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 | 09/12/2005 17h00min

Cepea afirma que aftosa provoca perdas a pecuaristas de todo Brasil

Focos em MS expuseram país perante comunidade internacional

A febre aftosa tem mostrado que o Brasil se consolidou como um grande fornecedor de carne para o mundo, criando dependência dos consumidores em relação ao nosso produto. O mundo vive uma grande crise em termos de proteínas animais. A gripe aviária que chegou à Europa e derrubou o consumo de carne de frango nos países da Comunidade e fez com que os casos de aftosa no Brasil repercutissem de uma maneira muito distinta de outras épocas. Isso, contudo, não significa que os erros foram diminuídos nem que estamos perdoados.

Os focos de febre aftosa expuseram o país a comunidade internacional no que tange à fragilidade do controle da doença e dos riscos que isso acarreta. Os investimentos em pecuária devem passar por um novo período de avaliação, tanto na produção dentro da porteira quanto fora.

O produtor rural está realmente pagando caro pela aftosa. Antes do anuncio do foco, o mercado futuro negociava a arroba de boi para novembro a R$ 63,90 e para dezembro, a R$ 63,50 - nos dias 6 e 7 de outubro, a BM&F atuou no seu limite de alta. No final de novembro, o mercado em SP opera em torno de R$ 54,00, com grande volatilidade de preços. O que isto significa? Por que isto está ocorrendo?

O primeiro motivo é o embargo às exportações de São Paulo para vários mercados. Ocorre que os preços de SP sempre estiveram integrados a um sistema maior, que pode ser chamado de Centro-Sul, composto por MS, MT, GO, MG e PR, que também está cada dia mais ligado ao Norte – PA e RO. O Brasil pecuário funciona como um gigantesco mercado comum de carne, cujo principal cliente é o consumidor paulista e o segundo, o carioca; depois é que vem o mercado externo.

Os preços se formam de acordo com os choques de oferta e demanda entre as regiões. Isto significa que o aumento da oferta em determinada região devida à seca, por exemplo, em poucos dias é transmitido a outras regiões e o mercado como um todo encontra um novo ponto de equilíbrio. Em outro momento, caso a economia passe a crescer mais rapidamente, ocorre um aumento de demanda, que é transmitido para os preços da carne e logo os pecuaristas conseguem negociar melhor seus animais.

Os movimentos de preços têm velocidades muito distintas, dependem de uma gama de fatores, como a estratégias das empresas, o poder de mercado, a tecnologia de produção, etc. Os analistas econômicos procuram essa lógica, pois sabem que a antecipação pode gerar ganhos.

O evento da febre aftosa gerou uma diferenciação de mercado. O boi de Goiás, por exemplo, e o de São Paulo “deixaram ser o mesmo produto”. O boi goiano pode virar um bife no prato do alemão, e o boi paulista não. No primeiro momento, o boi sul-mato-grossense somente podia virar bife do povo sul-mato-grossense. Isso modificou a primeira regra da lógica econômica, que previa a diferença de preços entre o boi goiano e o paulista com base nos custos de transferência até o consumidor.

Em outubro de 2004, os preços em Goiânia foram 7,9% inferiores aos do mercado paulista; já em novembro deste ano, a diferença caiu para 2,124%, ou seja, o boi em Goiás agregou 5,80% frente a SP por conta da aftosa. O mesmo ocorreu no Triângulo Mineiro, Cuiabá, Colider e Rio Verde/GO, com reduções entre 2% e 6% dos diferenciais.

O sentido inverso ocorreu em MS. Os diferencias subiram cerca de 10%, ou seja, a diferença de Campo Grande com a média SP que em outubro de 2004 era de 1,85% passou para 12,08% em novembro deste ano; em Dourados e Três Lagoas, o efeito foi menor, em torno de 7%. O alento para o MS veio com a abertura da fronteira paulista, em meados de novembro.

