| 14/09/2005 12h10min
Em um dos dias mais tensos no cenário político brasileiro, o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Roberto Busato, reiterou as suas críticas ao presidente da Câmara Federal, Severino Cavalcanti. Para Busato, o cheque apresentado pelo dono do restaurante Fiorella, Sebastião Buani, à imprensa e à Polícia Federal pode comprometer a presença de Severino à frente da sessão de hoje.
– Não apenas na sessão de hoje, mas no comando da Casa – avaliou em entrevista online ao clicRBS.
Contudo, ele acredita que o Congresso tomará posição hoje em relação a Roberto Jefferson, independentemente da situação de Severino. Busato afirmou que não se surpreendeu com as denúncias envolvendo o presidente da Câmara:
– O deputado Severino ousou, sem cinismo, mostrar sua ideologia favorável ao corporativismo e ao nepotismo, o que, no fundo, implica em aceitar prática corrupta no decurso do mandato. A denúncia contra ele só corrobora seu comportamento demonstrado até agora.
Sobre a cassação do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), Busato disse ser improvável que não ocorra. O discurso de defesa do parlamentar também foi comentado.
– Tudo pode ocorrer no pronunciamento de Jefferson, que vem comprovando as denúncias assacadas ao longo do tempo. Como antevê denúncias que envolvam o presidente da República, e a continuar as comprovações, poderemos chegar à mesma situação de Collor – acrescentou.
Busato não descarta que as denúncias resultem no impeachment do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo a sua avaliação, Lula sabia de tudo o que ocorria nos porões de seu governo. Para o presidente da OAB, a crise política atual é pior do que aquele que desencadeou o afastamento de Fernando Collor.
– Sem dúvida nenhuma, a atual. Pela sua origem, sobretudo. Já que a atual crise não teve fatores exógenos, nasceu, desenvolveu-se e espantou a nação dentro do governo e de sua base aliada.
Busato comentou também o discurso feito por Luiz Inácio Lula da Silva no mês passado, no qual declarou ter sido traído, mas não revelou o nome da pessoa que o teria enganado.
– Quem trai o presidente da República trai a nação, e não poderia o representante maior da nação declinar quem são os traidores e onde e como houve a traição. Não agindo dessa forma, trouxe a si a responsabilidade de responder por tais atos perante a nação – afirmou.
Confira a íntegra da entrevista online:
Pergunta: O deputado Roberto Jefferson é considerado por algumas pessoas um herói. Esse tipo de avaliação da opinião pública o surpreende?
Roberto Busato: Não chega a surpreender, mas é uma visão, no nosso entender, incorreta. Afinal, ele é réu confesso de delitos praticados no exercício de seu mandato de deputado.
Pergunta: O voto secreto na sessão pode provocar surpresas na sessão de hoje na Câmara?
Roberto
Busato: Seria a maior decepção se isso ocorrer, porém diante do interesse geral do
povo brasileiro, é uma situação absolutamente improvável.
Pergunta: Você acha que o recurso do voto ato secreto deveria ser evitado nesse tipo de sessão?
Roberto Busato: O importante não é o modo da colheita do voto, aberto ou secreto. Mas sim a seriedade na conduta de quem voto, no caso, o deputado, que exerce uma representação do povo brasileiro.
Pergunta: A Justiça pode invalidar a possível cassação de Roberto Jefferson ou dos outros parlamentares?
Roberto Busato: Em tese, o Judiciário poderá rever todos os atos decorrentes do processo de cassação. Isso é possível, vamos ver o que acontece.
Pergunta: Sebastião Buani está mostrando agora a cópia do cheque encaminhado ao presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE). As denúncias envolvendo o político o
surpreenderam?
Roberto Busato: Não. O deputado Severino ousou, sem cinismo, mostrar sua ideologia favorável ao
corporativismo e ao nepotismo, o que, no fundo, implica em aceitar prática corrupta no decurso do mandato. A denúncia contra ele só corrobora seu comportamento demonstrado até agora.
Pergunta: Como o senhor avalia a atitude do PT em relação a não chancelar a iniciativa da oposição contra Severino Cavalcanti?
Roberto Busato: Lamentável. O partido sempre teve como bandeira a defesa da ética e da moralidade pública. Parece que vivenciamos um outro PT, bem diferente daquele...
Pergunta: Qual foi a pior crise política brasileira: aquela que resultou na perda do mandato de Collor ou a atual?
Roberto Busato: Sem dúvida nenhuma, a atual. Pela sua origem, sobretudo. Já que a atual crise não teve fatores exógenos, nasceu, desenvolveu-se e espantou a nação dentro do governo e de sua base aliada.
Pergunta: O senhor
acha que o Congresso merece o presidente que tem? As atitudes de Severino refletem as práticas dos
demais parlamentares?
Roberto Busato: Ele foi eleito por seus pares, o que reflete a maioria da Casa. O que deve ser ressalvado é a postura digna de parte da Casa, que desde o primeiro momento alertava para o erro da escolha.
Pergunta: Assim como a crise de 1992, a atual pode resultar na perda do mandato do presidente? Roberto Jefferson promete falar sobre Lula em seu discurso...
