| 13/08/2009 15h34min
Armando Vaz
Descobri o que a repórter Christiane Matos fez para conseguir a entrevista tsunami com D'Alessandro (foto) no Diário Gaúcho. Como sabe, até dos boatos sobre suposto uso de cocaína o argentino falou com a maior naturalidade, como se aplicasse o La Boba nos zagueiros. Pois vou contar como tudo aconteceu. A fonte não poderia ser melhor: a própria Chris.
Talvez eu tenha feito com a Chris o que a Chris fez com o D'Alessandro. Sim, porque ele contou tudo, numa conversa regada a café e medialuna, com testemunhas. E a Chris também me
contou tudo, embora com menos grife, ali no bar da Zero Hora, igualmente durante um café, mas sem medialuna e com um
pãozinho de queijo morno.
Quando o D'Alessandro encasquetou que não ia dar entrevistas durante o seu período de recuperação física, a Chris encasquetou que ia falar com ele mesmo assim. Teve um empurrão jornalístico, digamos. De Adroaldo Guerra Filho, o Guerrinha:
— Ah, ele disse que não quer dar entrevista? Pois agora é que ele vai dar sim. Vai lá e enche o saco dele, guria! Senta no capô do carro que eu quero ver este gringo não te dar entrevista.
A Chris acolheu o conselho do Guerrinha, no que fez muito bem. Não sentou no capô do carro, mas conseguiu. Foram 13 dias de insistência. No primeiro dia, o argentino deixou o vestiário correndo e seguiu direto para o carro. A Chris o seguiu. Parou na porta do motorista e pediu para baixar o vidro. Eis o diálogo, decisivo para o resultado final nas páginas do Diário Gaúcho:
— Oi, D'Alessandro, tudo bem? Tu não vais dar entrevista?
—
Não, não, já disse que não. Avisei o Nobrinho (assessor de imprensa do
Inter). Não vou falar!
— Mas por que? A torcida gosta de ti. As pessoas querem saber o que houve. Não é melhor tu mesmo contar?
— Não, não. A imprensa não me respeita. Falam um monte de coisa e.....
— Ôpa, ôpa: só um pouquinho: como assim, a imprensa? Eu nunca te desrespeitei! Estou todos os dias aqui no Beira-Rio, escrevo todos os dias para o meu jornal e nunca desrespeitei ninguém. Não pode generalizar!
Depois desta intervenção enérgica da Chris, ele amoleceu. A Chris tem olhos grandes e fala com a gente sem desviar o olhar dos seus 26 anos, o que passa uma impressão de sinceridade. O D'Alessandro deve ter percebido isso, porque ao fim da bronca, assentiu:
— Eu sei, eu sei, não são todos. Vamos ver...
No segundo dia, de novo. Ele entra no carro, a Cris vai atrás.
— Mas D'Alessandro, as pessoas não te conhecem direito porque tu não fala. A torcida gosta de ti
mas tu não te comunica com ela. Se tu não falar, acaba dando margem para
boatos.
— Sim, sim, eu sei! Falaram até que uso cocaína! Isso é um absurdo!
— Então: fala, me dá uma entrevista....
Bem, como se vê, já na segunda tentativa, e sem sentar no capô, já havia certa intimidade entre repórter e futuro entrevistado. E assim aconteceu sucessivamente, durante treze dias. Às vezes, D'Ale parecia mais amável. Em outros, especialmente quando escutava algum comentário no rádio, se irritava.
O argentino, descobriu a Chris, é apenas um sujeito introspectivo e desconfiado. Antes de falar com ela, buscou informações, quis saber se podia confiar, pediu permissão ao clube mesmo depois de ter concordado em conceder a entrevista (e a avisou disso). Quando, enfim, D'Alessandro concordou, veio a má notícia para a Chris.
D'Alessandro estava relacionado para o jogo contra o Sport. Portanto, podia ficar no banco. Se ficasse no banco, talvez entrasse no segundo tempo. Se entrasse no segundo tempo e
marcasse gol, como de fato aconteceu, adeus entrevista. Todos
os repórteres cercariam D'Alessandro ainda no campo e os 13 dias de tratativas restariam afogadas no Rio da Prata. O argentino falaria com o mundo todo antes dela. Então, na véspera do jogo, a previdente Chris o procurou:
— Tá, mas e se tu arrebentar no jogo? Aí tu vais ter que falar. E a nossa entrevista, como é que fica?
— Não. Se eu prometi que vou falar antes para ti, vou falar antes para ti. Se eu prometo, cumpro.
O resto todo mundo já sabe. D'Ale marcou o gol, saiu de campo mudo e não apareceu para dar entrevistas no vestiário. Não era mágoa ou birra, como se imaginou. Era um profissional do futebol cumprindo a palavra empenhada a uma repórter persistente. Aí foi só marcar o café. Missão cumprida: além de abordar temas ásperos, como os boatos obtusos sobre cocaína, e confessar-se envergonhado ao se ver na TV correndo atrás de William contra o Corinthians, falou da relação com a imprensa, das filhas, de tudo.
Da história toda, duas conclusões. A primeira:
D'Alessandro cumpre o que promete. A segunda: se o argentino enfrentar zagueiros que cercam e chegam junto como a Chris, o Inter terá problemas sérios no meio-campo.
Confira a entrevista.
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