Um outro fato que chama a atenção é o reduzido impacto verificado sobre os preços dos animais da região Norte. Isso pode ser explicado pela pouca influência da carne dessa região nas exportações. Essa constatação é um importante álibi para responder aos constantes ataques dos europeus que tentam relacionar desmatamento e produção de carne.

O ponto mais importante de todas essas relações é que o reaparecimento da febre aftosa causou grandes perdas para os produtores. Mesmo nas regiões onde a doença não chegou - GO, MT e MG, em especial -, os preços hoje são menores que os esperados antes da crise.

O próximo grande problema da pecuária só virá à tona depois da crise. Os custos ainda acumulam altas maiores que os preços, o que desestimula o produtor, principalmente depois deste problema sanitário, pois a confiança na atividade ficou arranhada. Os investimentos das empresas frigoríficas também devem incorrer em taxas de juros mais altas, pois os riscos do segmento ainda são muito alto. No mercado externo o Brasil vai continuar sendo o maior fornecedor por falta de opção, mas nossa grande chance de ocupar os espaços deixados pela gripe foi perdida.

Depois de nove meses consecutivos de baixa, o preço da arroba do boi gordo na média Brasil voltou a subir em outubro. O impacto da aftosa, contudo, impediu a tão esperada recuperação para este mês de entressafra, pelo menos na intensidade necessária para compensar as sucessivas retrações anteriores.

A partir da notícia de focos no MS, as cotações caíram fortemente em algumas praças e noutras, como nas de Goiás, Minas Gerais e Mato Grosso, se mantiveram mais ou menos estáveis, mas também encerrando o mês abaixo do patamar alcançado até o dia 10 daquele mês. Em resumo, produtor de nenhum Estado ganhou com a aftosa.

O Mato Grosso do Sul, certamente, foi o mais prejudicado, seguido pelo Paraná, que teve suas fronteiras fechadas e suas negociações interrompidas por vários dias pela suspeita de que também tivesse animais doentes. Até a divulgação da doença, a falta de boi vinha ficando tão evidente no mercado brasileiro que a recuperação obtida pelos sul-mato-grossenses, por exemplo, nos 10 primeiras dias de outubro proporcionaram que a média deste mês ainda ficasse 2,88% superior à de setembro, mesmo com a interrupção dos negócios por vários dias nas praças do MS.

Ao se comparar a média de outubro com a de setembro, constata-se valorização nos nove Estados da pesquisa, com aumento médio de 9,5%. Os maiores reajustes ocorreram em Goiás (14,67%), Minas Gerais (14,39%), São Paulo (13,3%) e Mato Grosso (12%). Essas altas, porém, não são suficientes para recuperar as perdas acumuladas no ano, em nenhum Estado.

No Mato Grosso é onde a arroba do boi está mais próxima da média nominal de dezembro do ano passado – base para os cálculos de acumulado no ano. Neste Estado, a desvalorização acumulada é de apenas 1,68%. Já Mato Grosso do Sul ainda carrega 13% de desvalorização, seguido pelo Rio Grande do Sul, com 11,5%.

É preciso destacar ainda que a valorização do boi em outubro é tradicional, mas favorece apenas uma pequena parte dos produtores, uma vez que a maioria mantém o rebanho a pasto durante o ano todo. O motivo tanto das altas quanto da “exclusão” de muitos pecuaristas, portanto, é exatamente o mesmo: poucos têm o que ofertar, sobem as cotações, mas o que negociar?

Quanto aos Custos Operacionais Efetivos e Totais (COE e COT), o único Estado onde houve recuos de setembro para outubro foi o Paraná – os custos efetivos caíram 1,18% e os totais, 0,57%. Os principais insumos que contribuíram para essa retração nesse Estado foi a queda do preço do bezerro, dos adubos em geral, dos insumos para construção/manutenção de cercas e também da suplementação mineral. Esse Estado é o que apresenta também o menor aumento de custos neste ano.

