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 | 20/05/2006 14h

Celular atrás das grades

Brasil discute a melhor maneira de evitar o uso dos telefones nas prisões

A facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) transpôs os muros das penitenciárias de São Paulo e disseminou o terror com um instrumento que agora também ocupa o banco dos réus: o celular. Para inibir o uso do aparelho nos presídios e evitar que ações violentas sejam comandas mesmo por criminosos encarcerados, seis operadoras – Claro, Embratel, Nextel, Telefônica, Tim e Vivo – tiveram de desativar na sexta, após ordem judicial, as antenas das estações de radiobase (ERBs) nas proximidades de seis penitenciárias do interior de São Paulo: Avaré, Iaras, Presidente Venceslau, Araraquara, São Vicente e Franco da Rocha. A medida deverá ser provisória. As empresas e o governo estudam a adoção de bloqueadores de celulares perto das penitenciárias, alternativa que exige mais tempo e gastos para entrar em vigor.

De acordo com Associação Nacional dos Prestadores de Serviço Móvel Celular (Acel), o funcionamento do bloqueador se baseia na emissão de ondas de freqüência similar às adotadas pela telefonia celular. Uma antena, instalada nas instituições, emite ondas que confundem os sinais dos celulares, deixando-os sem serviço.

O professor de Engenharia Eletrônica da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), João Antonio Zuffo, avalia que a opção mais vantajosa é a do bloqueio em vez de deixar as áreas dos presídios sem cobertura das operadoras:

– O alcance de uma antena de celular é em torno de seis e sete quilômetros de raio, é um alcance muito maior do que o desses bloqueadores. Você prejudicaria muita gente, cortando essas antenas. É claro que nessa emergência talvez seja necessário desligar algumas antenas até que se estabelece a rede de bloqueadores.

Em função da necessidade de atender à solicitação da Justiça em 48 horas, as operadoras decidiram suspender o sinal das estações de radiobase, alternativa que atinge um número maior de usuários comuns do telefone. A medida provocou reação dos consumidores:

– É preciso encontrar uma maneira de bloquear só no presídio e não na cidade. Porque se você bloquear na cidade, provavelmente, todo mundo será prejudicado. As pessoas que são trabalhadoras ganham o seu dia a dia, às vezes, com o seu próprio celular – reclama Ana Maria Nogueira, de 35 anos, uma das proprietárias da Clovinho Veículos, empresa de revenda de automóveis, localizada a três quadras da Penitenciária de Avaré I, palco de um dos motins ocorridos na semana passada no Estado de São Paulo.

O desligamento das antenas das operadoras reduz a possibilidade de controle do número de consumidores prejudicados. Já o uso de bloqueadores exigirá a compra das antenas – ônus que as operadoras não pretendem pagar, além da instalação dos equipamentos. O funcionamento dessa tecnologia é considerado simples. Zuffo esclarece que os bloqueadores geram sinais de interferência que tornam impossível a comunicação usando as principais faixas de freqüência da telefonia – 800-900 MHz e 1800-1900 MHz (GSM, CDMA, TDMA). Conforme o consultor de telecomunicações Anor Coutinho, as antenas bloqueadoras irradiam ondas que saturam a banda de freqüência, o que impossibilita o uso dos celulares tanto para efetuar chamadas quanto para recebê-las. Coutinho explica que pode ser usado um único equipamento que abranja o presídio ou várias antenas que fiquem próximas ao local.

Levantamentos realizados pelo professor Zuffo apontam que o custo para instalar um bloqueador seria de cerca de US$ 4 mil. Ele considera o valor baixo. O professor disse ainda acreditar que o governo está mal informado em relação aos preços do equipamento ou “fez alguma concorrência pública com o pessoal inadequado”.

– Eu não vejo dificuldade nenhuma no uso desses bloqueadores. Essa dificuldade que o pessoal está colocando, fazendo um cavalo de batalha, realmente inexiste. Isso é usado comumente no Exterior – disse.

Segundo o professor, nos Estados Unidos, esses equipamentos são usados em larga escala, especialmente depois dos ataques de 11 de setembro. Ele acrescentou que instalações militares, embaixadas, e mesmo carros, adotam o sistema para bloquear ligações telefônicas.

Zuffo prevê que o tempo de uso dos novos bloqueadores de celulares deve variar entre dois e três anos em função da evolução tecnológica da telefonia celular. Segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), atualmente existem sistemas em 14 penitenciárias do Espírito Santo, do Rio de Janeiro, de São Paulo e da Bahia, mas os bloqueadores estariam obsoletos e não conseguiriam atuar na freqüência usada por celulares GSM.

Os telefones não são a única arma de comunicação dos presos. Os detentos se valem também de radiotransmissores para se comunicar com o mundo externo. Para impedir o funcionamento desses equipamentos, também é preciso adotar bloqueadores. No entanto, não é possível aproveitar o material usado para os celulares. Isso ocorre porque os aparelhos funcionam em freqüências distintas.
 
Outra alternativa para isolar os presos é a criação de uma espécie de Gaiola de Faraday nas penitenciárias. Essa solução seria mais dispendiosa, pois o sistema consiste em uma espécie de blindagem elétrica, ou seja, uma superfície condutora que envolve a construção e evita a comunicação.

Uma novidade que deverá entrar no mercado brasileiro já em 2006 poderá ser mais uma dor de cabeça para os governos. A inovação é batizada de WiMax, Worldwide Interoperability for Microwave Access, com a qual o usuário pode fazer conexões de banda larga sem-fio entre dispositivos que possam sintonizar sua freqüência. Assim como os celulares, o dispositivo precisa de torres para que funcione. Conforme o professor Zuffo, para bloquear as faixas de freqüência dessa nova tecnologia (2,5 GHz – 10 GHz), que poderá estar associada ao celular, serão necessários no futuro novos bloqueadores, que ainda não estariam disponíveis no mercado. Problema que deverá estar em pauta em um ou dois anos ou quando eclodirem novas rebeliões orquestradas com a ajuda da nova tecnologia.

– Convém que o governo esteja um passo à frente em termos de tecnologia que o pessoal do crime – enfatiza Zuffo.

MAÍRA KIEFER
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