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 | 30/01/2010 21h09min

Estrangeiros da bola trazem novos sotaques ao Campeonato Catarinense

Estadual 2010 transformou-se em uma pequena Babilônia

A maior dificuldade foi a língua. O pessoal falava “bom dia” e eu não entendia. Até que aprendi a perguntar: o que é isso? Depois aprendi “você também”. Quando davam bom dia eu falava: “você também”. Quando alguém me sacaneava eu dizia: “você também”. Em Brasília, eu andava de táxi e não sabia o valor do dinheiro, muitas vezes me passavam para trás. Comecei a andar de ônibus, mas não conseguia me comunicar com o cobrador e o motorista.

O sonho do camaronês Steve Loic Mbous, 25 anos, é ser convocado para a seleção principal, meta que ele pretende alcançar se destacando no Brasil. Esse foi um dos motivos que o levou a deixar o Macaé-RJ, onde foi o autor do primeiro gol do clube no Maracanã:

— Na Chapecoense tenho mais chances de vencer o Estadual — afirmou.

Ele chegou ao Brasil em 2001 e já passou por clubes como o Vitória, onde conheceu a esposa Jéssica, e o Avaí, em 2005. Steve gosta muito do país e só lamenta o preconceito sofrido pelos negros em algumas situações.

A situação mais curiosa que vivi no Brasil foi em 1976, quando joguei a Copa do Atlântico pelo Uruguai. No jogo contra o Brasil, no Maracanã, fiz uma falta um pouco violenta no Zico. Quando o Zico caiu, o zagueiro Chagas bateu nele no chão e se formou um bolo. Levei um soco na boca do Rivelino e fiquei louco. Quando o juiz apitou o final saí correndo atrás do Rivelino e se formou uma briga generalizada. Todo mundo veio pra cima de mim. Levei muita porrada.

Os técnicos também têm seu representante estrangeiro no Catarinense: o uruguaio Sergio Ramirez, 58 anos, treinador do Joinville. No Brasil há 33 anos, quando veio atuar na lateral direita do Flamengo, ele não tem muitas dificuldades para falar e entender o português, apesar de não ter perdido o sotaque. Ramirez não teve problemas de adaptação ao novo idioma. Como morava em uma cidade próxima à fronteira com o Rio Grande do Sul, ele vinha com frequência ao Brasil, quando era jovem, para acompanhar a avó que fazia compras no país.

Tente falar em português com o meia Gastón Ada, 21 anos, do Figueirense. Se de repente ele franzir a testa, levantar a sobrancelha e balançar a cabeça negativamente, o sinal está dado: ele não entendeu nadinha. Aprender a se comunicar por aqui é só mais um desafio para o jogador, um dos estrangeiros que disputam o Campeonato Catarinense.

Só no Alvinegro são três argentinos. Martín Lucero, 19, foi o primeiro a chegar, há oito meses. Já aprendeu um pouco do idioma e agora faz o papel de tradutor para Gastón e Agustín Cattaneo, 21, que completa o trio. Eles vieram de Buenos Aires e estão prontos para colocar uma pitada do explosivo futebol de lá no time de Renê Weber. O treinador arrisca algumas palavras em espanhol, o que ajuda na comunicação.

Na hora de conversar com o trio, falar pausadamente aumenta as chances de compreensão. Eles só não pedem para repetir quando perguntados sobre a preferência entre Pelé e Maradona. A opção pelo argentino é unânime.

As escolhas mudam na hora de falar dos ídolos. O atacante Martín é fã do francês Thierry Henry. O meia Gastón prefere D’Alessandro, do Inter, enquanto o zagueiro Agustín admira o espanhol Andrés Iniesta, do Barcelona.

Todos gostam de Florianópolis, mas sentem saudades da carne e principalmente dos canais de TV da Argentina. Em casa conseguem manter alguns hábitos como escutar cumbia, ritmo portenho. Agustín, no entanto, admite que a música brasileira está ganhando espaço:

— Exaltasamba é bom — revelou.

Apesar da comunicação ser um problema que tive de enfrentar, não cheguei a pagar nenhum mico. Pelo contrário. O que mais me chamou a atenção aqui no Brasil foram os jogadores brasileiros com quem convivi. Todos querem aprender a falar palavrão em espanhol. Em todo lugar que joguei, foi assim. Além disso, tive muita dificuldades para me adaptar ao calor de Salvador, quando joguei no Vitória. É um lugar muito lindo para viver e com pessoas muito legais, mas é muito quente.

A estrela estrangeira do Metropolitano é o argentino Mariano Sebastian, 22 anos, o Trípodi. Natural de Buenos Aires, o atacante tem um currículo pomposo: revelado nas categorias de base do Boca Juniors, defendeu a seleção júnior da Argentina, o Colônia (Alemanha), o San Martín (Argentina), Santos, Vitória e Atlético-MG. Agora, tornou-se o primeiro estrangeiro a vestir a camisa do time de Blumenau. Há dois anos no Brasil, Trípodi diz já ter vencido a principal barreira: o idioma. Ele lembra que quando chegou ao Santos, em 2008, não entendia uma palavra da língua portuguesa. Hoje, comunica-se normalmente.

Agora já estou bem adaptado ao futebol e ao idioma, mas sofri um pouco quando saí da Colômbia. A maior dificuldade era compreender as ordens do técnico. Para nós, costas se fala “espalda”, então o técnico ficava gritando “olha as costas”, “olha as costas”, e eu não entendia. Só ficava olhando ele gesticular e os adversários passando por mim. Agora está tudo melhor. Estou confiante em uma boa campanha do Juventus. Os times estão muito equilibrados.

Uma das atrações capazes de levar o torcedor do Juventus ao João Marcatto é a presença do primeiro estrangeiro a disputar um Estadual pelo clube, o zagueiro colombiano Carlos Saa, de 26 anos. Na Colômbia, chegou a jogar duas Libertadores, uma pelo Deportivo Pasto e outra pelo América de Cali. Carlos veio para o Brasil em 2007, contratado pelo Botafogo-SP, e também atuou pelo Paulista e Grêmio, de Catanduva, antes de chegar ao Juventus. Apesar de ter começado o campeonato como zagueiro, também pode atuar como volante.

DIÁRIO CATARINENSE
Flavio Neves / 

Martín Lucero, Gastón Ada e Agustín Cattaneo deixaram Buenos Aires para reforçar o time do Figueirense, campeão na quantidade de estrangeiros
Foto:  Flavio Neves


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