor. Chegará como chegou o Manga nos anos 70.
A recepção dos colorados fez juz à esperança do dirigente. O goleiro ficou surpreso ao ver mais de cem torcedores do Inter à sua espera no aeroporto Salgado Filho.
A trajetória
A estreia de Abbondanzieri ocorreu poucos dias depois de sua chegada, contra o Emelec, na primeira partida da Libertadores. O jogo, no Beira-Rio, terminou 2 a 1 para o Inter. O gol, sofrido no início da segunda etapa, definiria um padrão nos reveses de Pato: assim que o adversário penetra na área colorada, o arqueiro desata a correr e se arremessa de encontro ao atacante, em um carrinho desesperado. Goleiro no chão, bola na rede.
Depois de boas partidas contra Santa Cruz e São Luiz, Abbondanzieri mostrou toda a sua garra no duelo com o Deportivo Quito, no Equador. No primeiro jogo da equipe fora de casa, o árbitro colombiano José Buitrago sinalizou erroneamente um pênalti do goleiro. Abbondanzieri não se conteve e defendeu-se verbalmente. Logo depois, o juiz reverteu a decisão. No restante do jogo, o arqueiro ainda salvou o time pelo menos duas vezes antes do encerramento. Resultado: um ponto na bagagem e um princípio de ídolo.
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Nos jogos seguintes, no entanto, Abbondanzieri começou a demonstrar traços pouco desejáveis em um goleiro. Saídas estabanadas do gol e constantes espalmadas para o lado passaram a minar a confiança do torcedor.
A preocupação se concretizou na decisão das quartas de final da Taça Fábio Koff, contra o Novo Hamburgo. O arqueiro falhou no primeiro gol do jogo, em um chute defensável após cobrança de falta. A jogada, inclusive, começou em outro erro seu: tentou sair jogando, passou mal e obrigou o zagueiro a cometer a infração. Ao fim da partida, empatada em 3 a 3, o goleiro se redimiu e garantiu nos pênaltis a vaga na próxima fase.
— É inadmissível que um goleiro mostre tanta desconcentração como eu esta noite. Falam que eu fui herói, mas não: falhei muito. Se tivesse atuado melhor, o jogo talvez não tivesse ido para os pênaltis — lamentou.
Foto: Diego Guichard.
Na primeira partida das oitavas de final, contra o Banfield, na Argentina, a desconfiança se estabeleceu de vez. Ainda no primeiro tempo, aos 19min, Abbondanzieri recebeu bola mal recuada e, com pouco espaço, tentou driblar o adversário. Só que o toque para o lado saiu muito forte, e quem chegou antes foi o uruguaio Fernández, que tocou para Ramires mandar para as redes. Por sorte, o árbitro anulou erroneamente o lance, por impedimento. Lances posteriores na derrota por 3 a 1 denunciaram mau momento do arqueiro.
Na fase seguinte, após vitória sobre o Estudiantes no Beira-Rio, por 1 a 0, o Inter rumou para a Argentina novamente. Aos 20 minutos do primeiro tempo, Verón fez um lançamento perfeito do meio-campo, com a bola alçada da esquerda na diagonal para González, completamente livre. O goleiro saiu desastrosamente da meta e foi encoberto. Um minuto depois, uma lateral cobrada pela esquerda parou nos pés de Pérez, que, da entrada da área, tocou por cobertura sobre o arqueiro colorado, adiantado. A bola entrou no ângulo direito. No fim, o gol de Giuliano salvou a equipe gaúcha.
Com a demissão de Jorge Fossati, no fim de maio, Pato Abbondanzieri foi conduzido a uma espécie de "reciclagem", para praticar fundamentos. Segundo o coordenador da preparação de goleiros, Clemer, o argentino não havia tido tempo de treinar desde que chegou ao Beira-Rio, em fevereiro. No seu lugar, Lauro enfrentou Atlético-PR, Corinthians e Palmeiras, pelo Brasileirão.