Roberto Busato: Tudo pode ocorrer no pronunciamento de Jefferson, que vem comprovando as denúncias assacadas ao longo do tempo. Como antevê denúncias que envolvam o presidente da República, e a continuar as comprovações, poderemos chegar à mesma situação de Collor.
Pergunta Internauta: O impeachment do presidente Lula pode ser pedido durante a Conferência Nacional dos Advogados, que acontece esse mês?
Roberto
Busato: AConferência é um grande espaço de debates e a tese, por ser de momento inserida no lema da
Conferência “República, Poder e Cidadania”, poderá ser levantada, debatida e deliberada.
Pergunta: O senhor acha que o presidente Lula se comprometeu com as denúncias ao não revelar o nome de quem o teria traído?
Roberto Busato: Sem dúvida. Quem trai o presidente da República trai a nação, e não poderia o representante maior da nação declinar quem são os traidores e onde e como houve a traição. Não agindo dessa forma, trouxe a si a responsabilidade de responder por tais atos perante a nação.
Pergunta de Internauta: Como o senhor avalia essas recorrentes invasões a escritórios, que têm sido feitas pela Polícia Federal? Aqui em minha cidade, São Paulo, já foram várias.
Roberto Busato: As invasões de escritórios são um atentado ao Estado democrático de Direito e, mais especificamente, à garantia que tem o cidadão de uma ampla defesa. Tais
fatos não ocorrem em países de primeiro mundo, mas naqueles que têm, no seu comando,
tiranos ou em países onde a democracia ainda não está consolidada.
Pergunta de Internauta: Na sua opinião, o presidente Lula sabia ou não sabia do pagamento de mensalão a parlamentares?
Roberto Busato: Para mim, o presidente Lula sabia de tudo o que ocorria nos porões de seu governo. Até mesmo pelo lema de seu partido de que sua prática política era "coletiva", e não individual.
Pergunta: Algumas pessoas criticaram o uso de algemas na prisão do filho de Paulo Maluf. Como o senhor avalia a atuação da Polícia Federal?
Roberto Busato: Com relação às algemas, eram absolutamente desnecessárias, a não ser que o objetivo foi o de desqualificar aquele que fez um pacto de entrega amigável com a própria polícia.
Pergunta: Grande parte das provas consideradas pelas CPIs não vale para a Justiça. As imagens do ex-chefe de Administração dos
Correios, Maurício Marinho, recebendo propina não são consideradas provas? Mesmo sem o uso
desse tipo de evidência, o senhor acha que é possível punir os envolvidos em casos de corrupção?
Roberto Busato: As provas têm seu início pelos indícios e evidências. Deveremos perseverar no ideal de que a Justiça alcançará todos os corruptos deste país.
Pergunta de Internauta: Quando essas invasões vão cessar? Se elas são ilegais como o senhor acaba de dizer, ninguém pode fazer nada? O ministro da Justiça, por exemplo, não pode fazer nada?
Roberto Busato: O ministro da Justiça editou duas portarias normatizando a conduta da polícia, mas, ao que parece, não foram suficientes para solucionar a ilegalidade de conduta. A OAB partiu para representação das autoridades que excedam os limites legais neste campo.
Pergunta: O que o senhor acha do uso do recurso da delação premiada?
Roberto
Busato: A delação premiada deve ser vista com muito cuidado, para evitar um denuncismo. Na Itália, deu certo,
com a condenação de cerca de 5 mil pessoas. Tomara que no Brasil esse instituto seja usado com absoluta seriedade.
Pergunta: A prova apresentada por Buani pode comprometer a presença de Severino à frente da sessão de hoje?
Roberto Busato: Não apenas a sessão de hoje, mas no comando da Casa.
Pergunta de Internauta: Hoje um jornalista de uma rádio bastante conhecida estava defendendo uma pena mais branda para o deputado Roberto Jefferson porque, sem suas denúncias, o povo não ficaria a par desse mar de lama. Seria como uma delação premiada ao contrário. O que o senhor acha disso?
Roberto Busato: Não entendo assim. O deputado abriu a caixa de sujeiras, premido pelas denuncias que o atingiam, de corrupção nos Correios. Poderia contribuir para melhorar o quadro institucional se tivesse revelado absolutamente tudo o que sabia no primeiro
momento, mas o fez por partes, porque apenas pensou em si, e não no país. Cabe-lhe pagar
integralmente, sem perdão, pelos pecados mortais cometidos.
Pergunta: Então, a cassação de Roberto Jefferson provavelmente não ocorre hoje?
Roberto Busato: Acredito que o Congresso tome posição hoje em relação a Roberto Jefferson, independentemente da situação de Severino.
Pergunta: Quais são penas por condenação de uso de caixa dois? O senhor acha que elas deveriam ser mais duras?
Roberto Busato: As penas do uso de caixa-dois são as que constam na legislação eleitoral. Porém, diante do descalabro do que ocorreu, evidentemente devem ser mais duras para desestimular essa prática.
Roberto Busato: Agradeço a todos os internautas e aproveito para convidar a todos para participarem, no período de 25 a 29 deste mês, em Florianópolis, da XIX Conferência Nacional dos Advogados. Qualquer informação a respeito pode ser obtida no site www.oab.org.br. Obrigado.