| 16/01/2009 15h05min
Ainda que os fatos dramáticos da última madrugada sejam o imperativo de uma cobertura à altura, cabe explicar, e essa seria a missão desse texto, o porquê de tanto auê em torno do Brasil de Pelotas, da torcida xavante e da maneira como se torce no Bento Freitas.
Pois bem: isso eu não sei.
Mas sei de outras coisas. Sei que sou xavante, e isso me empurra, a mim e a outros vários, a cometer umas loucuras financeiras e sociais. A gente é capaz de deixar namorada, família e outros amigos não-xavantes para ir numa tarde de domingo a Sapiranga, ou a Ijuí, ou a Blumenau, ou a Rio Branco, no Acre, para ver o escrete rubro-negro jogar, mesmo sem muitas esperanças de vitória, e mesmo que a vitória não valha lá algum título. Sei que nessas ocasiões, com frequência, somos maioria, como fomos nos últimos anos em Porto Alegre, em Novo Hamburgo, em Curitiba.
Sei também que sou xavante e isso contribuiu, comigo e com outros vários, para que proclamássemos pelo
Brasil que aqui há um ídolo do futebol,
um uruguaio, amado por uma torcida que ele ama. Nenhum time grande o levou daqui, porque Milar é nosso, tem o rosto pintado em uma bandeira pendurada no alambrado, agora mesmo, nessa tarde em que ele se despediu do Bento Freitas.
Sei também que, no mundo que conheço, eu e outros vários dos que estão aqui, em torno dos caixões no gramado da Baixada, ninguém nunca ouviu uma sequência de batidas de percussão que retumba tão forte no peito, e impele a um grito de Êh!, de mãos para cima, enquanto todo mundo à nossa volta faz o mesmo, como essa que faz a charanga Garra Xavante.
Sei também que não me sinto, nem eu nem vários outros, como uma pessoa completa no meio daquela gente que pula e grita na arquibancada irregular, de um tijolo-com-cimento que não parece lá muito confiável, mas que é a nossa. Me sinto mais um, um átomo de uma matéria que só existe se coesa, que não é nada se atomizada, que é tudo se veste rubro-negro, pula e grita, vai à Capital e enfrenta os gigantes
milionários, e diz por
aí que "tem que olhar pra aprender".
Bem, isso é o que sei. Eu e vários outros, esses que estão aqui no Bento Freitas ou em São Paulo, em Londres, ou no Chuí, a lamentar o infortúnio que se abate hoje sobre essa parte de nós.
Viagem de ônibus mostra Milar e Régis (loiro, sentado ao lado de dois colegas), dois jogadores que morreram em acidente
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