| 14/10/2005 19h20min
De Colônia, na Alemanha, onde participou de uma feira de alimentação, o ex-ministro da Agricultura Marcus Vinicius Pratini de Moraes falou a Zero Hora por telefone, na última terça-feira, de sua indignação com o descaso do governo com o controle sanitário animal.
– A sanidade animal não é mais prioridade – reclamou.
Depois de fazer uma escala em Genebra, Pratini desembarca amanhã em Moscou, onde pretende acompanhar de perto a reação do principal comprador de carnes do Brasil ao novo foco de aftosa no país.
Zero Hora - Que prejuízos esse novo foco de aftosa pode provocar ao Brasil?
Marcus Vinicius Pratini de Moraes - É muito difícil fazer uma avaliação agora, porque não sabemos ainda todos os países e que níveis de restrição podem impor ao Brasil. Acho que não são tão graves assim quanto anunciam, mas tudo pode acontecer. Então me reservo de dar estimativas até ter uma idéia mais clara de quais são as sanções efetivamente impostas.
ZH - O embargo da Rússia somente à carne do Mato Grosso do Sul é um bom sinal?
Pratini de Moraes - Não há a menor dúvida. Num episódio anterior, numa ilha da Amazônia, a Rússia bloqueou todos os Estados. A decisão reflete maior consciência sanitária e, por outro lado, que eles precisam da nossa carne. Foi muito sensata e tomada depois de consultas feitas à Abiec.
ZH - Por que têm ocorrido vários episódios num período curto de tempo?
Pratini de Moraes - A sanidade animal não é mais prioridade. Sequer o governo aloca recursos para o Ministério da Agricultura, e não se faz sanidade animal sem recursos. Não adianta apenas pagar salário dos veterinários. Eles precisam de dinheiro para viajar, de diárias. Eles às vezes têm de ir a locais muito distantes das cidades, ficar dias lá. Se não tiver verba para isso, não funciona. Aparentemente, nos últimos tempos não há verba nem para equipamento de laboratório nem para os reagentes dos laboratórios existentes. Assim não dá.
ZH - O que está faltando, convencimento?
Pratini de Moraes - Eu tenho uma experiência anterior no Rio Grande do Sul, com governo de linha política semelhante, em que sanidade não era prioridade. Acho que, se o presidente não for muito alertado para esse problema, lá em Brasília, sanidade não vai ser prioridade.
ZH - O senhor vê um problema ideológico?
Pratini de Moraes - É uma mistura de ideologia com falta de qualificação e vou dizer mais, falta de patriotismo. Se não apoiar as medidas de defesa sanitária animal, vai haver restrições externas. Isso todo mundo sabe. É alertado pelos produtores, pelos frigoríficos, pelas lideranças políticas. Estou cansado de falar nesse assunto em Brasília, mas não há eco. Chegou o momento de o governo repensar sua estratégia.
ZH - O Estado pode ser prejudicado ou favorecido?
Pratini de Moraes - O Rio Grande certamente não será prejudicado. Poderia se beneficiar, mas não tem carne para atender a toda essa demanda. Se tivesse, seria o paraíso. Fizemos uma avaliação específica sobre o cenário do Rio Grande, que já foi prejudicado no passado. Agora é a vez do Rio Grande.
ZH - O senhor já estava com viagem marcada para a Rússia ou mudou de planos?
Pratini de Moraes - Fui convidado para participar de uma reunião do Conselho Empresarial Brasil-Rússia, e cheguei à conclusão que tenho mais um motivo para ir.
ZH - O front do governo não é prioritário nesse momento?
Pratini de Moraes - Andei conversando com algumas pessoas em Brasília, mas acho que o mais importante, agora, é dar informações aos países que ameaçam ou que pretendem fazer restrições ao Brasil. O pessoal do Ministério da Agricultura é competente, técnico, experiente, já enfrentou esse problema várias vezes. Eu tenho o maior apreço e admiração pelos técnicos do ministério. São sérios, dedicados, patriotas e defendem os interesses legítimos do Brasil. Confio totalmente nesse pessoal. Mas preciso dar uma ajuda para essa gente no Exterior.
MARTA SFREDO/ZERO HORA