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A Educação Precisa de Respostas  | 24/10/2013 05h06min

Cientista estuda o comportamento de voo das moscas-das-frutas

A influência que Michael Dickinson exerce sobre novas pesquisas se estende da neurociência básica à robótica

James Gorman

 

Para Michael Dickinson, nada no mundo é mais maravilhoso que uma mosca-das-frutas

E o motivo não é o fato de que a mosca é um dos mais importantes animais de laboratório na história da biologia, frequentemente usado como um modelo simples da genética ou da neurociência humanas.

— Não se trata de eu achar que eles são um modelo simples de seja lá o que for. As moscas apenas servem como bom modelo para outras moscas — disse ele.

— Esses animais não são como nós. Nós não voamos. Nós não temos olhos compostos. Não acho que processamos as informações sensoriais da mesma forma. Os músculos que elas usam são extremamente mais sofisticados e interessantes do que os músculos que usamos — diz ele, se referindo ao seu sujeito.

— Elas conseguem sentir o sabor das coisas com as asas. Ninguém sabe por que elas têm células gustativas na asa. O corpo delas é coberto de sensores. Ela é um dos organismos mais estudados da história da ciência, e ainda somos praticamente ignorantes quanto a muitas características da sua básica biologia. É como ter um alienígena no laboratório — acrescenta ele, cada vez mais entusiasmado.

— Além disso — continua ele - fazendo uma pausa, parecendo perplexo com o fato de que o mundo não é tão maravilhado quanto ele com a sua criatura favorita -

— Elas voam! —

Se tivesse que definir sua especialidade, Dickinson, de 50 anos, que tem entre seus méritos um prêmio MacArthur de "gênio", se descreveria como neuroetologista. Como tal, ele estuda a base de comportamento do cérebro na Universidade de Washington, em Seattle.

Na prática, ele é uma espécie de polímata que escolheu a mosca-das-frutas, Drosophila melanogaster, e o seu comportamento de voo como objeto de estudos que envolve física, matemática, neurobiologia, visão computacional, fisiologia muscular e outras disciplinas.

— Ele é um cientista altamente original — disse Alexander Borst, diretor de departamento no Instituto Max Planck de Neurobiologia, na Alemanha, que conhece Dickinson há anos. Normalmente, os neurocientistas trabalham ou com o comportamento ou com a física do voo, mas Dickinson, disse ele, "está interessado em ambos". Além disso, acrescentou Borst, "ele cozinha muito bem."

No passado, Dickinson e um orientador solucionaram um antigo problema da física do voo dos insetos, e ele continuou a investigar todos os aspectos do voo das moscas, encaminhando um fluxo constante de estudantes de pós-graduação e pesquisadores de pós-doutorado para as universidades e instituições onde a pesquisa sobre as moscas continua.

A influência que Dickinson exerce sobre novas pesquisas se estende da neurociência básica à robótica, e alguns de seus trabalhos foram financiados pelo Departamento de Defesa, porque as moscas, mesmo sem ter um cérebro grande, demonstram um comportamento bastante complexo. E, claro, elas voam. Pesquisadores da Harvard que construíram um robô voador no início deste ano, por exemplo, se basearam em parte no seu trabalho.

Atração pelas moscas

Michael Dickinson cresceu em Baltimore. Sua família se mudou para perto de Filadélfia, onde ele era, como ele mesmo diz, "o filho da professora" em uma escola preparatória para meninos onde sua mãe ensinava. Tal como acontece com muitos adolescentes, a adolescência não foi o momento mais feliz de sua vida; por isso, ele deixou o ensino médio após o seu primeiro ano.

Deixando o violão para trás, ele seguiu, no entanto, para Nova York. Foi para a Universidade Brown, que começou um ano mais cedo em relação ao previsto, com o plano de seguir carreira como artista. Porém, "após o primeiro semestre, ficou muito claro que aquilo estava sendo um desastre", contou ele.

Foi então que ele se voltou para a ciência. Ele havia feito um curso de neurociência, e começou a pesquisar ao lado de Charles Lent sobre a neurobiologia do comportamento alimentar das sanguessugas. Naqueles anos, aperfeiçoou ainda suas habilidades culinárias durante as férias de verão em restaurantes franceses em Cape May, New Jersey, e Providence, Rhode Island.

Então, enquanto cursava pós-graduação na Universidade de Washington, ele descobriu as moscas. Para a tese, pesquisou sobre o desenvolvimento e a neurobiologia das moscas, mas, contou ele, "fiquei quase que instantaneamente muito mais interessado nas funções da mosca como um todo do que nos problemas mais mecanicistas, mas provavelmente mais bem colocados, de como os pequenos axônios crescem no cérebro".

