Evasão | 19/09/2012 10h13min
O início de 2012 foi complicado para Ruan Carlos Nascimento, de 16 anos. Ele começou a estudar na 2º ano do ensino médio da Escola Estadual Gertrudes Benta Costa, no bairro Petrópolis, em Joinville, e arranjou um emprego como operador de fotocopiadora em uma gráfica da cidade. Trabalhava das 7 horas ao meio-dia.
Na hora de ir para a escola, à tarde, não tinha vontade. A mudança de rotina o fez abandonar os estudos.
— Não sei explicar exatamente o porquê de não ir para a escola. Queria dormir, ficar em casa — contou o jovem.
Com o empenho da equipe pedagógica da escola, que procurou conversar com o aluno e com os pais, Ruan voltou a estudar. E, mesmo com faltas, conseguiu se recuperar. Para a diretora da Gertrudes, Roseti de Oliveira, convencer o aluno a voltar para a sala de aula é motivo de comemoração.
— A transferência de escola pode ser mesmo difícil para muitos adolescentes. Eles ainda não possuem amigos e podem se sentir desmotivados. Mas o trabalho ainda é o principal motivo, pelo menos para nós, do abandono escolar — explicou.
A falta de interesse e de perspectiva para o futuro também pesa na hora de abandonar os estudos. No caso de Ruan, a diretora conta, orgulhosa, que o estudante continua o trabalho na gráfica e, ao mesmo tempo, consegue manter boas notas.
— Fiquei muito feliz quando ouvi um professor elogiar as notas dele em uma reunião. É uma prova de que fizemos o certo — observa.
A Gertrudes Benta Costa é uma das escolas que apresentam os menores índices de abandono escolar no ensino médio de Joinville. De acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o colégio não contabilizou nenhuma desistência em 2011.
Mas a diretora confirma que há casos de abandono, registrados neste ano, sendo avaliados. Inclusive no ensino fundamental. Quando a equipe não consegue nem convencer os pais dos alunos do ensino fundamental de que a educação é o melhor caminho, o caso é encaminhado ao Conselho Tutelar.
— Há três casos nas séries iniciais que o conselho está acompanhando — contou a diretora.
Para evitar que o abandono seja a direção escolhida pelos alunos, a equipe de professores da Gertrudes é orientada a ficar de olhos abertos. A primeira análise acontece dentro da sala de aula. Quando um aluno falta em mais de três dias, os pais são procurados por telefone.
— Não é o papel da escola procurar o aluno. Mas temos que fazer isso, porque tem muita gente que só tem a escola — argumentou a diretora.
Para comprovar a falta, se o aluno não possui atestado médico, o responsável precisa ir pessoalmente até a escola explicar os motivos. Dependendo do que é dito, a equipe orienta o que é melhor para criança ou adolescente.
— Acho que este contato e as orientações que fazemos no início de ano, falando da importância e das consequências de não ir à escola, têm colaborado com os números positivos — avaliou Roseti.
Equilíbrio entre trabalho e estudo
Murilo Renan Tavares, 15 anos, compete por Joinville na natação e tem uma rotina diária de treinos. Emanoelle Darassi, 16, trabalha em uma loja de decoração. Láysa Antônia Martim, 15, é jovem aprendiz e trabalha em uma creche.
Durante o dia, eles não param. Do trabalho, vão para os estudos na Escola Estadual Tufi Dippe, no bairro Iririú. E não se cansam. Eles sabem o que querem para o futuro e fazem de tudo, tudo mesmo, para equilibrar boas notas e um dinheirinho no bolso.
— Uso o salário para comprar coisas para mim. Mas consigo dar conta de tudo. Eu quis trabalhar e meus pais apoiaram. Mas, para continuar, preciso ter boas notas — conta Emanoelle.
Murilo ainda viaja para competições e fica fora alguns dias da escola. Mas se as notas começarem a baixar, sabe que terá que abandonar seu esporte favorito. Por isso se empenha.
— Temos bons exemplos na escola. A maioria dos adolescentes trabalha para conquistar o seu dinheiro, para comprar um tênis bacana, uma roupa legal. Alguns ainda ajudam a família, mas a maioria quer contar com uma renda própria — revelou a diretora, Emma Zenei Dal-Ry Cavalheiro.
No entanto, é por causa deste dinheirinho que os adolescentes do ensino médio têm deixado a escola. Para se ter uma ideia, o período noturno na Tufi Dippe conta com 148 alunos à noite, destes 135 trabalham. Em uma média de três anos, dos 450 alunos que entraram na escola, 217 abandonaram os estudos.
Quase 50%. Foi preciso apoio da Gerência Regional de Educação e do governo federal para diminuir o cenário de abandono. Programas de ensino profissionalizante como o Pronatec e o Mais Educação, que oportuniza aos alunos aulas extras de língua portuguesa, matemática e atividades extraclasse diversas, têm colaborado.
Ainda neste ano, a Tufi Dippe implantou, a partir do 1º ano do ensino médio, o chamado ensino inovador. As aulas são realizadas o dia inteiro, três vezes por semana, com disciplinas diferenciadas.
— Com a boa vontade de todos, dá para fazer a diferença — acredita a diretora.
A página, na Tufi Dippe, começa a ser virada.
O que fazer para diminuir a evasão
Sabe quando os especialistas afirmam que a escola precisa ser um ambiente acolhedor? Que o aluno precisa entender a importância da educação e se sentir à vontade na sala de aula?
Eles falam isso porque é a mais pura verdade. Não há como evitar a evasão escolar e, consequentemente, a distorção de séries/idades se os adolescentes não se sentirem recompensados com os estudos.
Joinville ainda registra um índice satisfatório na área – abaixo das médias brasileira e catarinense. Em 2011, o Inep registrou 8% de abandono somente nas escolas públicas da cidade.
O recorde – a menor taxa de abandono – foi registrada no ano de 2009, quando apenas 6,3% de crianças da rede pública abandonaram os estudos durante o ano. No entanto, não existe uma fórmula secreta para evitar a evasão. Para a professora da Univille e mestre em educação Rosânia Campos, este é o grande dilema da educação em Joinville e no Brasil. Para ela, hoje é preciso repensar o ensino médio.
— Avançamos bastante no ensino fundamental, principalmente nos anos iniciais. Neste momento, o ensino médio é o grande desafio. O Brasil carece de políticas públicas para juventude, e as duas coisas estão interligadas. Avançamos na infância e houve um vácuo nas políticas para a juventude — analisou a professora.
— É importante ter projetos para os jovens, pensar num currículo inovador. Mas na minha opinião, se isto não for articulado com a valorização do professor, não vamos conseguir — complementou Rosânia.
Para motivar os adolescentes, a professora e coordenadora do curso de pedagogia da Univille, Sonia Regina Pereira, acredita que o ensino integral e inovador pode ser uma boa solução.
— Mas existem programas do governo federal que oferecem bolsas para alunos. Deveríamos ampliar este número de bolsas. Até porque eles querem o seu dinheirinho — observou Sonia.
Ruan Carlos Nascimento abandonou a escola depois que começou a trabalhar
Foto:
Diorgenes Pandini
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