A pior situação, no mês de outubro, foi de Goiás, com aumento de 1,53% no COE e de 1,69% no COT. Apesar disso, este não é o estado que acumula a maior variação no ano. Esse lugar continua ocupado por Rondônia, que nos 10 meses do ano fechou com uma valorização de 9,1% no COE e de 17,44% no COT. Em outubro, os insumos que mais pesaram no bolso do produtor rondoniense foram as sementes forrageiras, as máquinas e implementos agrícolas, o diesel e a suplementação mineral. Os reajustes nesses insumos foram nas seguintes proporções: 13%, 7,8%, 2,5% e 1,7%, respectivamente.

De abril a setembro, os custos da pecuária, ainda que com elevação controlada, estiveram na contramão do comportamento geral dos preços da economia. O IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado), importante índice de inflação, teve ligeiros recuos de abril a setembro, com aumento somente em outubro. Nos dez meses, o IGP-M acumula alta de 0,79%; os custos pecuários por sua vez, 5,59% e 6,19% - COE e COT. Este comparativo é importante por dois motivos: o IGP-M é muito sensível a variações do câmbio e, em sua composição, atribui um elevado peso para o atacado.

O insumo envolvido na produção de carne que mais aumentou neste ano são as sementes forrageiras: 19,2%, que representam apenas 1,64% nos custos totais. Isso sinaliza investimentos do setor, mesmo diante da crise de preços. Só nos últimos quatro meses (segundo semestre), a variação acumulada é de 17,37%. No mês de outubro, o produtor de São Paulo pagou 13,21% a mais que em setembro pelas sementes, o de Rondônia, 13%, o mineiro, 5,4% e o goiano desembolsou 2,65% a mais para a mesma compra. O mercado das forrageiras esta bem mais aquecido neste ano quando comparado a 2004, que nos mesmos 10 meses acumularam uma valorização de apenas 0,55%.

Apesar dessas altas, a formação/manutenção/reforma de pastagens foi favorecida pelo recuo acumulado de 6,4% dos fertilizantes em geral neste ano e de 1,45% do calcário. No mesmo período do ano passado, os adubos acumulavam valorização de 20,54% e o calcário, de 6,44%. A demanda especialmente por fertilizantes reduziu drasticamente neste ano. Com os apertos das margens das atividades agrícolas e a crença na fertilidade acumulada no solo, muitos produtores arriscaram para safra 2005/06 e preferiram conter os investimentos em adubação.

Na média dos nove Estados, o insumo que mais contribuiu para amenizar os custos do pecuarista de engorda em outubro foi o bezerro, que ficou quase 1% mais barato. As maiores quedas ocorreram no Paraná e no Mato Grosso: 6,38% e 5,13% respectivamente.

Os insumos para construção/manutenção de cercas que, em 2004 aumentaram durante o ano todo, tem apresentado deflação em vários meses. Enquanto que no acumulado dos primeiros dez meses do ano passado esses insumos foram destaque pelo aumento de 21,03%, neste ano o acumulado não chega a 4,5%.

Um mês antes de iniciar a terceira campanha de vacinação nos principais Estados produtores de carne bovina, a cesta de medicamentos não apresentou expressivos reajustes. Casas agropecuárias do Centro-Oeste não tiveram muito movimento durante o mês de outubro. Os pecuaristas desestimulados com a notícia dos focos de febre aftosa diminuíram de imediato os investimentos. Mesmo as vacinas, que costumam aumentar um pouco nesses períodos, se mantiveram estáveis, com elevação de apenas 0,29% frente a setembro, na média dos nove Estados; no ano, acumulam redução de 0,44% dos preços.

O diesel, pelo terceiro mês consecutivo, apresentou reajustes positivos nos seus preços, ainda que pequeno: 0,53%. Apenas no segundo semestre de 2005, o acumulado chega a 6,91%. O descasamento entre os preços dos insumos e do boi continuam a existir. Os insumos parecem passar ao largo dos problemas enfrentados pelos produtores.

CEPEA/CNA
 
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