Fronteira do pênalti
Na intertemporada, época do recesso para a Copa do Mundo, Pato Abbondanzieri parecia retornar ao ápice de sua forma, sob o comando de Celso Roth. Em junho, o goleiro foi o responsável pela conquista da Taça Fronteira da Paz, em um amistoso com o Peñarol. A partida, empatada em 0 a 0 no tempo regulamentar, se decidiu nos pênaltis. o arqueiro pegou três e se tornou o herói do jogo.
— Acho que o Pato teve 80% nesse título. Foram três pênaltis, impressionante — elogiou Guiñazu após a decisão.
Mas a glória não durou muito. Depois do recesso, o Internacional venceu com facilidade o Guarani por 3 a 0 e derrotou o Ceará e o Atlético-MG pelo placar de 2 a 1. Contra o Vozão, nova falha: o volante Michel chutou de fora da área, a bola desviou no meio do caminho, e o argentino não conseguiu segurar. Contra o Galo, Abbondanzieri fez sua última partida como titular. Um jogo depois, o duelo com o Flamengo marcaria o início da Era Renan.
Foto: Alexandre Lops, divulgação.
Aposentadoria
Após o Mundial de Clubes e o fim do contrato com o Inter, no fim de dezembro, chega a hora de Pato, de 38 anos, se afastar dos gramados e se dedicar a uma outra paixão: o automobilismo. Em sua fazenda na Argentina, na região da Bouquet, ele organiza corridas de kart.
— Temos um grupo que corre, do qual Palermo (centroavante do Boca Juniors) faz parte. Mas não podemos correr muito por causa do contrato — lamenta, em entrevista ao jornalista Diego Guichard.
Mesmo distante do futebol, Pato não deve largar as luvas. A diferença agora é o capacete estilizado e o macacão de piloto.
Jogos pelo Inter:
1) Inter 2 x 1 Emelec (Libertadores)
2) Inter 4 x 1 Santa Cruz (estreia no Gauchão)
3) São Luiz 0 x 1 Inter (Gauchão)
4) Deportivo Quito 1 x 1 Inter (Libertadores)
5) Cerro 0 x 0 Inter (Libertadores)
6) São José 3 x 0 Inter (Gauchão)
7) Caxias 2 x 0 Inter (Gauchão)
8) Inter 2 x 0 Cerro (Libertadores)
9) Inter 4 x 0 Universidade (Gauchão)
10) Novo Hamburgo 3 x 3 Inter (Gauchão)
11) Inter 2 x 0 Ypiranga (Gauchão)
12) Emelec 0 x 0 Inter (Libertadores)
13) Inter 3 x 2 Pelotas (Gauchão)
14) Inter 3 x 0 Deportivo Quito (Libertadores)
15) Inter 0 x 2 Grêmio (Final do Gauchão)
16) Banfield 3 x 1 (Oitavas de final da Libertadores)
17) Grêmio 0 x 1 Inter (Final do Gauchão)
18) Inter 2 x 0 Banfield (Oitavas de final da Libertadores)
19) Inter 1 x 0 Estudiantes (Quartas de final da Libertadores)
20) Estudiantes 2 x 1 Inter (Quartas de final da Libertadores)
21) Inter 0 x 2 São paulo (Brasileirão)
22) Vasco 3 x 2 Inter (Brasileirão)
23) Peñarol 0 x 0 Inter (Pênaltis 1 x 2 - Tornio da Paz)
24) Guarani 0 x 3 Inter (Brasileirão)
25) Inter 2 x 1 Ceará (Brasileirão)
26) Inter 2 x 1 Atlético-MG (último jogo como titular - Brasileirão))
27) Atlético-GO 2 x 2 Inter (rodízio de goleiros - Brasileirão)
28) Internacional 4 x 2 Seongnam (Mundial de Clubes)
Ao total, são 28 jogos e 29 gols sofridos. Desses, 10 na Libertadores, 10 no Gauchão, um em amistoso, seis no Brasileiro e dois no Mundial.
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