| 01/02/2011 12h05min
Dois bonecos enforcados, com uma estrela de Davi pintada na gravata e muitos dólares saindo dos bolsos, representam o presidente egípcio Hosni Mubarak e podem ser vistos pendurados nos sinais de trânsito da praça Tahrir e dão o tom da 'Marcha do Milhão' que a população egípcia realiza nesta terça-feira contra o regime no poder.
— Este vai ser um grande dia, o dia da liberdade — exclama Ahmed En Nahas, um diretor de cinema de 60 anos, que gesticula para mostra as milhares de pessoas agrupadas na praça Tahrir ("Libertação", em árabe), reduto dos manifestantes há semanas.
— Até há pouco tempo estas pessoas não teriam saído de maneira tão maciça por medo que a polícia disparasse contra ela — acrescentou, mostrando a pequena filmadora com que pretende registrar as manifestações do dia.
Perto da ponte sobre o Nilo, Qasr An Nil, uma maré humana aflui sem parar desde as primeiras horas do dia, respondendo ao chamado dos opositores para que um milhão de pessoas se reúnam em Tahrir e apliquem um golpe decisivo ao poder de Mubarak, que dirige o país há 30 anos com mão de ferro.
O ambiente é mais tenso do que nos dias anteriores, apesar da presença de várias famílias. Uma menina de cinco anos se diverte enquanto seu pai dança com ela nos ombros, ao ritmo do slogan entoado pela multidão: 'O povo quer que Mubarak saia'.
Apesar de o acesso à internet estar proibido desde sexta-feira passada, as novas tecnologia estão muito presentes em Tahrir, onde inúmeros manifestantes enviam mensagens, tiram fotos e filmam a movimentação. Um jovem abaixa as calças diante da imprensa ocidental para mostrar as marcas do impacto da bala de borracha que recebeu em um dos protestos. Perto, um grupo de homens barbudos exibe um cartaz onde afirmam estar 'dispostos a morrer pelo Egito'.
— Mubarak demonstra que está desconectado da realidade. Não queremos diálogo, e sim que Mubarak saia — explica Omar, um jovem que exibe um cartaz dirigido ao presidente Barack Obama e à chefe da diplomacia europeia, Catherine Ashton.
Na praça, todos os egípcios parecem reunidos, sejam laicos, muçulmanos ou cristãos.
— Jesus nos dará uma vida melhor. Vai embora, Hosni, para que nos desfrutemos dela — afirma o cartaz de Nader e Ihab, dois jovens.
Antes de entrar na praça, os manifestantes tiveram de se submeter a controles de identidade por parte dos militares que vigiam os acessos a Tahrir. As Forças Armadas continuam com uma boa imagem entre os manifestantes. Quando um ônibus cheio de soldados tenta abrir passagem a buzinadas, a multidão ao invés de reclamar, grita e aplaude: 'O povo e o Exército são o mesmo braço'.
>>>Confira a cronologia dos incidentes:
De 17 a 20 de janeiro:
Um homem de 50 anos toca fogo em si mesmo em frente ao Parlamento, no Cairo, numa possível reprodução do suicídio de um jovem tunisiano em meados de dezembro que desencadeou a revolta e subsequente derrubada do presidente Zine El Abidine Ben Ali. Nos dias seguintes, mais três egípcios fazem o mesmo — um deles, de 25 anos, não resiste aos ferimentos e morre.
Foto: Martin Bureau, AFP
Dia 25:
Insuflados pelo líder da oposição, Mohamed ElBaradei, milhares de pessoas tomam as ruas do Egito pedindo a renúncia do presidente do país, Hosni Mubarak. Nos confrontos com a polícia, dois manifestantes morrem em Suez e um policial é morto no Cairo.
Dia 26:
As manifestações se espalham dos grandes centros para cidades menores, aumentando em número e violência. No Cairo, um policial e um manifestante são mortos, enquanto em Suez 55 protestantes e 15 homens da força anti-motim são feridos.
Dia 27:
Diante do saldo violento, com mais um jovem morto em Sinai, a Casa Branca cobra providências do governo do Cairo para evitar os embates, enquanto a União Européia chama atenção para o direito de protestas da população.
Dia 28:
O saldo da violência chega a 13 mortos, centenas de feridos e quase mil presos. Os protestos aumentam e manifestantes tocam fogo no prédio do governo em Alexandria e na sede do Partido Democrático Nacional. Os serviços de internet são derrubados e ElBaradei diz que está pronto para liderar a transição, enquanto Mubarak impõe toque de recolher e promete reformas.
Foto: Reprodução, Egyptian TV
Dia 29:
O presidente egípcio, Hosni Mubarak, designou um vice-presidente, o chefe da inteligência Omar Suleiman, pela primeira vez em 30 anos, e um novo primeiro-ministro, ambos com cargo de general, para tentar sufocar a rebelião já deixa mais de 90 mortos.
Dia 30:
O presidente egípcio, Hosni Mubarak, visitou um centro de operações do exército e ordenou que o toque de recolher no Cairo, Alexandria e Suez seja ampliado em uma hora. O toque de recolher, instaurado na sexta-feira devido aos protestos da população para exigir a renúncia de Mubarak, foi gradualmente ampliado, mas não é respeitado pela população. Neste domingo, as autoridades egípcias ordenaram à polícia antimotins que volte a atuar em todo o país, depois de dois dias nos quais esteve virtualmente ausente, quando ocorreram diversos saques enquanto o exército lidava com uma revolta popular.
Dia 31:
No início do sétimo dia de protestos que exigem a renúncia do presidente Hosni Mubarak, o movimento contra o regime convocou uma greve geral por tempo indeterminado e uma passeata de um milhão de pessoas para a terça-feira. Durante a manhã, a emissora estatal egípcia anunciou a formação de um novo governo no país, substituindo o governo dissolvido na sexta-feira. Na mudança mais significativa, o criticado ministro do Interior - responsável pelas forças de segurança - foi substituído.O exército anunciou que não usará a força contra as dezenas de milhares de pessoas que se mobilizam no país para pedir a saída do presidente e declarou que considera as demandas do povo "legítimas". O último provedor de internet egípcio ainda em funcionamento, o Grupo Noor, caiu nesta segunda-feira, deixando o país sem acesso à rede.
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