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 | 28/06/2010 07h41min

"Onde a água passou, levou tudo", relata enfermeira gaúcha

Técnicos da Defesa Civil e funcionários do Grupo Hospitalar Conceição prestam ajuda às vítimas em Alagoas

Marcelo Gonzatto  |  marcelo.gonzatto@zerohora.com.br

Os quatro técnicos da Defesa Civil e os 25 profissionais da saúde do Grupo Hospitalar Conceição enviados para Alagoas devido às inundações encontraram uma situação ainda mais dramática do que a esperada, conforme relato de integrantes da comitiva:

"Onde a água passou, levou tudo"
Daniela Moreira da Silva, 32 anos, enfermeira

“Vim para a cidade de Rio Largo, em Alagoas. Onde a água passou, levou tudo. A cena é horrenda, é um horror. Levou todas as casas. A cidade tem ladeiras e uma parte baixa. Nessa região, as pessoas ficaram sem nada, nem onde morar. Umas 4 mil pessoas foram mais afetadas. Para elas, onde a água passou, não deixou nada.

Tem ainda uma ilha no meio do rio, e a água passou por cima. Mais gente poderia ter morrido porque a água chegou às 7h, veio enchendo, aí veio uma avalanche, mas não tinha chuva nessa hora. Muitas pessoas já estavam fora das suas casas, indo às compras. Isso evitou mais mortes.

Por enquanto, a população não está muito preocupada com o atendimento de saúde. Está mais preocupada em reorganizar a vida, já que tem gente que perdeu tudo, tem casas sem luz. Ainda tem gente desaparecida. Quando chegamos, ficamos desolados. Neste momento, estamos atendendo em um abrigo improvisado em uma escola onde há umas 40 pessoas. Estão tendo muita infecção, machucados nos pés. Também vacinamos contra tétano, medicamos contra parasitas, tentamos prevenir as doenças.

A prefeitura é bem organizada, traz água potável, consegue alojar as pessoas, traz doações. Uma coisa triste é que viemos de longe, e a própria Secretaria de Saúde daqui lamentou que a participação de médicos da região foi pequena.

Nós chegamos na sexta-feira, muito tarde, então começamos a atender somente no sábado. Atendemos em garagem, em albergues. Pelo menos, medicação não falta. No primeiro contato, ficamos muito chocados, principalmente em uma área conhecida como região da Cachoeira. Também há uma lição de vida aqui. As pessoas nos dão uma lição porque sorriem, agradecem a Deus.

Eu não sei nem se acreditaria em Deus depois de acontecer uma coisa dessas comigo, mas elas agradecem a Deus por estarem vivas. Então é uma lição para nós, de que o bem material não é tudo. Uns vão para casa de parentes, tio, primo. É uma lição bonita. Todos se ajudam muito.”

"Existe muita sujeira pelas ruas"
Caroline Wunsch, 30 anos, técnica em enfermagem

“As pessoas que veem as imagens pela TV, de longe, não têm noção de como está difícil a situação por aqui. Não parou de chover até agora na região, e o rio continua subindo. Existe muita sujeira pelas ruas, e as pessoas tentam achar qualquer coisa em meio aos alagamentos, em meio a toda essa sujeira.

Estamos fazendo um trabalho para tentar orientar essas pessoas para não se exporem a doenças, mas, quando dá uma amenizada na chuva, tem gente que tenta pegar qualquer coisa que sobre nas ruas. Não só as suas coisas, pegam qualquer sucata, qualquer coisa que possa ter algum valor. Tentam fazer disso uma fonte de lucro. Elas vão para as ruas em carroças, de cavalo, de qualquer jeito para recolher alguma coisa.”

"Imagens como as do tsunami"
Major Aurivan Chiocheta, subchefe da Defesa Civil gaúcha

“Estou em Murici. O Rio Mundaú voltou a subir e foi expedido novo alerta. Carros de som passam pelas comunidades para dar o alerta, para avisar as pessoas que ainda tentam recuperar objetos em áreas de risco. A gente percebe a angústia e a incerteza no semblante das pessoas, todas molhadas, descalças, em áreas destruídas e com risco de contrair doenças. As imagens que vemos são singulares, como caminhões carregados pelas águas do Rio Mundaú por vários quilômetros.

Só tinha visto coisa parecida nas imagens do tsunami na Ásia. É um cenário que causa perplexidade e comoção e que serve de reflexão até para nós, no Rio Grande do Sul. Temos de buscar entender por que fatos como esse ocorrem e qual a participação humana nisso.”

"É só escombro"
Júlio César Baptista de Freitas Júnior, 26 anos, médico

“Estou em União dos Palmares, e passei por Branquinha. As cidades ficam na beira do rio. Nessas áreas, acabou tudo, é só escombro. Dizem: ‘olha, aqui tinha uma casa’. Em União dos Palmares, a maior parte da cidade está em pé. Em Branquinha, perto de metade da cidade era na beira do rio e acabou, não existe mais. Em um espaço de uma ou duas quadras em volta do rio, só se vê o alicerce das casas.

Passam a noite com um caminhão para recolher tijolos e tentar reconstruir. Tem gente que marca seu terreno com fita. Nas casas que sobraram, que não ficam na beira do rio, as pessoas estão limpando e voltando. O socorro aos machucados já passou, mas agora alguns ferimentos estão infectando.”

Chuva volta a assustar

A chuva em Alagoas, ontem, fez a Defesa Civil local emitir um novo alerta e manteve tenso o clima entre a população já traumatizada pela inundação que somava 34 mortos em solo alagoano e outros 17 em Pernambuco.

Durante toda a tarde, avisos transmitidos por alto-falantes pediram para a população que vive em áreas de risco voltar a deixar suas casas.

A principal fonte de receio, conforme o subchefe da Defesa Civil gaúcha, major Aurivan Chiocheta, que se encontra em Alagoas, era a indicação de que o nível do Rio Mundaú mantinha-se em elevação. Apesar dos apelos oficiais, muitas famílias resistiam em retornar para os abrigos municipais. No fim da tarde, o Exército passou a bater de porta em porta para retirar as famílias.

Em Alagoas, 26.618 pessoas ficaram desabrigadas (sem ter onde morar), e outras 47.897, desalojadas (refugiadas em casas de amigos ou parentes) em 28 municípios. Seis cidades continuavam sem água: em Branquinha, Murici, Capela, Rio Largo, Palmeira dos Índios e Santana do Mundaú, o abastecimento depende de carros-pipa. Em Alagoas e Pernambuco, o número total de pessoas prejudicadas chega a 160 mil.

Ontem, foi entregue a primeira ajuda internacional. Uma aeronave C-130 das forças armadas venezuelanas aterrissou na Base Aérea do Recife com quase 12 toneladas de donativos. Do Rio Grande do Sul, deverá ser enviada uma ponte e 70 militares de Cachoeira do Sul para Recife (PE). O material será transportado de carreta, e os homens do 3º Batalhão de Engenharia de Combate viajarão de ônibus. Conforme o chefe da Comunicação Social do Comando Militar do Sul, coronel Sílvio Cardoso, a chegada deverá ocorrer nos próximos dias.

ZERO HORA
Nuvem Esperança

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