Esportes | 26/10/2009 04h13min
Alguém já disse, de forma empírica porém sábia, que grandes goleiros não erram. Eles produzem tragédias. Algumas épicas, inclusive. Pois aí está um provérbio do futebol que parece criado sob medida para o que aconteceu a dois minutos e trinta segundos do Gre-Nal de ontem no Beira-Rio, quando os times ainda se ajeitavam no campo e os torcedores afinavam a garganta para os cânticos apaixonados. Victor, pode acreditar, tomou um frango. E aceitar frango em Gre-Nal é um drama. Ainda mais se o frango é o culpado pela derrota.
Prova disso está na primeira resposta do técnico Paulo Autuori durante a entrevista coletiva na qual tentou explicar por onde passa o fim de ano melancólico que se avizinha para o Grêmio. A pergunta, clara e simples:
– O que determinou a derrota do Grêmio?
A resposta do treinador, ainda mais clara e mais simples:
– O gol. Depois do gol tivemos controle absoluto do jogo.
Então, em vez de vencer por
obra de Victor, como tantas vezes aconteceu, ontem o Grêmio
perdeu por um erro bisonho seu. Vale relembrar o lance. A bola é erguida de frente para Alecsandro, na intermediária. Ele está no meio de três zagueiros. Como último recurso, recua de peito para o argentino, que vem de trás. Se dominasse a bola, seria alvo de uma blitz de marcadores. Atrás de D’Alessandro, mais três jogadores do Grêmio e apenas um do Inter, Giuliano. Conta final: seis a três para o Grêmio. Então, o camisa 10 arriscou. Era o que lhe restava fazer. De longe, muito longe, 30 metros ou mais. Chutou fraco. Com efeito, talvez, mas sem potência. Victor caiu cedo demais. Tomou um gol em câmera lenta. A bola quicou à sua frente, mudou levemente a trajetória e o enganou.
– Que coisa estranha, não é? Chutei, a bola foi na direção do Victor e, quando vi, estava entrando. Mas futebol é assim – descreveu D’Alessandro.
Para quem imaginava que uma falha em Gre-Nal não abalaria Victor, outra surpresa. O goleiro que só não é titular da Seleção Brasileira porque à sua
frente está o melhor do
mundo na posição, Júlio César, por alguns instantes pareceu um recém-promovido das categorias de base. Logo depois do frango, Léo recuou a bola para Victor, o iceberg, dominá-la e sair jogando. Mas a bola passou por debaixo dos pés. Se Victor estivesse na goleira, em vez de perto da linha de fundo, seria protagonista de não apenas uma, mas duas tragédias.
No mesmo instante, os companheiros sentiram que a rocha estava ruindo. Cena estranha: de cabeça baixa, Victor virou-se para se desculpar, com o braço direita erguido. Léo tentou impedi-lo e desatou a bater palmas, como se dissesse: “Só me faltava essa, o Victor se desculpando por um erro”. Antes, o goleiro tinha repetido o gesto. Ao sofrer o gol, pediu perdão a Autuori. Depois, ainda sairia em falso em um cruzamento. Não era o seu dia. Sua única felicidade se deu quando Alecsandro se enrolou com a bola ao tentar driblá-lo, facilitando a única defesa importante no jogo. Bonito foi o gesto da torcida, que teria invadido o campo para
confortar o seu
herói de sempre, se pudesse. Os gremistas o aplaudiram e gritaram seu nome.
– Acontece. Errei – reconheceu Victor. – Só o que posso fazer é seguir trabalhando com ainda mais força.
Uma frase estranha. É raro ouvir um goleiro como Victor falando nestes termos. Mas ontem foi um dia diferente. Ontem foi o dia mais trágico de Victor com a camisa do Grêmio.
ZERO HORA
A bola vem fraca, de longe, no chute de D’Alessandro, mas Victor cai antes e não evita o gol, mesmo com a bola entrando um pouco acima dele ao tocar no chão
Foto:
Jefferson Botega
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