| 06/09/2005 07h53min
Da época em que era considerado o inquisidor do governo Fernando Henrique Cardoso, o procurador Luiz Francisco de Souza, 43 anos, mantém a paixão pelo Fusca. Já a verve investigatória que tornava a figura frágil numa máquina de fazer denúncias está acanhada.
Souza afirma que não protege o governo Luiz Inácio Lula da Silva. Conhecido pelas posições de esquerda, não absolve o Planalto e a cúpula do PT. O problema, segundo ele, foi a promoção na carreira, em 2004.
– Me sinto engessado – afirma.
Souza agora é procurador regional em Brasília, afastado da linha de frente. Leia a síntese da entrevista a Zero Hora:
Pergunta – Por que o senhor não está na linha de frente das investigações contra o governo e o PT?
Luiz Francisco de Souza – Até outubro de 2003, toquei um bocado de investigações, como a da CPI do Banestado. Aí, o procurador-geral (da República, Claudio Fonteles, que já deixou o cargo) disse: “Se você quiser promoção por mérito, tem todo o direito”. Renunciei ao benefício, mas, em outubro de 2004, fui promovido por antigüidade e me tornei procurador regional junto ao Tribunal Regional Federal.
Pergunta – Como o senhor analisa o escândalo do PT?
Souza – Estou vendo com bons olhos. Milhões votaram em Lula para ele destruir aquela política econômica, para fazer reforma agrária, para abrir a caixa-preta da dívida pública e para investigar as privatizações e anular boa parte dos contratos. Mas preferiu as reformas da Previdência e do Judiciário. É um governo incoerente. No que tange à corrupção estrutural, o governo Lula é tão corrupto quanto o anterior.
Pergunta – O PT era um partido que se dizia contra tudo isso. Onde o partido errou?
Souza – O PT é uma frente de tendências. Quem errou foi o Campo Majoritário (corrente moderada que comanda a legenda). Esse grupo, do deputado José Dirceu, errou porque deu continuidade à política econômica do outro governo. O partido tem de expulsar essas pessoas. Vejo com alegria o P-Sol, porque se cria mais um campo de militância dos trabalhadores e dos oprimidos e pobres em busca de justiça social. A esquerda é extremamente heterogênea e não está contaminada.
Pergunta – Mas a corrupção no governo do PT não é surpreendente?
Souza – Claro. Mas tenho um consolo: onde está mais provada a corrupção é nos Correios, que tem gente do PTB. A corrupção se dá mais nos ministérios não-petistas. Roberto Jefferson (deputado federal do PTB) fez denúncias na tática do gambá. Ele ataca o galinheiro de mansinho. De repente, o cachorro detecta. O gambá sai correndo e espalha mau cheiro aqui e acolá. O olfato do cachorro fica prejudicado, porque fica cheiro ruim em todo lugar, e o gambá escapa.
Pergunta – Lula sabia do
esquema?
Souza – Não tenho provas disso. Sigo a opinião da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB): ainda não é caso de impeachment. No governo FH também tinha caixa 2. O esquema de Delúbio Soares (ex-tesoureiro do PT) é o mesmo de Marcos Valério de Souza para servir a Eduardo Azeredo (ex-governador de Minas Gerais, hoje presidente do PSDB e senador). Há a confissão de quatro deputados do Acre que receberam dinheiro para votar na emenda da reeleição de FH.
Pergunta – É possível termos uma pizza preparada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti?
Souza – É possível. O cara é do partido malufista (o PP, sigla do ex-prefeito de São Paulo Paulo Maluf).
Pergunta – O senhor ainda tem um Fusca?
Souza – Tenho. Melhor seria se ressuscitassem o Gurgel ou a velha FNM. Trocaria na hora. Mas meu Fusquinha 1996 é muito bom. Tinha um 1989, que roubaram. Já me roubaram dois Fuscas. Um ficou com um ladrão por dois anos. Ele havia equipado e feito limpeza no carro. O Fusca é o melhor carro do mundo porque não corre, não mata ninguém e é econômico.
LEANDRO FONTOURA/ZERO HORA