Foto: Tatiana Klix |
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No fim do último dia em Pequim e na China, fui fazer as derradeiras compras na Wangfujing. Lá fica a feirinha onde tem os bichinhos estranhos de que já falei por aqui, mas também tem muitas lojas, shoppings e gente. Aliás, nas cidades chinesas que conheci sempre tem muita gente e muita loja, além de muita comida à disposição. Mesmo fazendo turismo, a sombra do terremoto que não abandona o país também não deixa que eu fique alienada a ele. Nesta região, há dois grandes telões na rua, que obviamente estavam passando o noticiário com imagens das vítimas, dos resgates e de políticos chineses falando e socorrendo o povo.
E o que faziam as pessoas que pela área circulavam? Paravam e assistiam com toda a atencão do mundo a tudo que a televisão tinha para mostrar.
Recebi muitos elogios pelo trabalho realizado aqui na China, e todos eles me deixaram muito feliz, além de serem um incentivo para continuar. Teve um, no entanto, que me deixou muito emocionada (chorei, inclusive, ao recebê-lo na última madrugada em Chengdu). Por isso pedi e recebi a autorização para publicar por aqui:
"Tenho olhado o que colocas no teu blog, mas agora quero te dar os meus parabéns pelas matérias que tens escrito desde esse cenário trágico na China. Fico arrepiado de orgulho por poder dizer "essa jornalista internacional(guria) é a melhor amiga da minha filha e me trata por TIO". O que acho de maior valor nas tua escritas é a visão da essência do povo chines. Pinçar as coisas boas de um povo no meio das desgraças, sem explorar os aspectos que normalmente as mídias costumam focar.
Parabéns pela sensibilidade.
Alem do trabalho notável que estás fazendo, torço para que essa experiência te traga uma ampliação na visão do que é a vida na realidade e que o trabalho realizado te traga dividendos profissionais."
O elogio é do James, pai da Cacá, minha amiga chinesa de quem já falei por aqui. Se ninguém mais tivesse dito nada, com o depoimento dele teria valido a pena fazer cobertura. O que está escrito ali em cima é o que busquei o tempo todo e ter este retorno de um chinês é muito mais do que poderia esperar.
Obrigada, tio James.
Ficou todo mundo quieto na muralha às 14h28Foto: Tatiana Klix |
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Uma semana depois do terremoto, a comoção da China só aumenta. Ontem (segunda), às 14h28, como a Jana havia postado, a população do país inteiro parou e silenciou, enquanto motoristas de carros fizeram um buzinaço. De volta ao ritmo férias, estava perto de Pequim neste horário conhecendo a muralha da China, o maior símbolo do país (ainda bem que eu esse passeio eu não perdi!). Foi lá que vi turistas (a maioria do próprio país), que estavam se divertindo - e como é legal ver como o povo chinês gosta da muralha - parar por três minutos em homenagem às vítimas do terremoto da segunda-feira passada, enquanto se ouvia o barulho das buzinas lá de baixo.
A homenagem foi incentivada pelo governo chinês, que decretou luto de três dias e proibiu todas as manifestações de entretenimento (shows, festas, jogos de computador e até filmes na TV) no país. Por conta disso, as únicas imagens que passam constantemente na televisão são as da tragédia e todos são obrigados realmente a entrar no clima de consternação.
À noite, fui jantar num restaurante de comida típica de Xinjiang, região muçulmana da China (e também separatista, como o Tibet). Ao chegar, fomos logo avisadas de que não haveria show, porque a China passa por um período difícil.
Não me surpreende as pessoas se mobilizarem - e a manifestação foi realmente muito bonita e emocionante -, mas acho a proibição e o uso das manifestações politicamente um desrespeito às vítimas. O que se vê aqui agora, além de um país em luto, é um país em clima de nacionalismo, cultivando um sentimento de que a China está se unindo pelos chineses e faz isso melhor do que outros povos fariam - tanto é que voluntários estrangeiros não são permitidos. Triste saber que até na tragédia conseguimos ser tão pequenos.
Cansaço para deixar Chengdu |
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Hoje pela manhã, depois de virar a noite para fechar o material para ZH e clicRBS, deixei Chengdu. Antes de partir, mais um um banho de realidade. O aeroporto estava completamente lotado, com chineses aguardando vôos - muito deles atrasados - e um intenso fluxo aéreo. A impressão que dava era de que muitos ali (o que acabou se confirmando no meu vôo) nunca tinham entrado em uma avião e estavam deixando Chengdu por não terem mais onde ficar.
