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 | 04/08/2009 19h47min

Oferta de crédito oficial tem aumento de 37% nesta safra

Produtores se perguntam se todo esse dinheiro vai chegar ao campo

Atualizada em 07/08/2009 às 15h54min Melina Fernandes | Brasília (DF)

O custeio das lavouras de soja consumiu mais de 15% do crédito liberado pelo Banco do Brasil na última safra. Foram R$ 4,703 bilhões. O governo federal anunciou um plano agrícola e pecuário no valor de R$ 107,5 bilhões para o ano agrícola 2009/2010. O aumento no volume de recursos foi de 37%. Porém, há muito tempo, a dúvida dos agricultores é a mesma: será que todo esse dinheiro vai chegar ao campo?

Na lista das principais preocupações do agricultor brasileiro, o crédito está em primeiro lugar. Mas algumas notícias tem ajudado a tranquilizar os sojicultores. Além do crédito oficial que será maior na safra 2009/2010 , as  tradings têm dado sinais de que, se ocorrer, a redução no financiamento não vai ser tão grande.

Em uma propriedade em Cambé, no norte do Paraná, o produtor Odair Favali cultivava, até a safra passada, mil hectares de soja. Este ano, ele vai reduzir a área para 900 hectares. O restante vai ficar sem plantio por falta de dinheiro. Ele ainda nem procurou o banco para pedir financiamento.

— A gente está desacreditado, nem tem vontade de ir para os bancos procurar crédito oficial. Se é para chegar em um banco e ser mal atendido, o cara olhar a gente como bandido e não como produtor, não dá coragem de ir — diz o produtor de soja Odair Favali.

Odair é um dos 93 mil produtores rurais que tiveram a classificação de risco reduzida e, segundo o Banco do Brasil, vão ter acesso ao dinheiro para plantar a próxima safra.

— O BB, na safra 08/09, colocou á disposição dos produtores 30% mais que na safra anterior e todos esses recursos foram utilizados pelos produtores, então o BB conseguiu colocar todo dinheiro previsto para financiar a safra que acabamos de concluir. Na próxima safra, prevemos crescer mais 30%, pretendemos passar  de R$ 30,5 bilhões para R$ 39,5 bilhões. A nossa expectativa e os primeiros dias dessa safra 09/10 confirmam que os produtores terão acesso à totalidade desses recursos — expõe o vice-presidente de agronegócio do Banco do Brasil, Luís Guedes Pinto.

A estimativa do Banco do Brasil é de que R$ 6,1 bilhões sejam destinados ao custeio das lavouras de soja e, se for preciso mais, a instituição garante que não vai faltar dinheiro. Além do aumento no volume de recursos, o plano agrícola e pecuário foi lançado 10 dias mais cedo este ano e, antes do anúncio, os bancos já sabiam as regras para a concessão dos financiamentos.

Para o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, essas medidas dão condições para que a próxima safra agrícola seja melhor do que as anteriores.

— Eu acho que está adequado, desde que efetivamente chegue à ponta. É isso que a gente espera que aconteça. A própria taxa de juros também está adequada. À medida que a gente aumentou a disponibilidade para juros a 6,75% e também aumentou para agricultor chamado médio, que aí tem taxa de juro a 6,25%. Então, se nós temos disponibilidade maior em quantidade, a questão nem chega a ser o juro, e sim que essa quantidade chegue até a mão dele, na hora exata — declara Stephanes.

É essa a preocupação que há muitos anos tira o sono dos agricultores. Para os representantes do setor, não basta aumentar o volume de recursos e baixar os juros, é preciso facilitar o acesso ao dinheiro.

— Nós tivemos uma redução na liberação de crédito de quase 6%. Então, se em um ano de não crise, nós tivemos uma liberação de quase R$ 60 milhões, e agora num ano de crise nós estamos com 6% a menos em execução, isso significa que está havendo burocracia e dificuldade de acesso ao crédito pelos produtores rurais — explica a presidente da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), senadora Kátia Abreu.

Para o consultor em agronegócio André Pessoa, outro problema é valor máximo liberado por agricultor.

— O financiamento público com o esforço do governo vai permitir financiamento mais fácil nas regiões Sul e Sudeste do Brasil, que é onde o limite estabelecido no crédito rural por agricultor é suficiente para cobrir boa parte do orçamento porque as propriedades são pequenas . Então, o crédito rural cobre 50,60%  do custo. No Centro-oeste, as propriedades são maiores e esse limite por CPF acaba significando que o crédito oficial cobre apenas uma parcela muito pequena do orçamento dos produtores, quando muito cobre o diesel — analisa o especialista.

