| 12/10/2008 00h27min
Um postulado permite entender melhor o mais novo projeto de craque do Olímpico: Douglas Costa é dois. Junto ao jogador que se impôs com desenvoltura ao substituir o capitão Tcheco no momento mais delicado do Grêmio no Campeonato Brasileiro coexiste um menino humilde e retraído, cuja habilidade para lidar com a fama — ainda — é inversamente proporcional à habilidade para lidar com a bola.
Assista a lances da mais nova revelação do Grêmio:
Douglas Costa de Souza, 18 anos feitos em 14 de setembro, parece não ter a dimensão exata dos R$ 80 milhões que vale seu futebol.
— Minha vida está normal, como sempre esteve. Mas está diferente — ele diz, lembrando que sua rotina mudou
radicalmente em menos de duas semanas. — Meu passatempo preferido é ficar com a família. Também gosto
de jogar videogame, ir ao shopping. Mas desde o jogo contra o Botafogo não está dando mais para circular como antes.
Prova disso foi uma rápida ida ao posto bancário no pátio do estádio, pouco antes do treino da tarde de sexta-feira: Douglas acabou cercado por torcedores, que gritaram seu nome, sacaram os celulares com câmeras fotográficas e as canetas para os autógrafos. Pacientemente, cheio de uma vergonha juvenil, atendeu a todos — o tempo inteiro com o olho buscando discretamente um funcionário do clube que lhe dissesse a hora de parar. O treino já estava por começar, e ele ainda precisava passar no vestiário para calçar as chuteiras.
— Eu tinha de ir ali pagar umas contas lá de casa — se apressou em explicar assim que avistou o assessor de imprensa Vitor Rodrigues.
O piá não se deu conta de que é um astro.
Técnico dos juniores se impressiona
Douglas nasceu em Sapucaia do Sul,
no Vale do Sinos. Aos 12 anos se mudou para Esteio, onde o pai foi
trabalhar como mecânico industrial. Inspirado pelo velho, jogador de várzea na Região Metropolitana, enturmou-se com a gurizada das quadras de futsal do Clube dos Empregados da Petrobras (Cepe). O homem, revela o próprio Douglas, logo percebeu que estava diante de um fora-de-série:
— O pai sempre disse que o sucesso chegaria rapidamente, era só questão de estar preparado para ele.
À mesma época o moleque já jogava nas categorias de base do Novo Hamburgo. Mas foi no próprio Cepe, numa quadra de cimento, que foi visto por um olheiro gremista.
— Ele tinha uma certa fama por lá, informações dele já haviam chegado até a gente — revela Julinho Camargo, treinador dos juniores do Grêmio.
Ainda era 2002, mesmo ano de sua saída de Sapucaia, e Douglas já estava no clube da Capital, dormindo na concentração das categorias de base, voltando para casa apenas nos fins de semana. A escola ele largou após concluir o Ensino Fundamental.
— É impressionante como é aplicado, interessado
na própria carreira — comenta Camargo.
E o talento?
— É raro. O Douglas é daqueles jogadores que, quando parte para o drible, ninguém tira a bola dele. Em 18 anos de profissão, trabalhei com um ou outro além dele, e olha lá — diz Camargo.
Certo de que o guri tinha potencial, o Grêmio começou em 2005 a trabalhar a estrutura física. Com 15 anos, o pequeno jogador pesava 43 quilos. Hoje, depois de mais de três anos de exercícios específicos e suplementos alimentares à base de aminoácidos em forma de cápsulas e vitaminas, tem 64 quilos. A altura, que não é definitiva — a previsão dos médicos e fisiologistas é de que cresça cerca de dois centímetros —, também já é adequada: 1m72cm.
Ídolos: Anderson e Tcheco
Tudo isso permite lançá-lo no time que lidera o Brasileirão, embora em momento de turbulência pós-Gre-Nal.
— Ele já demonstrou que
está preparado — avalia o técnico Celso Roth. — Sabe o que a gente quer dizer quando a gente
fala.
— Cada caso é um caso. O Carlos Eduardo ficou dois anos nos juniores. Já o Lucas em seis meses deixou claro que não tinha mais nada a aprender na base — conta Camargo. — O Douglas chegou pronto ao time de cima.
Só de massa muscular ganhou três quilos. E pôde desenvolver algo que, às vezes, tanta falta faz aos craques brasileiros: cultura tática e habilidade com todos os fundamentos.
— O resultado, curiosamente, é a alegria completa daqueles que admiram o talento individual. É a alegria dos românticos do futebol – sorri Roth. — O Rio Grande do Sul está cheio deles.
A aparência semelhante à do atacante camaronês do Barcelona rendeu o apelido de Eto’o. A comparação — com esse ou qualquer outro jogador —, é rechaçada por Douglas Costa.
— Anderson — ele diz, baixinho, meio sem querer, após ouvir pela terceira vez a pergunta sobre qual seria seu ídolo. — O Tcheco, também — ele acrescenta, para o quarto
repórter. — Mas não tem, assim, alguém em quem me inspiro.
Após o treino, os jornalistas fazem fila para entrevistá-lo — e o menino se retrai conforme são ligados os gravadores e as câmeras de tevê na sala de conferências do Olímpico. Se retrai, fala num volume praticamente inaudível, mexe os pés e as mãos quase ininterruptamente. Fala olhando para o chão.
Após a sabatina, já sem mais ninguém a sua volta, a reportagem de ZH pergunta longa e pausadamente, na expectativa de vê-lo erguer a cabeça. A reação é imediata: quando não está intimidado, quando está um pouquinho distante do assédio, seja da imprensa ou dos fãs, sua interação com o interlocutor é bem diferente.
E as mulheres? Estão te dando sossego?
— Tranqüilo — reage, automaticamente. — Tenho namorada, estou tranqüilo quanto a isso.
É ao encontro dela que ele vai, em Santa Maria, onde ela estuda, no fim de semana de folga. Embora, orientado pelo clube, prefira não confirmar:
— Vou ficar com minha família, com
as pessoas que me dão suporte.
Muitíssimo bom
suporte, é a impressão que se tem.
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