Agora estou de volta a Pequim, na casa da Jana e da Paula, o que a essas alturas está com jeito de casa para mim também. Não vou mais acompanhar a tragédia e o noticiário na China com a mesma intensidade e espero aproveitar um pouquinho do fim das férias até embarcar quarta-feira para o Brasil. Ainda tenho muita coisa para contar e pretendo fazê-lo em outro ritmo por aqui. Os três dias que estive em Chengdu foram muito intensos e só com o tempo vou ter condições de avaliar tudo o que observei e senti. Espero que o relato até agora já tenha sido interessante para os leitores deste blog, que aos poucos voltará a falar de viagens menos conturbadas.
Aproveito para agradecer todos os comentários aqui postados, principalmente os elogios! Não tive tempo de respondê-los, mas levei em conta todas as observações na produção do conteúdo.
Hoje pude acompanhar aqui em Chengdu, capital da província de Sichuan, como está o atendimento aos feridos no Hospital do Oeste da China. Pelo curto período de tempo para atender tantas vítimas, o trabalho é ágil e bem organizado. Além disso, os voluntários desempenham um papel importante na organização.
Os feridos que chegam de fora da cidade, seja por via terrestre ou aérea, passam por um posto de triagem, que na verdade é uma tenda montada fora do hospital. Dali, o paciente recebe os primeiros socorros e é encaminhado rapidamente ao atendimento no interior do prédio.
Para conferir os detalhes desse relato de sexta-feira, clique aí e ouça o mp3.
DOWNLOAD (duração: 4min47s / tamanho: 2,19Mb)
Confira também as imagens da chegada dos feridos no Hospital do Oeste:
Depois do terremoto de 7,8 graus na escala Richter de segunda, 4.432 abalos secundários ocorreram no sudoeste da China. Um deles foi hoje por volta das 13h, aqui em Chengdu. Conversei com várias pessoas que sentiram o tremor e relatam ter sido um dos maiores, entre os ditos secundários. Eu não senti nada, estava na rua, perto de um hospital, experiência que vou contar daqui a pouco. Mas confesso que queria ter sentido, para poder relatar aqui.
Será que estou ficando louca com este trabalho do outro lado do mundo?
O prédio não resistiu e senhora fica soterrada sob escombrosFoto: Tatiana Klix |
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Agora, voltando às cenas trágicas, é difícil dizer a que mais me marcou ontem. Porque sofrimento - e quanto sofrimento - não se mede. Não tem menos pior. A imagem de uma mulher muito irritada porque a mãe estava nos escombros do prédio em que morava e o socorro não havia chegado não me sai da cabeça. Ela falava que chamou por ajuda, mas reclamava da falta de atenção do governo (a única pessoa que vi reclamar do governo, aliás), de socorro, da precariedade da construção que não resistiu ao tremor (apesar de, segundo ela, o prédio ser novo). Gritava e via em mim, uma ocidental acompanhada pela chinesa Cherry, uma possibilidade de ajuda. Muito triste.
Confira no vídeo um pouco das imagem que estão martelando por aqui.
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Eu sei: imagens de criancinhas fazendo caretas no meio de grandes desastres ou guerras são muito clichê e podem parecer apelativas. Mas confesso que não tive a menor condição de resistir quando estes três chinesinhos me olhavam e pediam para que eu tirasse uma foto deles.
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Andei bastante por Dujiangiyan, a pé e de carro. As construções que não estão totalmente no chão estão condenadas e não podem ser usadas. Por isso, muitas pessoas ficaram totalmente sem lar e acampam sob tendas pelas calçadas.
Os estabelecimentos comerciais também estão fechados, alguns ainda com os produtos entre os destroços. Menos um, uma casa de chá aparentemente sem muitos estragos, que segue funcionando como se fosse um dia normal, entre grupos de resgate, voluntários e milhares de desabrigados pelas ruas.
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Uma das exigências do motorista Liu, que me levou até Dujiangiyan, era que levássemos doações para as vítimas. Assim, se alguma barreira nos parasse, poderíamos argumentar que precisávamos ir até lá para entregar alimentos e água, em último caso. Passamos em três supermercados - e não encontramos água -, mas comprei sucos e duas caixas cheias de salsicha. Chegando em Dujiangiyan e me deparando com tamanha tristeza, não pude deixar de me sentir muito mal por ter colaborado com tão pouco.
