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 | 18/05/2009 04h59min

Uma conversa com Paulo Autuori

Diogo Olivier, colunista online  |  diogo.olivier@zerohora.com.br














Fui a São Paulo para entrevistar Paulo Autuori. Passei o domingo no Aeroporto de Guarulhos, à espera do sonho de consumo do Grêmio, do segurança Pedrão até o presidente Duda Kroeff, passando pelos espíritos imortais de Lara e Lupicínio Rodrigues. Ele chegaria no começo da noite, vindo de Dubai. E chegou mesmo, no horário marcado.

Já fiz este trecho interminável desde os Emirados Árabes. O vôo da Emirates é de outro mundo. À noite, tem até simulação de estrelinhas no teto para ajudar a dormir. Um espetáculo. Mas não há simulação de estrelinhas e tela de plasma interativa às costas da poltrona da frente que resolvam o incômodo de passar 14 horas sentado. Por isso, compreendi quando ele disse não ao meu pedido de uma profunda entrevista sobre o Grêmio e seus caminhos rumo ao tri da Libertadores.

O que não impediu Autuori de falar. Não muito, mas o suficiente. O próprio silêncio, por exemplo: foi uma forma de agradar os árabes em busca da liberação junto ao Al Rayyan, no Catar. Nada contra jornalistas, me disse ele. Ao contrário. Poucas vezes se verá tratamento tão respeitoso com os profissionais de imprensa no Grêmio, podem apostar nisso. Autuori é um homem educado. Sabe lidar com elegância até com alguma pergunta mais ácida ou fora de prumo, o que é uma virtude dos homens públicos diferenciados. Mas o fato é que o silêncio foi decisivo para convencer os árabes que era chegada a hora de voltar ao Brasil.

Outro dado interessante que Autuori revelou. Nas entrevistas, ele falará sem prazo determinado. Claro que o bom senso não recomenda saraus táticos noite adentro, mas acabou-se aquela história de duas ou três perguntas e assunto encerrado. Autuori tem confiança no que diz e faz. Não vê perseguição em cada pergunta apimentada. Tira de letra. O novo técnico falará, portanto. Repare nesta parte de nossa conversa rápida, em frente ao balcão da TAM (foto), ontem:

— Não falei para ninguém sobre o Grêmio este tempo todo. Por isso não abrirei exceção para ti. Não posso chegar oferecendo privilégios, entende? — afirmou o novo técnico do Grêmio.

— Claro — concordei.

— Mas é claro que, depois de dar a conferência (quando ficam muito tempo fora do Brasil, treinadores e jogadores esquecem o brasileiríssimo termo "entrevista coletiva" e adotam o similar espanhol, conferência de prensa), vou falar mais tempo com os jornalistas com os quais tenho mais intimidade, que conheço há mais tempo. Tem gente pedindo entrevista há um tempão e não atendi por este princípio que te falei. Sei que a Zero Hora está atrás de mim faz tempo. E admiro isso — avisou Autuori.

Gostei. Poderia ficar chateado por ir a São Paulo e voltar sem a entrevista devastadora sobre como será o Grêmio daqui por diante. Mas a conversa que tive com Autuori valeu por um aspecto mais importante. É bom encontrar pessoas que, no futebol, revelam preocupação com ética, respeito, critérios, valores.

Autuori poderia ter dito: "não falo antes de me apresentar e pronto". É um direito dele. Mas preferiu explicar, compreendendo que, do outro lado, havia alguém com o objetivo único de exercer o seu trabalho. O que me permitiu, também, explicar as razões que levaram Zero Hora até São Paulo para entrevistá-lo.

A isso se chama civilidade. A ascensão de Autuori no Grêmio é a certeza de que a barbárie passará longe do Olímpico por um bom tempo. Em tempos de foguetórios e violência nos estádios, às vezes entre torcedores de um mesmo time, um pouco de civilidade é esperança de luz no fim do túnel.

 



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