Depois de um pós-doutorado malfadado, ele começou a trabalhar com Karl Georg Götz, na Universidade de Tübingen, sobre o voo de insetos.

— Nós construímos um modelo muito, muito simples do batimento das asas, para trás e para frente, com 200 litros de água com açúcar — contou Dickinson. O que eles descobriram foi que, quando as asas batem, "elas geram uma estrutura de fluxo chamada de vórtice de ponta."

Usando movimentos lentos de grandes asas em um meio viscoso, eles foram capazes de analisar matematicamente os movimentos rápidos de pequenas asas no ar.

— A técnica é chamada de escalonamento dinâmico — disse Dickinson, e é frequentemente usada na aeronáutica.

Na época, a natureza do voo dos insetos ainda era um quebra-cabeça, base do mito popular de que engenheiros tinham provado que os zangões não voavam.

— Nós conseguimos medir as forças e fazer cálculos simples que mostram que os insetos de fato podem voar — disse ele.

Ele foi profundamente tomado não apenas pelo estudo das moscas, mas pela ideia de trazer uma variedade de disciplinas para tratar de um comportamento complexo.

— O voo é simplesmente um ótimo fenômeno para se estudar. Ele reúne tudo - desde a biologia sensorial mais sofisticada; uma física muito, muito interessante; uma fisiologia muscular bastante interessante; computações neurais bastante interessantes. Todo o processo que mantém uma mosca pairando no espaço ou voando pelo ar se vincula à ecologia e à energética — disse ele.

Então, quando Dickinson deixou Tübingen para assumir seu primeiro cargo como docente de pleno direito, na Universidade de Chicago, "daquele dia em diante, tentei criar um laboratório que funcionasse dessa maneira extremamente integrada", contou ele.

O mundo fantástico do voo

O laboratório de Dickinson na Universidade de Washington é quase que uma mini Disneylândia para os engenheiros, especialmente porque a maioria dos pesquisadores constroem seus próprios aparelhos. O laboratório tira proveito de todas as tecnologias disponíveis, incluindo vídeos de alta velocidade, que Dickinson diz que fazem com o tempo aquilo que o microscópio eletrônico fez com o espaço, e estimulação optogenética dos neurônios do cérebro da mosca.

Nele há microesteiras para as moscas e, em um porão, macrotanques de fluido viscoso para as asas robóticas. O laboratório tem ainda pequenas caixas que abrigam alguns experimentos e câmaras para voos mais longos. Há anos ele trabalha com moscas que são amarradas e envolvidas em uma espécie de teatro de realidade virtual, onde as moscas reagem ao estímulo de vídeos, que mostram, por exemplo, linhas verticais, as quais os animais entendem como alvos durante o voo. Em alguns casos, as moscas podem controlar a exibição, como em um videogame.

O interesse de pesquisa mais recente pesquisa de Dickinson, no entanto, o levará para fora do laboratório. Ele está interessado no comportamento das moscas no meio natural.

— O gênero Drosophila é uma das grandes histórias de sucesso. Há centenas de espécies dentro do gênero. Elas estão em todos os continentes - exceto na Antártida. Estão nas florestas tropicais, nos desertos, evoluíram de modo a demonstrar muitos comportamentos de acasalamento exóticos, e são capazes de voar longas distâncias incrivelmente longas. Elas podem voar por mais de 10 quilômetros sem comer nada — disse ele.

— Uma das nossas observações mais recentes mostra que as espécies da Drosophila são capazes de ler o céu como bússola — continuou ele, "de modo que ela, assim como, a borboleta-monarca, é capaz basicamente de olhar para o céu" e descobrir qual caminho seguir com base na polarização da luz.

Como tem essa capacidade, as espécies de Drosophila não precisam ver o céu inteiro, nem padrões de estrelas.

— Funciona mesmo quando elas enxergam apenas um pequeno pedaço de céu azul. É uma solução que os seres humanos e os vertebrados no geral não encontraram, mas que os insetos encontraram. —

O mundo do laboratório, no entanto, suscita uma série limitada de comportamentos nas moscas. Ele quer ver mais.

— A maioria dos biólogos estuda as moscas neste ambiente extremamente favorável — disse ele. No entanto, estudar algo tão maravilhoso quanto uma mosca-da-fruta no laboratório é "como ter uma BMW e dirigi-la apenas ao redor da quadra."

A diferença, é claro, que a BMW não pode voar.

THE NEW YORK TIMES NEWS SERVICE
Zach Wise / NYTNS

Para Michael Dickinson, nada no mundo é mais maravilhoso que uma mosca-das-frutas
Foto:  Zach Wise  /  NYTNS


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