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Desde que decidi encarar esta cobertura, tinha o objetivo de chegar até uma das áreas da destruição. Nos primeiros dois dias depois do terremoto, com informações desencontradas sobre o acesso a esses lugares, imaginei que não seria tarefa das mais fáceis.
De fato não foi, mas o mais difícil nem foram os buracos da estrada, e sim descobrir um meio de chegar até lá. De novo, sempre a língua dificulta muito todos os passos aqui na China. Acompanhando freneticamente o noticiário na TV, logo decidi para onde iria: Dujiangiyan. A localidade é a área afetada mais perto de Chengdu, onde estou hospedada, e muitos voluntários estavam conseguindo ir até lá. Também foi neste ponto que o premiê Wen Jiabao fez sua primeira visita às vítimas do tremor.
Uma vez em Chengdu com esta idéia fixa, comecei a procurar alguém que me desse uma dica, pelo menos, de como viajar para Dujiangiyan. No primeiro dia, fui apresentada a uma chinesa, Jessie, que trabalha numa empresa de seguros e estaria indo a trabalho na manhã seguinte para lá. Tanta sorte tão rápido seria demais. Pedi carona, mas receosa de levar uma estrangeira a uma área de risco (os chineses são muito preocupados com a imagem do país no Exterior e a integridade de seus visitantes), não topou e me aconselhou a não ir.
A partir daí, vários boatos surgiram - estrada interrompida, estrangeiros proibidos de entrar, engarrafamentos impossíveis -, mas também outros depoimentos mais animadores, de pessoas (jornalistas, inclusive) que já haviam estado no local e diziam que era relativamente tranqüilo chegar. Ou seja, não desisti, mas acordei ontem sem ter a menor idéia de como começar.
Na falta de idéia melhor, usei o modelo turismo: perguntar na recepção do hotel. Lógico que não funcionou, os funcionários me deram apenas uma risada nervosa quando pedi a dica. Acompanhada da Sara, uma espanhola e moradora de Chengdu que conheci no primeiro dia aqui, tentei longas negociações, que às vezes avançavam e novamente retrocediam com taxistas, guias de turismo, motoristas profissionais. Também estas pessoas achavam o pedido estranho, tinham medo, acreditavam nos boatos que diziam que não seria possível, etc.. Até que lá pelas tantas, encontramos (ou melhor, a Sara encontrou) um senhor, Liu, que normalmente faz pesquisas na área rural (isso foi tudo que entendi da tradução me passada) e desde o terremoto transporta de jipe pessoas que, como eu, tenham algum motivo para ir ao encontro da tragédia.
A equipe, no entanto, não estava completa. Era preciso ainda contratar um tradutor. Além de o motorista só falar chinês, queria alguém que ajudasse a entender em inglês o que meus olhos veriam em português, mas não conseguiriam ouvir ou falar em chinês de jeito nenhum. Essa parte foi fácil. A Sara novamente, sempre ela, me emprestou Cherry, uma jovem de 21 anos que trabalha para ela.
Já depois do meio-dia, embarcamos para uma experiência que levarei tempo para entender completamente, embora seja meu trabalho escrever, falar, registrar em fotos e vídeos e publicar tudo o mais rápido possível.
Rua de Dujiangyan/Tatiana Klix
O relato sobre a situação em Dujiangiyan também está em zh de hoje. Veja aqui o texto.
O podcast do post anterior virou um videocast, ou algo assim. Com o sempre irreparável suporte da redação do clicRBS, em Porto Alegre, agora a minha narração está acompanhada de vídeos e fotos que fiz em Dujiangiyan hoje. Não sou a melhor fotógrafa ou cinegrafista do mundo, nem tampouco tinha equipamento profissional comigo, mas tamanha tragédia merece o registro.
Poucos jornalistas foram até lá, pelo que consigo acompanhar na correria do trabalho por aqui. Eu mesma não encontrei nehum ocidental na área hoje. Portanto o que você vai ver se clicar no link abaixo é exclusivo do blog ida&volta.
A edição maravilhosa de tudo isso foi feita em Porto Alegre, pelos colegas Fabiane Echel, Juliano Schuler e Miguel Camargo.
Ainda tenho muitas histórias tristes de hoje para contar, bem como fotos para postar no blog. Mas por aqui agora são seis e meia da manhã. Preciso esticar as pernas. Até mais.
Histórias, dicas, lembranças e planos de viagens para quem adora passear por aí (e depois voltar para casa). Por Tatiana Klix
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