| 26/03/2008 10h54min
Passados pouco mais de três meses desde que chegou ao poder, a presidente da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner, enfrenta grave crise gerada pelo conflito no campo, que se estendeu às cidades, onde milhares de pessoas promoveram o primeiro "panelaço" em massa contra o governo. Poucas horas depois de Cristina ter anunciado sua decisão de se manter firme e não negociar com os produtores rurais, em greve há duas semanas, a população foi às ruas das principais cidades do país para protestar contra a presidente.
Batendo panelas e frigideiras, os argentinos bloquearam o tráfego no centro de Buenos Aires e marcharam pela capital gritando palavras de ordem contra Cristina, dando início ao primeiro "panelaço" enfrentado pela governante. A mobilização chegou à Praça de Maio, onde milhares de pessoas se concentraram por horas, e à frente da residência presidencial da Quinta das Oliveiras, nos arredores da cidade. Perto da meia-noite, grupos de manifestantes peronistas que apóiam o governo
enfrentaram os
moradores com gritos de "Pátria sim, Colônia não" e os obrigaram a abandonar a Praça de Maio, num clima de tensão que não contou com intervenção policial.
Manifestações similares aconteceram em outras importantes cidades do interior do país, como Córdoba, Tucumán, Mar del Plata e Rosário. Os protestos trazem à memória dos argentinos um dos períodos mais negros de sua história recente, o colapso econômico e político de 2001 e 2002, quando o "panelaço" se consolidou como forma de protesto popular e terminou derrubando o então presidente Fernando de la Rúa.
Estopim
O estopim para iniciar a manifestação urbana foi a falta de jogo de cintura de Cristina para resolver o conflito gerado pelos produtores agropecuários, que nesta quarta-feira completam 14 dias de greve devido ao aumento dos impostos às exportações, embora o mal-estar nas cidades seja reflexo de uma série de problemas não-resolvidos. A lista inclui a inflação não
reconhecida pelo governo — de até 20% segundo
analistas independentes e de 8% segundo fontes oficiais —, a falta de segurança e a recém-iniciada falta de abastecimento de produtos básicos, como carne e leite. O desabastecimento é causado pelo bloqueio dos produtores às estradas.
A crise no campo, a mais grave enfrentada por Cristina em sua curta gestão, coincide com uma queda de popularidade de nove pontos percentuais em março (47%) em relação à aprovação de 56% que a governante tinha em janeiro. Cristina sucedeu seu marido, Néstor Kirchner, na Presidência em 10 de dezembro passado, após vencer as eleições gerais de outubro com 45,29% dos votos.
Diante do silêncio presidencial, alguns peronistas provinciais começaram a se distanciar do duro discurso de Cristina e aumentou o número de políticos opositores que pediram diálogo para a resolução do problema.