| 23/05/2003 21h06min
Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva participava de um encontro de líderes latino-americanos, em Cuzco, no Peru, dois dos seus principais aliados criticavam a política econômica adotada pelo governo. Em eventos separados, o vice-presidente na condição de presidente interino, José Alencar, e o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, voltaram a criticar nesta sexta, dia 23, a manutenção da taxa de juros básicos em 26,5% ao ano.
Ao participar de um encontro petista para discutir a reforma da Previdência, José Dirceu, sem saber que estava sendo assistido por jornalistas, através de um telão, admitiu que há queda na atividade econômica e que é "ponto pacífico" que os juros precisam ser reduzidos, mas que para isso é necessário que haja condições. Segundo ele, o Banco Central, apesar da sinalização de queda da inflação, não reduziu a taxa Selic neste momento porque ainda não viu condições dos pontos de vista técnico, econômico e político.
Ainda sem saber que seu pronunciamento estava sendo ouvido por pessoas fora da reunião, o ministro acrescentou:
– Não vamos dourar a pílula, porque a queda que existe no país da atividade econômica é visível e seria ridículo se disséssemos o contrário. Se não demos um cavalo-de-pau no país, demos um cavalo-de-pau na economia, porque juro de 26,5% e superávit de 4,25% com contingenciamento de R$ 14 bilhões, evidentemente as conseqüências aparecem imediatamente, é só conversar com os ministros das Cidades, da Integração Regional ou dos Transportes. Temos que conviver com essa realidade e ser criativos.
Neste ponto, Dirceu foi informado que seu discurso estava sendo transmitido aos jornalistas, e disse:
– Ainda bem que eu já vivi, e o Genoino (José Genoino, presidente do PT) também, situações mais adversas do que essa.
José Alencar, por sua vez, em audiência com integrantes da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf), recebeu solidariedade dos
empresários por suas declarações sobre as taxas de
juros da economia brasileira.
– Enquanto os juros reais do Brasil estiverem nesse patamar, o mercado não decola, a indústria não funciona e a renda continuará caindo – disse o presidente da Abigraf, Mário de Camargo.
Na conversa no Palácio do Planalto, segundo empresários que participaram do encontro, Alencar procurou mostrar o quanto o percentual de juros custa ao país. Mas fez questão de ressaltar que confia no presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que os juros vão baixar no momento adequado.
– Ele (Alencar) fez uma análise muito clara do que seria uma política de juros vista mesmo aos olhos do mercado com índices razoáveis – contou Camargo.
Nessa análise, segundo ele, o vice teria considerado a taxa de juros norte-americana, acrescida de risco Brasil no ponto máximo — risco 800 — e uma previsão de inflação de 8% ou 9%.
– Somados esses três fatores, teríamos talvez uma taxa de 18% ou 19% – relatou o presidente nacional da Abigraf, enfatizando que Alencar não se manifestou como vice-presidente, mas como empresário:
– Naturalmente ele expressou esse raciocínio como industrial, dando eco às reclamações da política industrial do país.
Falando tecnicamente, Alencar mostrou que cada percentual de juro equivale a uma despesa anual de R$ 9 bilhões.
De Cuzco, no Peru, Lula disse a interlocutores que não permitirá que a política econômica seja pautada por declarações de aliados ou críticos do governo. Lula deixou claro que decisões sobre juros, por exemplo, têm de ser tomadas com base em questões técnicas e não com base em política declaratória.
Com informações da Agência Brasil e da Globo News.