| 16/02/2005 17h40min
O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) afirmou que o resultado na eleição para presidência da Câmara de Deputados é resultado de uma conjunção de fatores. Entretanto, na sua avaliação, a candidatura avulsa do deputado Virgílio Guimarães (PT-MG) ajudou a desestabilizar o processo e levantar dúvidas a respeito da legitimidade da candidatura oficial do PT. Segundo ele, a postura de Virgílio foi de adversário e é impossível desconsiderar os prejuízos causados ao partido. Pimenta participou de uma entrevista online no clicRBS nesta quarta, dia 16.
Com a vitória do deputado Severino Cavalcanti (PP-PE), Paulo Pimenta acredita que o governo terá que consolidar uma base parlamentar sólida e que o episódio deixou clara a fragilidade do bloco de apoio na Câmara.
O deputado crê que o conservadorismo de Severino é preocupante, principalmente por ser contrário a temas como pesquisas envolvendo células-tronco. Além disso, acredita que a vitória será um empecilho para avançar a legislação em temas como direitos humanos, ampliação dos espaços de participação de presença das mulheres.
A seguir, confira a íntegra da entrevista, realizada pelo jornalista Fabrício Ruiz, com monitoração de Ana Maria Acker.
Qual a avaliação feita hoje pela bancada gaúcha do PT na Câmara em relação ao resultado da eleição desta terça?
Paulo Pimenta: Evidentemente, o resultado não foi o esperado. Não creio que o problema principal tenha sido a escolha do candidato. Na minha opinião, uma conjunção de fatores que envolvem interesses particulares de deputados, de natureza corporativa, um elevado nível de descontentamento de parlamentares com a atenção de alguns ministérios e a possibilidade de transformar a eleição do deputado Severino numa derrota política do governo foram os fatores principais que levaram ao resultado.
De que forma o resultado vai afetar o
governo Lula?
Pimenta: Em primeiro lugar,
certamente provocará um rigoroso balanço dos equívocos que por ventura tenham contribuído para o que aconteceu. Não podemos tratar o assunto como uma questão menor. O fato da maior bancada da Câmara dos Deputados ficar alijada da participação na Mesa Diretora, numa quebra da regra da proporcionalidade, é grave e influencia em outras decisões internas da Casa. Por outro lado, Severino é um parlamentar do PP, Partido que integra a base e que tem votado com o governo. A expectativa é criar um clima de normalidade que reduza ao máximo a possibilidade deste episódio prejudicar o andamento dos projetos do governo.
O que mudará na relação do governo com o Congresso a partir da eleição do Severino?
Pimenta: Acredito que a primeira questão é o governo consolidar uma base parlamentar sólida, pois ficou clara a fragilidade do bloco de apoio na Câmara. Certamente, deverá haver uma mudança na relação com o parlamento. Não se trata de
cobranças fisiológicas, mas de
participação mais intensa na formulação das políticas e projetos do governo. Quando um líder de bancada ou o coordenador da bancada de um Estado revela que há um ano aguarda agenda com determinado ministério, fica nítida a existência de um problema na relação.
Na sua avaliação, a eleição de Severino Cavalcanti representa mais uma derrota do PT ou uma vitória do "baixo clero" da Câmara?
Pimenta: Os fatores que levaram a eleição de Severino, como já disse, são vários. Certamente a não eleição de Greenhalgh é uma derrota para nós. Por outro lado, o discurso do presidente eleito, centrado em temas como salário de deputados, número de assessores, condições materiais para o exercício do mandato, estimularam alguns parlamentares a enxergar na sua candidatura a possibilidade da realização de seus desejos. Para a sociedade, e para os desafios que o Brasil tem pela frente, na minha opinião, o resultado representa um retrocesso e
fragiliza a consolidação da democracia e a
imagem da instituição perante a sociedade.
O governo Lula (diferente de PT) está marcado pela revisão de valores históricos. A (re)consolidação da base de apoio não corre o risco de passar pela farta distribuição de cargos e vantagens?
Pimenta: Espero que não. Não podemos confundir uma política ampla com a perda de valores e princípios. O governo Lula e o PT têm a obrigação histórica de estimular uma alteração substancial na cultura política do país. Entendo que sem uma reforma política que altere radicalmente as regras eleitorais e do processo partidário, que possa acabar com a farra da troca-troca entre os partidos, bem como discutir a fidelidade partidária, ficará difícil fazer as mudanças que precisamos. A reforma política deve ser a prioridade da pauta.
O que o PT fará com o Deputado Virgilio?
Pimenta: O deputado Virgílio optou por um caminho que considero sem
volta. Mesmo tendo o apoio de somente um deputado da bancada,
apresentou-se como candidato avulso e publicamente ajudou a desestabilizar o processo e levantar dúvidas a respeito da legitimidade da candidatura oficial do PT. Teve uma postura de adversário, aliou-se a Garotinho e outros que utilizaram sua candidatura como instrumento de ataques ao Presidente Lula e seu governo. Não há clima para sua reintegração natural à bancada.
