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 | 26/09/2009 17h45min

Silas, de bem com a vida

Conheça o estilo e a rotina do técnico do Avaí, longe dos campos

Ana Paula Bandeira  |  ana.bandeira@diario.com.br

Quando Silas diz para a mulher, Eliane, que está indo para casa, em Florianópolis, ela não gosta. Retruca: — Lá não é sua casa. É aqui que você mora. Eliane vive em Valinhos, no interior paulistano. É para lá que o treinador do Avaí vai todos os fins de semana, depois que o time joga. Fica por ali até terça-feira, quando retorna à Capital a tempo de acompanhar o treino da tarde. A verdade, porém, é que Silas tem duas casas.



Em Valinhos, além da mulher, ficam os dois filhos mais novos do casal, Carole, 16 anos, e Calebe, 12. Em Floripa, o técnico vive com o filho Nathan, 19 anos, em um simpático e bem estruturado condomínio no Canto da Lagoa. O jovem joga no time das categorias de base do Avaí.

Neste fim de semana, em especial, a distância deixou um aperto maior no coração. Sexta-feira, Silas e Eliane completaram 22 anos de casamento, ele aqui, ela lá. O ex-jogador é uma dessas pessoas grudadas ao celular. Tem dois aparelhos. Enquanto almoçava com a reportagem, quarta-feira, desligou um deles. Mas o outro, cujo número poucas pessoas têm, ficou ligado porque é o que Silas fala com a mulher várias vezes ao dia.

Ele é, de fato, o típico homem família, sempre às voltas com os filhos. Daqui, todos os dias, indica um capítulo ou versículo da Bíblia para os dois rebentos que estão longe. É para estimulá-los a ter uma relação com Deus como a que o pai tem. Silas vem de uma família evangélica, do tempo, como diz ele, “que ser evangélico era razão para uma pessoa ser alvo de preconceito”.

O pai de Silas, um religioso ligado à Igreja Batista, era contra o ingresso do filho caçula (de nove irmãos) no futebol – esporte que, à época, mais do que hoje, era visto como a porta de entrada para o deslumbramento, envolvendo mulheres, boemia e drogas. 

— Meu irmão mais velho, que já jogava, é que fez o meio de campo.

Silas começou a treinar aos 14 anos. Andava uns dois quilômetros, pegava um ônibus, caminhava outros dois quilômetros, até chegar ao local de treino do São Paulo. O pai, que morreu quando Silas tinha 20 anos, não o viu jogar profissionalmente. Mas provavelmente teria orgulho da trajetória que o filho trilhou.

Paulo Silas do Prado Pereira nasceu em Campinas e teve uma carreira sólida no futebol brasileiro. Mas os quatro anos que jogou na Argentina ele classifica como “os melhores da minha carreira”.

Foi e é ídolo da torcida do San Lorenzo de Almagro. É amigo pessoal de Maradona. E tem uma tese:

— Fui pra lá com o pé atrás, mas vi que os argentinos amam o Brasil.

No início do ano, Silas passou dias de férias com a família na Praia dos Ingleses. 

— Os brasileiros nem sabiam quem eu era, mas eu não podia dar dois passos sem que um argentino me abordasse. 

— Você se considerava um bom jogador? 

— Sim, dentro dos meus limites. Eu podia não ser o cara de finalizar, mas dava o passe do gol. E isso me satisfazia — conta o técnico que caiu nas graças da torcida avaiana depois de ter elevado o time à Série A e dado o título de campeão catarinense de 2009, o que não acontecia há mais de 10 anos.

Pode-se dizer que Silas entrou com o pé direito no papel de técnico. Três anos depois de ter pendurado as chuteiras (em 2003, com 38 anos, ele se aposentou como jogador), Zetti, ex-goleiro da Seleção e então técnico do Paraná Clube, o convidou para ser seu auxiliar técnico. A vida estava estabilizada. Ele tocava uma escolinha de futebol e mantinha as pastelarias da família. Mas a paixão pelo esporte falou mais alto.

Eliane, a mulher de Silas, disse que os olhos do marido ganharam novo brilho com o convite de Zetti. E Silas sequer tinha se dado conta da falta que o futebol estava lhe fazendo, já que estava tudo tão tranquilo em sua vida. Como auxiliar, do Paraná foi para o Atlético Mineiro e depois para o Fortaleza, onde assumiu o time na penúltima rodada. De lá, o ex-jogador desembarcou em Florianópolis para comandar o Avaí. E não tem do que se queixar. 

— Recebi propostas para ganhar três vezes mais do que ganho aqui. Mas uma coisa é certa: eu posso ter vindo de uma família muito simples, ter perdido minha mãe aos cinco anos, mas tive uma educação

muito correta. Meu pai dizia que esperava que não fosse necessário um papel assinado para que eu cumprisse a minha palavra. Vou cumprir. Fico até o fim do ano para completar minha missão no Avaí. Depois, é outra história. Aqui sou profissional, frio. 

— Mas você se considera um homem frio? 

— Não, não. Se o cara me enrolar por 10 minutos, leva minha roupa.

É do profissionalismo que Silas fala. Ele sabe bem que, apesar do sucesso junto a torcida, se não renovar contrato com o time azurra, treinará outro clube em 2010.

Mas, se o futuro dele como técnico é incerto, o filho, Nathan, mostra bastante convicção: 

— Se meu pai for embora, eu fico. Quero viver a experiência de estar sem ele por perto. Vai ser bom porque quero estar aqui por mim mesmo.

Nathan refere-se ao fato de algumas pessoas acharem que ele está onde está por causa do pai. Mas Silas, que é de fato sua referência, lida com o filho mais ou menos como trata com os jogadores. Um paizão, mas firme e realista. Tanto assim que, num momento da entrevista, na Ressacada, Silas fez naturalmente um comparativo quando se referiu à forma como se relaciona com a equipe: 

— É como um filho. No momento ele não recebe a reprimenda com alegria, mas depois vê que você foi justo e vai agir da mesma forma com os demais.

Deve estar funcionando, porque, enquanto Silas posava para algumas fotos para esta reportagem, em casa, Nathan contava, na sala ao lado: 

— A gente nunca ficou tão próximo desde que eu estou aqui. Estamos sempre juntos — conta o garoto, que jogava videogame quando a reportagem chegou ao apartamento triplex onde moram os dois. Quem recebeu a equipe do DC foi Maria, a diarista que duas vezes por semana organiza a casa. É ela quem entrega o patrão, quando o fotógrafo sugere que ele pose para fotos com seu violão: 

— Seu Silas toca Djavan. Eu já vi.

E ele tocou Se. Ao fim da música, desejou que Djavan não o visse cantando. Mas tudo bem, afinal, o forte dele é a bola no pé. Silas, além de tocar seu violãozinho, quer aprender a tocar piano, lê bastante e é apaixonado por decoração. 

— Taí uma coisa que eu queria aprender.

O ex-jogador pode não ter feito curso de decoração, mas está exercitando o hobby na casa nova, em Valinhos, que está montando com a mulher, de quem fala sempre. 

— A gente corre junto, joga tênis junto (Silas adora este esporte; diz, inclusive, que escolheu a casa em Florianópolis motivado pelas quadras de tênis do condomínio) e estamos sempre projetando alguma coisa.

É para Eliane que Silas telefona antes de todos os jogos, mas ele garante que isso não é um ritual:

— É que ela me acalma.

E a torcida agradece!

 
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