Gente | 17/02/2011 10h21min
Isolados em uma ilhota, cuja paisagem é dominada por um fiorde castigado pelos ventos, Ramón e Oretia sobrevivem da pesca artesanal de caranguejos nos canais da Patagônia. Uma vida dura, com condições do século 19 em pleno século 21.
A tripulação da escuna oceanográfica francesa Tara, que faz a expedição "Tara-Oceans", dedicada ao estudo da biodiversidade oceânica, soube da existência do casal ao ancorar na Baía das Lagoas, ao sul da ilha chilena de Chiloé, no centro-sul do país.
Após uns 10 dias de navegação sem ver viva alma no labirinto de canais do extremo sul do continente americano, os marinheiros e os cientistas da embarcação se surpreenderam ao vislumbrar, no litoral de vegetação densa, uma coluna de fumaça que saía de uma espécie de refúgio.
Logo, viram o que parecia ser uma jangada e um pequeno barco de pesca de madeira sobre a areia salpicada de restos de cascos de caranguejo, mexilhões e conchas marinhas.
As embarcações são as preciosas ferramentas de trabalho do casal, que se aproxima para receber os visitantes. Oretia, uma mulher robusta de 37 anos, veste um velho impermeável e um gorro de marinheiro, e Ramón, de 42, tem um olhar desconfiado. Os dois perderam os dentes e estão com as gengivas inflamadas.
- Sinal de escorbuto por falta de vitamina C - diagnosticou Thierry Mansir, o médico a bordo.
O casal consome muito raramente frutas e vegetais e não os cultivam, dedicando-se exclusivamente à pesca, assim como as gerações que os antecederam.
Quando os tripulantes demonstram interesse em comprar os caranguejos, Oretia propõe o escambo: os crustáceos em troca de farinha, arroz, óleo, açúcar, carne. De qualquer forma, não teria como usar o dinheiro.
A casa do casal, que consiste de algumas paredes de placas de metal, cobertas por um toldo de plástico, não tem água, gás, nem eletricidade, só um rústico fogão a lenha para cozinhar e que serve de lareira. Algumas lâmpadas a óleo iluminam o interior sem janelas e em meio à penumbra.
- Somos muito pobres - repete Ramón - Nasci nessa ilha. Meu pai foi pescador. Uma vida miserável, como eu e minha mulher. Não temos dinheiro para melhorá-la.
Eles não têm nenhum meio de comunicação para pedir socorro em caso de acidente ou doença, e o médico mais próximo fica a nove horas de remo. No entanto, no meio da noite, a luz frágil e amarelada de sua casa parece dizer aos viajantes: aqui há vida.
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