Apesar do senhor reafirmar que a derrota é resultado de uma conjunção de fatores, na sua opinião Greenhalgh era o melhor candidato?
Pimenta: A escolha de um candidato leva em consideração vários fatores. Aquilo que tem sido destacado como defeitos do Greenhalgh, para mim são algumas de suas principais virtudes. Sua biografia, sua indisposição para compactuar com o corporativismo e o fisiologismo, sua baixa disposição para o chamado "jogo de cintura". Sua eleição teria um efeito moralizador e desde o início apoiei o seu nome convicto de que esta era a melhor
possibilidade para enfrentar vícios e
distorções. Lamento o resultado. Creio que a sociedade também vai perceber a oportunidade histórica que deixamos escapar.
De que forma o Sr. acha que esse episódio pode interferir no processo eleitoral para presidente?
Pimenta: Certamente a oposição percebeu que este episódio poderia antecipar o debate de 2006. Não creio que abale a imagem do governo, mas com certeza exigirá do governo capacidade para compreender o que ocorreu, sob pena dos erros serem repetidos. Tenho convicção de que saberemos dar a volta por cima.
Resta ao PT alguma dúvida de que o governo será 'tratorado' na votação da MP que aumenta a tributação sobre serviços?
Pimenta: A MP 232 provocou uma forte reação na sociedade. Mesmo entre nós petistas, há uma forte disposição para no mínimo alterá-la. O adiamento da vigência de alguns artigos por si só revelam a disposição
do governo para construir alternativas menos danosas para a produção, para os
consumidores e para os contribuintes.
A oposição mais o chamado baixo clero conseguiram impor via o Sr. Severino Cavalcanti uma derrota ao governo. Na sua opinião a dificuldade apresentada pela base de apoio ao governo deve influir de que forma na reforma ministerial?
Pimenta: Com certeza este resultado vai refletir na reforma ministerial. Parece-me que alguns ministros que representam bancadas revelaram não ter a liderança anunciada. Por outro lado, quando vários deputados de diferentes partidos repetem as mesmas críticas com relação a alguns ministérios, alguma coisa de fato deve estar errada e precisa ser mudada.
O conservadorismo político do novo presidente pode se refletir nas votações da Casa de alguma maneira?
Pimenta: Realmente a postura conservadora do deputado Severino é preocupante. Ele declara-se orgulhoso contrário a temas atuais como
pesquisas com células tronco e certamente será um empecilho para
avançar a legislação em temas como direitos humanos, ampliação dos espaços de participação de presença das mulheres ou até mesmo temas ligados ao comportamento. Realmente, sua eleição é um atraso e está totalmente fora do perfil de um presidente que a Câmara dos Deputados precisa e que a sociedade brasileira merece.
Alguém será punido por conta do resultado? Como fica a situação de Virgílio depois dessa derrota?
Pimenta: Eu já afirmei que é impossível desconsiderar os prejuízos que a conduta do Virgílio causaram ao PT, ao governo e a nossa bancada. Ele é um parlamentar experiente e certamente não foi por ingenuidade que permitiu que a oposição, aproveitando-se da sua candidatura, viabilizasse um canal de críticas e ataques ao governo. Acho que ele fez uma opção, e certamente não é a de reconciliação conosco.
Severino Cavalcanti prometeu ajudar o RS no ressarcimento das perdas com as
exportações. Como deve se dar esse diálogo com a bancada
gaúcha?
Pimenta: Acho positiva a disposição do Severino. Desde a época em que foi votada a Lei Kandir, todos sabiam que os estados perderiam. O próprio governador Rigotto era deputado e portanto não deve tratar o assunto como se fosse uma surpresa. Quando optou o país por desonerar as exportações, certamente viabilizou competitividade ao setor produtivo mas é lógico que isso levaria a uma redução das receitas para os Estados e municípios. Na época, quando foi discutido o Fundo de Compensação, os valores não previam o crescimento que ocorreu no volume dos negócios para o exterior. Se o Severino quer ajudar na construção de uma solução, ótimo.
O PT mudará o líder da bancada e do governo, devido a essa derrota?
Pimenta: O PT mudará o líder. O PT anualmente elege um novo líder e este resultado não influencia nesta dinâmica previamente estabelecida. Possivelmente amanhã
será eleito o novo líder. Estou apoiando o deputado Paulo Rocha, do
Pará, e espero que o mesmo seja eleito. É um parlamentar experiente, atencioso e corajoso. Certamente qualificará o desempenho da bancada.
Como os deputados petistas gaúchos se comportaram na eleição na Câmara? E os deputados dos demais partidos?
Pimenta: Os petistas gaúchos apoiaram Greenhalgh nos dois turnos. Os demais deputados, optaram por caminhos diversos. E claro que alguns nunca saberemos em quem votou, pois o voto sendo secreto, alguns optam pela ambigüidade, forma antiga e tradicional de tentar ficar de bem com todos.
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