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Vestibular  | 22/04/2014 12h57min

Seleção de textos de Gregório de Matos Guerra cobrada pela UFRGS sintetiza três estilos da obra do poeta

Cuspindo fogo em tudo e em todos, boa parte da sátira é, na verdade, preconceito

Bruno Moraes  |  bruno.moraes@zerohora.com.br

De dois ff se compõe
esta cidade a meu ver:
um furtar, outro f***r

Assim (des)classificou sua cidade natal, Salvador (BA), o poeta Gregório de Matos Guerra, na primeira estrofe de Define a sua Cidade. O poema está na coletânea de 25 textos que será cobrada como leitura obrigatória no vestibular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) em 2015.

> Gregório de Matos foi tema de quatro questões em dois anos na UFRGS
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Os poemas têm, basicamente, três estilos: satírico, religioso e lírico. Segundo o professor de literatura da UFRGS Antônio Marcos Vieira Sanseverino, que estudou a obra de Gregório no mestrado, esses estilos apareceram simultaneamente e não representam fases.

— Após estudar Direito em Portugal, onde foi juiz, Gregório voltou a uma Bahia em decadência, depois da crise da cana-de-açúcar. Muito de sua sátira é, na verdade, preconceito. É preciso ter muito cuidado com o riso, porque nem sempre ele é crítico. Pode ter um lado conservador. A obra dele já foi descrita como um "olhar da Inquisição".

Como não havia imprensa no Brasil do século 17, por proibição de Portugal, Gregório produzia seus textos e os lia na rua. Muitos deles não eram assinados, por isso, boa parte da obra foi atribuída ao poeta posteriormente.

— Era o padre Vieira na igreja e o Gregório na praça — explica Sanseverino.

Camões e o amor

O último poema da lista, Definição do Amor — Romance, tem uma certa relação com o clássico camoniano Amor é fogo que arde sem se ver. Gregório também recorre a imagens contraditórias como "um antídoto que mata","uma liberdade presa" e "uma chaga que deleita", a exemplo de "é um contentamento descontente/é dor que desatina sem doer", nas palavras de Luís de Camões. A diferença crucial está no tom. Os versos do baiano dificilmente renderiam uma balada açucarada ao violão:

E isto é Amor? é um corno.
Isto é Cupido? má peça.
Aconselho que o não comprem
ainda que lhe achem venda.

Boca do Inferno

Implacável e bagaceiro, Gregório foi apelidado de"Boca do Inferno"por criticar figuras da sociedade, como o padre Lourenço Ribeiro (leia o poema Ao Padre Lourenço Ribeiro, Homem Pardo que foi Vigário da Freguesia do Passé). Ele não tinha receio de usar palavrões:

— Por não ser branco, Lourenço não poderia ser padre. Gregório dizia que ele cheirava a mondongo, ou seja, que vinha da senzala. Ele trazia à tona o que julgava serem os pecados capitais da Bahia — diz Sanseverino.

ZERO HORA
Leonardo Azevedo / Arte ZH


Foto:  Leonardo Azevedo  /  Arte ZH


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