Diante de tantos limites, dificuldades e incertezas, produtores como o paranaense Odair Favali acabam desistindo do crédito oficial e buscam recursos em empresas privadas. Só que nem sempre vale à pena.

— Tenho buscado nas cooperativas e na iniciativa privada, nas revendas de insumos. É muito pior do que o oficial, porque o juro é caro, é juro de iniciativa privada, a gente diminuiu a nossa rentabilidade e aumenta o nosso custo — finaliza Favali.

A notícia de que o crédito oficial será maior não serviu de consolo para Ricardo Tomczyk, produtor de soja do Centro-oeste.

— Crédito oficial é algo muito raro já há alguns anos aqui para o produtor do MT, algo que a cada ano é mais distante da realidade — diz Tomczyc.

O dinheiro do governo não chega ao produtor por causa das constantes renegociações. Frente a isso, o crédito privado pode ser uma solução.

— As empresas se programaram, já contando com esta dificuldade de acesso, existe uma disponibilidade de crédito aí nas tradings, porém com uma maior rigorosidade na aprovação dos limites, na maior exigência de garantias e o que é pior, um maior custo financeiro — acrescenta o produtor de soja.

Os juros cobrados pelas tradings para emprestar ao agricultor são quase o dobro que os do governo. Dinheiro mais caro, mas na mesma quantidade. Pelo menos é o que as empresas prevêem para este ano.

A Bunge Alimentos garantiu que vai manter a quantidade de financiamentos nesta safra por meio de compras antecipadas. Segundo a empresa, na última safra foram disponibilizados US$ 700 milhões a mais em recursos do que na média dos três anos anteriores. A Louis Dreyfus Commodities também não detalhou a quantia, mas informou que não vai reduzir os financiamentos. A Cargill deve disponibilizar entre US$ 500 e US$ 550 milhões para operações de financiamento aos produtores na safra 2009/10, US$ 100 milhões a mais que na última safra e mais que o dobro do ciclo 2007/08. A Syngenta estima liberar recursos 15% maiores para o custeio agrícola este ano.

Um estudo da Agroconsult, que tomou como base o Mato Grosso, principal produtor de soja do Brasil, aponta que entre 2007 e 2008, as tradings financiaram 52% da safra agrícola. No último ano, a participação foi reduzida para 25%. Com problemas financeiros trazidos pela crise global, algumas empresas que tinham participação importante deixaram de atuar. Porém, para os analistas, a quantidade de crédito disponível não é um fator limitante.

— Todo mundo tem seu limite de crédito como os bancos também têm. E ele tinha sido atingido no ano passado e as tradings não podiam realmente desembolsar mais um tostão.  Foi um ponto de acumulação muito grande e agora está pouco a pouco se saneando e as tradings estão voltando para os seus níveis plenos e os outros bancos estão financiando um pouco mais, inclusive, os menores — explica o presidente da Abiove, Carlo Lovatelli.

— É importante a gente lembrar que o custo de produção caiu. Caiu o custo de fertilizantes, caiu o custo de defensivos, está caindo um pouquinho o custo de óleo diesel, não subiu tanto a mão de obra, então o custo da lavoura esse ano é um pouco menor do que o ano passado. Se as tradings vão disponibilizar a mesma quantidade de crédito, ela cobre uma área um pouquinho maior — completa o diretor da Agroconsult André Pessoa.

A questão é que custear a safra não depende só do volume de crédito.
— Não quer dizer que o volume de crédito no país esteja caindo. Não está mais caindo como no final do ano passado, então você já tem um processo de recuperação, mas ele está procurando aqueles lugares mais seguros. E a agricultura não está podendo se apresentar como um lugar tão seguro porque existe um acumulado de dívidas de 2005 para cá que estão sem solução — diz o economista Guilherme Dias.

Pagar as dívidas é primordial para conseguir novos empréstimos, diz o diretor de agronegócios da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Ademiro Vian. Ainda assim, a entidade estima que as instituições vão aplicar a mesma quantidade ou um pouco menos de recursos na próxima safra.

— O cliente às vezes imagina que o banco pode aplicar no cliente que ele desejar. Não é verdade, nós temos que aplicar no tamanho dos clientes que o governo define, e no tamanho das operações que o governo define e nos produtos que o governo define e na taxa de juros que o governo define, com as garantias que o governo define. Então, o crédito rural hoje é 100% engessado — defende Vian.

Para o economista Guilherme Dias, essa vai ser a safra da chamada classe média agrícola.

— Não mais do que 20% dos tomadores de crédito normal que estão de fato numa situação de endividamento complicada, mas este outro pedaço importante, essa classe média agrícola que evitou se endividar muito nesses últimos anos, ela pode ainda expandir, quer dizer, ainda existe uma forma de compensar um pouco os outros — conclui Dias.

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